A Intermediação de Maria Mãe dos Homens
para nos levar ao Cordeiro de Deus

'O ROSÁRIO É A VIDA DE CRISTO CONTEMPLADA COM O OLHAR DE MARIA'
"
Maria é aquela que nos acompanha na escuridão da noite até o clarear do novo dia”

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                                                   Criado em 30 de março de 2005

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86 ANOS DE GRAÇAS E BÊNÇÃOS no Brasil e no mundo

Catecismo da Igreja - Parte 5

PÁGINA INICIAL

ARTIGO 3

O SACRAMENTO DA EUCARISTIA

1322. A sagrada Eucaristia completa a iniciação cristã. Aqueles que foram elevados à dignidade do sacerdócio real pelo Batismo e configurados mais profundamente com Cristo pela Confirmação, esses, por meio da Eucaristia, participam, com toda a comunidade, no próprio sacrifício do Senhor.

1323. «O nosso Salvador instituiu na última ceia, na noite em que foi entregue, o sacrifício eucarístico do seu corpo e sangue, para perpetuar pelo decorrer dos séculos, até voltar, o sacrifício da cruz, confiando à Igreja, sua esposa amada, o memorial da sua morte e ressurreição: sacramento de piedade, sinal de unidade, vínculo de caridade, banquete pascal em que se recebe Cristo, a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da glória futura» (II Concílio do Vaticano, Sacrosactum concilium, 47: .AAS 56 (1964) 113)

I. A Eucaristia - fonte e cume da vida eclesial

1324. A Eucaristia é «fonte e cume de toda a vida cristã» (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15). «Os restantes sacramentos, assim como todos os ministérios eclesiásticos e obras de apostolado, estão vinculados com a sagrada Eucaristia e a ela se ordenam. Com efeito, na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, nossa Páscoa» (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966) 997).

1325. «A comunhão de vida com Deus e a unidade do povo de Deus, pelas quais a Igreja é o que é, são significados e realizados pela Eucaristia. Nela se encontra o cume, ao mesmo tempo, da ação pela qual Deus, em Cristo, santifica o mundo, e do culto que no Espírito Santo os homens prestam a Cristo e, por Ele, ao Pai» (Sagrada Congregação dos Ritos, Instr. Eucharisticum mysterium, 6: AAS 59 (1967) 545).

1326. Enfim, pela celebração eucarística, unimo-nos desde já à Liturgia do céu e antecipamos a vida eterna, quando «Deus for tudo em todos» (1ª Cor. 15, 18).

1327. Em síntese, a Eucaristia é o resumo e a súmula da nossa fé: «a nossa maneira de pensar está de acordo com a Eucaristia: e, por sua vez, a Eucaristia confirma a nossa maneira de pensar» (Santo Ireneu de Lião, Adversus haereses 4, 18, 5: SC 100, 610 (Pg. 7, 1028)).

II. Como se chama este sacramento?

1328. A riqueza inesgotável deste sacramento exprime-se nos diferentes nomes que lhe são dados. Cada um destes nomes evoca alguns dos seus aspectos. Chama-se: Eucaristia, porque é ação de graças a Deus. As palavras
«eucharistein» (Lc. 22, 19; 1ª Cor. 11, 24) e «eulogein» (Mt. 26, 26; Mc. 14, 22) lembram as bênçãos judaicas que proclamam - sobretudo durante a refeição - as obras de Deus: a criação, a redenção e a santificação.

1329. Ceia do Senhor (Cf. 1ª Cor. 11, 20), porque se trata da ceia que o Senhor comeu com os discípulos na véspera da sua paixão e da antecipação do banquete nupcial do Cordeiro (Cf. Ap. 19, 9) na Jerusalém celeste.

- Fracção do Pão, porque este rito, próprio da refeição dos judeus, foi utilizado por Jesus quando abençoava e distribuía o pão como chefe de família (Cf. Mt. 14, 19; 15, 36; Mc. 8, 6.19), sobretudo aquando da última ceia (Cf. Mt. 26, 26: 1ª Cor. 11, 24). É por este gesto que os discípulos O reconhecerão depois da sua ressurreição (Cf. Lc. 24, 13-35) e é com esta expressão que os primeiros cristãos designarão as suas assembleias eucarísticas (Cf. At. 2, 42.46: 20, 7.11). Querem com isso significar que todos os que comem do único pão partido, Cristo, entram em comunhão com Ele e formam um só corpo n'Ele (Cf. 1ª Cor. 10, 16-17).

- Assembleia eucarística («sýnaxis»), porque a Eucaristia é celebrada em assembleia de fiéis, expressão visível da Igreja (Cf. 1ª Cor. 11, 17-34).

1330. Memorial da paixão e ressurreição do Senhor.

Santo Sacrifício, porque atualiza o único sacrifício de Cristo Salvador e inclui a oferenda da Igreja; ou ainda santo Sacrifício da Missa, «Sacrifício de louvor» (Heb. 13, 15)
(Cf. Sl. 116, 13.17), Sacrifício espiritual (Cf. 1ª Pe. 2, 5) Sacrifício puro (Cf. Ml. 1, 11) e santo, pois completa e ultrapassa todos os sacrifícios da Antiga Aliança.

Santa e divina Liturgia, porque toda a liturgia da Igreja encontra o seu centro e a sua expressão mais densa na celebração deste sacramento; no mesmo sentido se lhe chama também celebração dos Santos Mistérios. Fala-se igualmente do Santíssimo Sacramento, porque é o sacramento dos sacramentos. E, com este nome, se designam as espécies eucarísticas guardadas no Sacrário.

1331. Comunhão, pois é por este sacramento que nos unimos a Cristo, o qual nos torna participantes do seu corpo e do seu sangue, para formarmos um só corpo (Cf. 1ª Cor, 10, 16-17); chama-se ainda
as coisas santas («tà hágia»; «sancta
») (Cf. Constitutiones apostolicae 8, 13, 12: SC: 336, 208 (Funk, Didascalia et Constitutiones Apostolorum 1, 516); Didaké 9,5: SC 248, 178 (Funk, Patres apostolici 1, 22); Ibid. 10, 6: SC 248. 180 (Funk, Patres apostolici 1, 24)) - é o sentido primário da «comunhão dos santos» de que fala o Símbolo dos Apóstolos - pão dos anjos, pão do céu, remédio da imortalidade (Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Ephesios 20, 2: SC 10 bis, 76 (Funk 1, 230)), viático...

1332. Santa Missa, porque a liturgia em que se realiza o mistério da salvação termina com o envio dos fiéis («missio»), para que vão cumprir a vontade de Deus na sua vida quotidiana.

III. A Eucaristia na economia da salvação

OS SINAIS DO PÃO E DO VINHO

1333. No centro da celebração da Eucaristia temos o pão e o vinho que, pelas palavras de Cristo e pela invocação do Espírito Santo, se tornam o Corpo e o Sangue do mesmo Cristo. Fiel à ordem do Senhor, a Igreja continua a fazer, em memória d'Ele e até à sua vinda gloriosa, o que Ele fez na véspera da sua paixão: «tomou o pão...», «tomou o cálice com vinho...». Tornando-se misteriosamente o Corpo e o Sangue de Cristo, os sinais do pão e do vinho continuam a significar também a bondade da criação. Por isso, no ofertório [apresentação das oferendas], nós damos graças ao Criador pelo pão e pelo vinho (Cf. Sl. 104, 13-15), fruto «do trabalho do homem», mas primeiramente «fruto da terra» e «da videira», dons do Criador. A Igreja vê no gesto de Melquisedec, rei e sacerdote, que «ofereceu pão e vinho» (Gn. 14, 18), uma prefiguração da sua própria oferenda (Cf. Oração Eucarística 1 ou Cânone Romano, 95: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970). p. 453 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 521]).

1334. Na Antiga Aliança, o pão e o vinho são oferecidos em sacrifício entre as primícias da terra, em sinal de reconhecimento ao Criador. Mas também recebem uma nova significação no contexto do Êxodo: os pães ázimos que Israel come todos os anos na Páscoa, comemoram a pressa da partida libertadora do Egito; a lembrança do maná do deserto recordará sempre a Israel que é do pão da Palavra de Deus que ele vive (Cf. Dt. 8, 3). Finalmente, o pão de cada dia é o fruto da terra prometida, penhor da fidelidade de Deus às suas promessas. O «cálice de bênção» (1ª Cor. 10, 16), no fim da ceia pascal dos judeus, acrescenta à alegria festiva do vinho uma dimensão escatológica - a da expectativa messiânica do restabelecimento de Jerusalém. Jesus instituiu a sua Eucaristia dando um sentido novo e definitivo à bênção do pão e do cálice.

1335. Os milagres da multiplicação dos pães, quando o Senhor disse a bênção, partiu e distribuiu os pães pelos seus discípulos para alimentar a multidão, prefiguram a superabundância deste pão único da sua Eucaristia (Cf. Mt. 14, 13-21; 15, 32-39). O sinal da água transformada em vinho em Caná (Cf. Jo. 2, 11) já anuncia a «Hora» da glorificação de Jesus. E manifesta o cumprimento do banquete das núpcias no Reino do Pai, onde os fiéis beberão do vinho novo (Cf. Mc. 14, 25) tornado sangue de Cristo.

1336. O primeiro anúncio da Eucaristia dividiu os discípulos, tal como o anúncio da paixão os escandalizou: «estas palavras são insuportáveis! Quem as pode escutar»? (Jo. 6, 60). A Eucaristia e a cruz são pedras de tropeço. É o mesmo mistério e não cessa de ser ocasião de divisão. «Também vos quereis ir embora»? (Jo. 6, 67): esta pergunta do Senhor ecoa através dos tempos, como convite do seu amor a descobrir que só Ele tem «palavras de vida eterna» (Jo. 6, 68) e que acolher na fé o dom da sua Eucaristia é acolhê-lo a Ele próprio.

A INSTITUIÇÃO DA EUCARISTIA

1337. Tendo amado os seus, o Senhor amou-os até ao fim. Sabendo que era chegada a hora de partir deste mundo para regressar ao Pai, no decorrer duma refeição, lavou-lhes os pés e deu-lhes o mandamento do amor (Cf. Jo. 13, 1-17). Para lhes deixar uma garantia deste amor, para jamais se afastar dos seus e para os tornar participantes da sua Páscoa, instituiu a Eucaristia como memorial da sua morte e da sua ressurreição, e ordenou aos seus Apóstolos que a celebrassem até ao seu regresso, «constituindo-os, então, sacerdotes do Novo Testamento» (Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 1: DS 1740).

1338. Os três evangelhos sinópticos e São Paulo transmitiram-nos a narração da instituição da Eucaristia. Por seu lado, São João refere as palavras de Jesus na sinagoga de Cafarnaum, palavras que preparam a instituição da Eucaristia: Cristo designa-se a si próprio como o pão da vida, descido do céu (Cf. Jo. 6, 13).

1339. Jesus escolheu a altura da Páscoa para cumprir o que tinha anunciado em Cafarnaum: dar aos seus discípulos o seu corpo e o seu sangue:

- «veio o dia dos Ázimos, em que devia imolar-se a Páscoa. [Jesus] enviou então a Pedro e a João, dizendo: "ide preparar-nos a Páscoa, para que a possamos comer" [...]. Partiram, pois, [...] e prepararam a Páscoa. Ao chegar a hora, Jesus tomou lugar à mesa, e os Apóstolos com Ele. Disse-lhes então: "tenho desejado ardentemente comer convosco esta Páscoa, antes de padecer. Pois vos digo que não voltarei a comê-la, até que ela se realize plenamente no Reino de Deus". [...] Depois, tomou o pão e, dando graças, partiu-o, deu-lhe e disse-lhes: "isto é o Meu Corpo, que vai ser entregue por vós. Fazei isto em memória de mim". No fim da ceia, fez o mesmo com o cálice e disse: "este cálice é a Nova Aliança no meu Sangue, que vai ser derramado por vós"» (Lc. 22, 7-20) (Cf. Mt 26, 17-29; Mc 14, 12-25; 1 Cor 11, 23-25).

1340. Celebrando a última ceia com os seus Apóstolos, no decorrer do banquete pascal, Jesus deu o seu sentido definitivo à Páscoa judaica. Com efeito, a passagem de Jesus para o seu Pai, pela sua morte e ressurreição - a Páscoa nova - é antecipada na ceia e celebrada na Eucaristia, que dá cumprimento a Páscoa judaica e antecipa a Páscoa final da Igreja na glória do Reino.

«FAZEI ISTO EM MEMÓRIA DE MIM»

1341. Ao ordenar que repetissem os seus gestos e palavras, «até que Ele venha» (1ª Cor. 11, 26), Jesus não pede somente que se lembrem d'Ele e do que Ele fez. Tem em vista a celebração litúrgica, pelos apóstolos e seus sucessores, do memorial de Cristo, da sua vida, morte, ressurreição e da sua intercessão junto do Pai.

1342. Desde o princípio, a Igreja foi fiel à ordem do Senhor. Da Igreja de Jerusalém está escrito:

- «eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fração do pão e às orações. [...] Todos os dias frequentavam o templo, como se tivessem uma só alma, e partiam o pão em suas casas; tomavam o alimento com alegria e simplicidade de coração» (At. 2, 42.46).

1343. Era sobretudo «no primeiro dia da semana», isto é, no dia de domingo, dia da ressurreição de Jesus, que os cristãos se reuniam «para partir o pão» (At. 20, 7). Desde esses tempos até aos nossos dias, a celebração da Eucaristia perpetuou-se, de maneira que hoje a encontramos em toda a parte na Igreja com a mesma estrutura fundamental. Ela continua a ser o centro da vida da Igreja.

1344. Assim, de celebração em celebração, anunciando o mistério pascal de Jesus «até que Ele venha» (1ª Cor. 11, 26), o Povo de Deus em peregrinação «avança pela porta estreita da cruz» (II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 1: AAS 58 (1966) 947) para o banquete celeste, em que todos os eleitos se sentarão à mesa do Reino.

IV. A celebração litúrgica da Eucaristia

A MISSA DE TODOS OS SÉCULOS

1345. Desde o século II, temos o testemunho de São Justino, mártir, sobre as grandes linhas do desenrolar da celebração eucarística. Permaneceram as mesmas até aos nossos dias, em todas as grandes famílias litúrgicas. Eis o que ele escreve, cerca do ano 155, para explicar ao imperador pagão Antonino Pio (138-161) o que fazem os cristãos:

- «no dia que chamam Dia do Sol, realiza-se a reunião num mesmo lugar de todos os que habitam a cidade ou o campo.

- Leem-se as memórias dos Apóstolos e os escritos dos Profetas, tanto quanto o tempo o permite.
Quando o leitor acabou, aquele que preside toma a palavra para incitar e exortar à imitação dessas belas coisas.

- Em seguida, levantamo-nos todos juntamente e fazemos orações»
(São Justino, Apologia, 1. 67: CA 1. 184-186 (PG 6. 429)) «por nós mesmos [...] e por todos os outros, [...] onde quer que estejam, para que sejamos encontrados justos por nossa vida e ações, e fiéis aos mandamentos, e assim obtenhamos a salvação eterna.

- Terminadas as orações, damo-nos um ósculo uns aos outros.

- Depois, apresenta-se àquele que preside aos irmãos pão e uma taça de água e vinho misturados.
Ele toma-os e faz subir louvor e glória ao Pai do universo, pelo nome do Filho e do Espírito Santo, e dá graças (em grego: eucharistian) longamente, por termos sido julgados dignos destes dons.

- Quando ele termina as orações e ações de graças, todo o povo presente aclama: Amém.

- [...] Depois de aquele que preside ter feito a ação de graças e de o povo ter respondido, aqueles a que entre nós chamamos diáconos distribuem a todos os que estão presentes pão, vinho e água "eucaristizados" e também os levam aos ausentes»
(São Justino, Apologia, 1. 65: CA 1, 176-180 (PG 6. 428)).

1346.  A liturgia eucarística processa-se em conformidade com uma estrutura fundamental, que se tem conservado através dos séculos até aos nossos dias. Desdobra-se em dois grandes momentos, que formam basicamente uma unidade:

- a reunião, a liturgia da Palavra, com as leituras, a homilia e a oração universal;
- a liturgia eucarística, com a apresentação do pão e do vinho, a ação de graças consecratória e a comunhão.

- Liturgia da Palavra e liturgia eucarística constituem juntas "um só e mesmo ato de culto" (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 56: AAS 56 (1964) 115). Com efeito, a mesa posta para nós na Eucaristia é, ao mesmo tempo, a da Palavra de Deus e a do corpo do Senhor (Cf. III Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Verbum, 21: AAS 58 (1966) 827).

1347. Não é esse também o dinamismo da refeição pascal de Jesus Ressuscitado com os seus discípulos? Enquanto caminhavam, Ele explicava-lhes as Escrituras; depois, pondo-se à mesa com eles, «tomou o pão, proferiu a bênção, partiu-o e deu-lhe» (Cf. Lc. 24, 13-35).

O DESENROLAR DA CELEBRAÇÃO

1348. Todos se reúnem. Os cristãos acorrem a um mesmo lugar para a assembleia eucarística. A sua cabeça está o próprio Cristo, que é o ator principal da Eucaristia. Ele é o Sumo-Sacerdote da Nova Aliança. É Ele próprio que preside invisivelmente a toda a celebração eucarística. E é em representação d'Ele (agindo «in persona Christi capitis - na pessoa de Cristo-Cabeça»), que o Bispo ou o presbítero preside à assembleia, toma a palavra depois das leituras, recebe as oferendas e diz a oração eucarística. Todos têm a sua parte ativa na celebração, cada qual a seu modo: os leitores, os que trazem as oferendas, os que distribuem a comunhão e todo o povo cujo Amém manifesta a participação.

1349. A liturgia da Palavra comporta «os escritos dos Profetas», quer dizer, o Antigo Testamento, e «as Memórias dos Apóstolos», ou seja, as suas epístolas e os evangelhos. Depois da homilia, que é uma exortação a acolher esta Palavra como o que ela é na realidade, Palavra de Deus (Cf. 1ª Ts. 2, 13), e a pô-la em prática, vêm as intercessões por todos os homens, segundo a palavra do Apóstolo: «recomendo, antes de tudo, que se façam preces, orações, súplicas e ações de graças, por todos os homens, pelos reis e por todos os que exercem autoridade» (1ª Tm. 2, 1-2).

1350. A apresentação das oferendas (ofertório): traz-se então para o altar, por vezes processionalmente, o pão e o vinho que vão ser oferecidos pelo sacerdote em nome de Cristo no sacrifício eucarístico, no qual se tornarão o seu Corpo e o seu Sangue. É precisamente o mesmo gesto que Cristo fez na última ceia, «tomando o pão e o cálice». «Só a Igreja oferece esta oblação pura ao Criador, oferecendo-Lhe em ação de graças o que provém da sua criação» (Santo Ireneu de Lião, Adversus haereses 4. 18, 4: SC 100, 606 (PG 7, 1027): cf. Mt 1. 11). A apresentação das oferendas no altar assume o gesto de Melquisedec e põe os dons do Criador nas mãos de Cristo. É Ele que, no seu sacrifício, leva à perfeição todas as tentativas humanas de oferecer sacrifícios.

1351. Desde o princípio, com o pão e o vinho para a Eucaristia, os cristãos trazem as suas ofertas para a partilha com os necessitados. Este costume, sempre atual, da coleta
(Cf. 1ª Cor. 16, 1) inspira-se no exemplo de Cristo, que Se fez pobre para nos enriquecer (Cf. 2ª Cor. 8, 9):

- «os que são ricos e querem, dão, cada um conforme o que a si mesmo se impôs; o que se recolhe é entregue àquele que preside e ele, por seu turno, presta assistência aos órfãos, às viúvas, àqueles que a doença ou qualquer outra causa priva de recursos, aos prisioneiros, aos imigrantes, numa palavra, a todos os que sofrem necessidade» (São Justino, Apologia, 1. 67, 6: CA 1, 186-188 (PG 6, 429)).

1352. A anáfora: com a oração eucarística, oração de ação de graças e de consagração, chegamos ao coração e cume da celebração:

- no prefácio, a Igreja dá graças ao Pai, por Cristo, no Espírito Santo, por todas as suas obras: pela criação, redenção e santificação. Toda a comunidade une, então, as suas vozes àquele louvor incessante que a Igreja celeste - os anjos e todos os santos - cantam ao Deus três vezes Santo:

1353. na epiclese, pede ao Pai que envie o seu Espírito Santo (ou o poder da sua bênção) (Cf. Oração Eucarística 1 ou Cânone Romano, 90: Missale Romarum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970). p.451 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 518]) sobre o pão e o vinho, para que se tornem, pelo seu poder, o corpo e o sangue de Jesus Cristo, e para que os que participam na Eucaristia sejam um só corpo e um só espírito. (Algumas tradições litúrgicas colocam a epiclese depois da anamnese); na narração da instituição, a força das palavras e da ação de Cristo e o poder do Espírito Santo tomam sacramentalmente presentes, sob as espécies do pão e do vinho, o corpo e o sangue do mesmo Cristo, o seu sacrifício oferecido na cruz de uma vez por todas;

1354. na anamnese que se segue, a Igreja faz memória da paixão, ressurreição e regresso glorioso de Cristo Jesus: e apresenta ao Pai a oferenda do seu Filho, que nos reconcilia com Ele:

- nas intercessões, a Igreja manifesta que a Eucaristia é celebrada em comunhão com toda a Igreja do céu e da terra, dos vivos e dos defuntos, e na comunhão com os pastores da Igreja: o Papa, o Bispo da Diocese, o seu Presbitério e os seus Diáconos, e todos os Bispos do mundo inteiro com as suas Igrejas.

1355. Na comunhão, precedida da Oração do Senhor e da fracção do pão, os fiéis recebem «o pão do céu» e «o cálice da salvação», o Corpo e o Sangue de Cristo, que se entregou «para a vida do mundo» (Jo. 6, 51):

- porque este pão e este vinho foram, segundo a expressão antiga, «eucaristizados» (São Justino, Apologia, 1, 65: CA 1, 180 (PG. 6, 428)), «chamamos a este alimento Eucaristia; e ninguém pode tomar parte nela se não acreditar na verdade do que entre nós se ensina, se não recebeu o banho para a remissão dos pecados e o novo nascimento e se não viver segundo os preceitos de Cristo» (São Justino, Apologia, 1, 66, 1-2: CA 1. 180 (PG. 6, 428)).

V. O sacrifício sacramental: ação de graças, memorial, presença

1356. Se os cristãos celebram a Eucaristia desde as origens e sob uma forma que, na sua substância não mudou através da grande diversidade dos tempos e das liturgias, é porque sabem que estão ligados pela ordem do Senhor, dada na véspera da sua paixão: «fazei isto em memória de Mim» (1ª Cor. 11, 24-25).

1357. Esta ordem do Senhor, cumprimo-la celebrando o memorial do seu sacrifício. E fazendo-o, oferecemos ao Pai o que Ele próprio nos deu: os dons da sua criação, o pão e o vinho, transformados, pelo poder do Espírito Santo e pelas palavras de Cristo, no corpo e no sangue do mesmo Cristo: assim Cristo torna-se real e misteriosamente presente.

1358. Temos, pois, de considerar a Eucaristia

- como ação de graças e louvor ao Pai,
- como memorial sacrificial de Cristo e do Seu corpo,
- como presença de Cristo pelo poder da sua Palavra e do seu Espírito.

A AÇÃO DE GRAÇAS E O LOUVOR AO PAI

1359. A Eucaristia, sacramento da nossa salvação realizada por Cristo na cruz, é também um sacrifício de louvor em ação de graças pela obra da criação. No sacrifício eucarístico, toda a criação, amada por Deus, é apresentada ao Pai, através da morte e ressurreição de Cristo. Por Cristo, a Igreja pode oferecer o sacrifício de louvor em ação de graças por tudo o que Deus fez de bom, belo e justo, na criação e na humanidade.

1360. A Eucaristia é um sacrifício de ação de graças ao Pai, uma bênção pela qual a Igreja exprime o seu reconhecimento a Deus por todos os seus benefícios, por tudo o que Ele fez mediante a criação, a redenção e a santificação. Eucaristia significa, antes de mais, «ação de graças».

1361. A Eucaristia é também o sacrifício de louvor, pelo qual a Igreja canta a glória de Deus em nome de toda a criação. Este sacrifício de louvor só é possível através de Cristo: Ele une os fiéis à sua pessoa, ao seu louvor e à sua intercessão, de maneira que o sacrifício de louvor ao Pai ë oferecido por Cristo e com Cristo, para ser aceite em Cristo.

O MEMORIAL SACRIFICIAL DE CRISTO E DO SEU CORPO, A IGREJA

1362. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, a actualização e a oferenda sacramental do seu único sacrifício, na liturgia da Igreja que é o seu corpo. Em todas as orações eucarísticas encontramos, depois das palavras da instituição, uma oração chamada anamnese ou memorial.

1363. No sentido que lhe dá a Sagrada Escritura, o memorial não é somente a lembrança dos acontecimentos do passado, mas a proclamação das maravilhas que Deus fez pelos homens (Cf. Ex. 13. 3). Na celebração litúrgica destes acontecimentos, eles tomam-se de certo modo presentes e atuais. É assim que Israel entende a sua libertação do Egito: sempre que se celebrar a Páscoa, os acontecimentos do Êxodo tornam-se presentes à memória dos crentes, para que conformem com eles a sua vida.

1364. O memorial recebe um sentido novo no Novo Testamento. Quando a Igreja celebra a Eucaristia, faz memória da Páscoa de Cristo, e esta torna-se presente: o sacrifício que Cristo ofereceu na cruz uma vez por todas, continua sempre atual (Cf. Heb. 7, 25-27): «todas as vezes que no altar se celebra o sacrifício da cruz, no qual "Cristo, nossa Páscoa, foi imolado", realiza-se a obra da nossa redenção» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6).

1365. Porque é o memorial da Páscoa de Cristo, a Eucaristia é também um sacrifício. O caráter sacrificial da Eucaristia manifesta-se nas próprias palavras da instituição: «isto é o meu Corpo, que vai ser entregue por vós» e «este cálice é a Nova Aliança no meu Sangue, que vai ser derramado por vós» (Lc. 22, 19-20). Na Eucaristia, Cristo dá aquele mesmo Corpo que entregou por nós na cruz, aquele mesmo Sangue que «derramou por muitos em remissão dos pecados» (Mt. 26, 28).

1366. A Eucaristia é, pois, um sacrifício, porque representa (torna presente) o sacrifício da cruz, porque é dele o memorial e porque aplica o seu fruto:

- Cristo «nosso Deus e Senhor [...], ofereceu-se a Si mesmo a Deus Pai uma vez por todas, morrendo como intercessor sobre o altar da cruz, para realizar em favor deles [homens] uma redenção eterna. No entanto, porque após a sua morte não se devia extinguir o seu sacerdócio (Heb. 7, 24-27), na última ceia, "na noite em que foi entregue" (1ª Cor. 11, 13). [...] Ele [quis deixar] à Igreja, sua esposa bem-amada, um sacrifício visível (como o exige a natureza humana), em que fosse representado o sacrifício cruento que ia realizar uma vez por todas na cruz, perpetuando a sua memória até ao fim dos séculos e aplicando a sua eficácia salvífica à remissão dos pecados que nós cometemos cada dia» (Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 1: DS 1740).

1367. O sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício: «é uma só e mesma vítima e Aquele que agora Se oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que outrora se ofereceu a Si mesmo na cruz; só a maneira de oferecer é que é diferente» (Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 2: DS 1743). E porque «neste divino sacrifício, que se realiza na missa, aquele mesmo Cristo, que a Si mesmo Se ofereceu outrora de modo cruento sobre o altar da cruz, agora está contido e é imolado de modo incruento [...], este sacrifício é verdadeiramente propiciatório» (Ibid).

1368. A Eucaristia é igualmente o sacrifício da Igreja. A Igreja, que é o corpo de Cristo, participa na oblação da sua Cabeça. Com Ele, ela própria é oferecida integralmente. Ela une-se à sua intercessão junto do Pai em favor de todos os homens. Na Eucaristia, o sacrifício de Cristo torna-se também o sacrifício dos membros do seu corpo. A vida dos fiéis, o seu louvor, o seu sofrimento, a sua oração, o seu trabalho unem-se aos de Cristo e à sua oblação total, adquirindo assim um novo valor. O sacrifício de Cristo presente sobre o altar proporciona a todas as gerações de cristãos a possibilidade de se unirem à sua oblação.

Nas catacumbas, a Igreja é frequentemente representada como uma mulher em oração, de braços estendidos em atitude orante. Como Cristo, que estendeu os braços na cruz, assim, por Ele, com Ele e n'Ele, a Igreja oferece-se e intercede por todos os homens.

1369. Toda a Igreja está unida à oblação e intercessão de Cristo. Encarregado do ministério de Pedro na Igreja, o Papa está associado a toda e qualquer celebração da Eucaristia, na qual é nomeado como sinal e servidor da unidade da Igreja universal. O Bispo do lugar é sempre responsável pela Eucaristia, mesmo quando presidida por um Presbítero; o seu nome é citado nela para significar a sua presidência da Igreja particular, no meio do presbitério e com a assistência dos Diáconos. A comunidade intercede também por todos os ministros que, por ela e com ela, oferecem o sacrifício eucarístico:

- «seja tida como legítima somente aquela Eucaristia que é presidida pelo Bispo ou por quem ele encarregou» (Santo Inácio de Antioquia, Epistula Ad Smyrnaeos 8, 1: SC 10bis. 138 (Funk 1, 282)).

- «É pelo ministério dos Presbíteros que o sacrifício espiritual dos fiéis se consuma em união com o sacrifício de Cristo. Mediador único, que é oferecido na Eucaristia de modo incruento e sacramental, pelas mãos deles, em nome de toda a Igreja, até quando o mesmo Senhor voltar» (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 993).

1370. À oblação de Cristo unem-se não só os membros que estão ainda neste mundo, mas também os que já estão na glória do céu: é em comunhão com a santíssima Virgem Maria e fazendo memória d'Ela, assim como de todos os santos e de todas as santas, que a Igreja oferece o sacrifício eucarístico. Na Eucaristia, a Igreja, com Maria, está como que ao pé da cruz, unida à oblação e à intercessão de Cristo.

1371. O sacrifício eucarístico é também oferecido pelos fiéis defuntos, «que morreram em Cristo e não estão ainda de todo purificados» (Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 2: DS 1743), para que possam entrar na luz e na paz de Cristo:

- «Enterrai este corpo não importa onde! Não vos dê isso qualquer cuidado! Tudo o que vos peço é que vos lembreis de mim diante do altar do Senhor, onde quer que estejais» (Santo Agostinho, Confissões 9, II, 27: CCL 27, 149 (PL 32, 775): palavras de Santa Mônica, antes de morrer, a Santo Agostinho e ao seu irmão).

- «Depois [na anáfora], nós rezamos pelos santos Padres e Bispos falecidos, e em geral por todos aqueles que morreram antes de nós, certos de que isso será de grande proveito para as almas em favor das quais tal súplica se faz, enquanto está presente a vítima santa e temível [...]. Apresentando a Deus as nossas súplicas pelos que morreram, tenham embora sido pecadores, nós [...] apresentamos Cristo imolado pelos nossos pecados, tornando assim propício, para eles e para nós, o Deus que é amigo dos homens» (São Cirilo de Jerusalém, Catecheses mystagogicae 5, 9-10: SC 126, 158-160 (PG. 30, 1116-1117)).

1372. Santo Agostinho resumiu admiravelmente esta doutrina que nos incita a uma participação cada vez mais perfeita no sacrifício do nosso Redentor que celebramos na Eucaristia:

- «toda esta cidade resgatada, ou seja, a assembleia e sociedade dos santos, é oferecida a Deus como um sacrifício universal pelo Sumo-Sacerdote que, sob a forma de servo, foi ao ponto de se oferecer por nós na sua paixão, para fazer de nós corpo duma tal Cabeça [...] Tal é o sacrifício dos cristãos: "nós que somos muitos, formamos em Cristo um só corpo" (Rm. 12, 5). E este sacrifício, a Igreja não cessa de o renovar no sacramento do altar bem conhecido dos fiéis, em que lhe é mostrado que ela própria é oferecida naquilo que oferece» (Santo Agostinho, De Civitate Dei 10, 6: CSEL 40/1, 456 (PL 41, 284)).

A PRESENÇA DE CRISTO PELO PODER DA SUA PALAVRA E DO ESPÍRITO SANTO

1373. «Jesus Cristo, que morreu, que ressuscitou, que está à direita de Deus, que intercede por nós» (Rm. 8, 34), está presente na sua Igreja de múltiplos modos (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 53): na sua Palavra, na oração da sua Igreja, «onde dois ou três estão reunidos em Meu nome» (Mt. 18, 20), nos pobres, nos doentes, nos prisioneiros (Cf. Mt. 25, 31-46), nos seus sacramentos, dos quais é o autor, no sacrifício da missa e na pessoa do ministro. Mas está presente «sobretudo sob as espécies eucarísticas» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 7: AAS 56 (1964) 100-101).

1374. O modo da presença de Cristo sob as espécies eucarísticas é único. Ele eleva a Eucaristia acima de todos os sacramentos e faz dela «como que a perfeição da vida espiritual e o fim para que tendem todos os sacramentos» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 73, a. 3, c: Ed. Leon. 12, 140). No santíssimo sacramento da Eucaristia estão «contidos, verdadeira, real e substancialmente, o corpo e o sangue, conjuntamente com a alma e a divindade de nosso Senhor Jesus Cristo e, por conseguinte, Cristo completo» (Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de s.s. Eucharistia, can. 1: Ds 1651). «Esta presença chama-se "real", não a título exclusivo como se as outras presenças não fossem "reais", mas por excelência, porque é substancial, e porque por ela se torna presente Cristo completo, Deus e homem» (Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 764).

1375. É pela conversão do pão e do vinho no Corpo e no Sangue de Cristo que Ele se torna presente neste sacramento. Os Padres da Igreja proclamaram com firmeza a fé da mesma Igreja na eficácia da Palavra de Cristo e da ação do Espírito Santo, para operar esta conversão. Assim, São João Crisóstomo declara:

- «não é o homem que faz com que as coisas oferecidas se tomem Corpo e Sangue de Cristo, mas o próprio Cristo, que foi crucificado por nós. O sacerdote, figura de Cristo, pronuncia estas palavras, mas a sua eficácia e a graça são de Deus. Isto é o Meu Corpo, diz ele. Esta palavra transforma as coisas oferecidas» (São João Crisóstomo, De proditione Iudae homilia 1, 6: PG 49, 380).

- E Santo Ambrósio diz a respeito da mesma conversão:

- estejamos bem convencidos de que «isto não é o que a natureza formou, ruas o que a bênção consagrou, e de que a força da bênção ultrapassa a da natureza, porque pela bênção a própria natureza é mudada» (Santo Ambrósio, De mysteriis 9, 50: CSEL 73, 110 (PL 16, 405)). «A Palavra de Cristo, que pôde fazer do nada o que não existia, não havia de poder mudar coisas existentes no que elas ainda não eram? Porque não é menos dar às coisas a sua natureza original do que mudá-la» (Ibid. 9, 52: CSEL 73, 112 (PL 16, 407)).

1376. O  Concílio de Trento resume a fé católica declarando: «porque Cristo, nosso Redentor, disse que o que Ele oferecia sob a espécie do pão era verdadeiramente o seu Corpo, sempre na Igreja se teve esta convicção que o sagrado Concílio de novo declara: pela consagração do pão e do vinho opera-se a conversão de toda a substância do pão na substância do Corpo de Cristo nosso Senhor, e de toda a substância do vinho na substância do seu Sangue; a esta mudança, a Igreja católica chama, de modo conveniente e apropriado, transubstanciação» (Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharista, c. 4: DS 1642).

1377. A presença eucarística de Cristo começa no momento da consagração e dura enquanto as espécies eucarísticas subsistirem. Cristo está presente todo em cada uma das espécies e todo em cada uma das suas partes, de maneira que a fração do pão não divide Cristo (Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharista. c. 3: DS 1641).

1378. O culto da Eucaristia. Na liturgia da Missa, nós exprimimos a nossa fé na presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho, entre outras maneiras, ajoelhando ou inclinando-nos profundamente em sinal de adoração do Senhor. «A Igreja Católica sempre prestou e continua a prestar este culto de adoração que é devido ao sacramento da Eucaristia, não só durante a missa, mas também fora da sua celebração: conservando com o maior cuidado as Hóstias Consagradas, apresentando-as aos fiéis para que solenemente as venerem, e levando-as em procissão» (Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 769).

1379. A sagrada Reserva (Sacrário) era, ao princípio, destinada a guardar, de maneira digna, a Eucaristia, para poder ser levada aos doentes e ausentes, fora da missa. Pelo aprofundamento da fé na presença real de Cristo na sua Eucaristia, a Igreja tomou consciência do sentido da adoração silenciosa do Senhor, presente sob as espécies eucarísticas, por isso que o sacrário deve ser colocado num lugar particularmente digno da igreja; deve ser construído de tal modo que sublinhe e manifeste a verdade da presença real de Cristo no Santíssimo Sacramento.

1380. É de suma conveniência que Cristo tenha querido ficar presente à sua Igreja deste modo único. Uma vez que estava para deixar os seus sob forma visível, Cristo quis dar-nos a sua presença sacramental; e visto que ia sofrer na cruz para nos salvar, quis que tivéssemos o memorial do amor com que nos amou «até ao fim» (Jo. 13, 1), até ao dom da própria vida. Com efeito, na sua presença eucarística, Ele fica misteriosamente no meio de nós, como Aquele que nos amou e se entregou por nós (Cf. Gl. 2, 20), e permanece sob os sinais que exprimem e comunicam este amor:

- «a Igreja e o mundo têm grande necessidade do culto eucarístico. Jesus espera-nos neste sacramento do amor. Não regateemos o tempo para estar com Ele na adoração, na contemplação cheia de fé e disposta a reparar as faltas graves e os pecados do mundo. Que a nossa adoração não cesse jamais» (João Paulo II, Ep. Dominicae Cenae, 3: AAS 72 (1980) 119; cf. Enchiridion Vaticanum 7, 177).

1381. «A presença do verdadeiro corpo e do verdadeiro sangue de Cristo neste sacramento, "não a apreendemos pelos sentidos, diz São Tomás, mas só pela fé, que se apoia na autoridade de Deus". É por isso que, comentando o texto de São Lucas 22, 19 "isto é o Meu Corpo que será entregue por vós", São Cirilo de Alexandria declara: "não vás agora perguntar-te se isso é verdade; mas acolhe com fé as palavras do Senhor, porque Ele, que é a verdade, não mente"» (Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 757; cf. São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 75, a. 1. c: Ed. Leon. 12, 156; São Cirilo de Alexandria, Commentarius in Lucam 22, 19: PG 72, 912):

 «Adoro te devote, latens Deitas,
Quae sub his figuris vere latitas:
Tibi se cor meum totem subjicit,
Quica, Te contemplans, totem deficit.
Adoro-te com devoção, ó Deus que te escondes,
Que sob estas figuras de verdade te ocultas:
A ti meu coração se submete inteiramente
Porque, ao contemplar-te, desfalece por completo.
Visus, tactus, gustus in Te fallitur
Sed auditu solo tutu creditur:
Credo quidquid dixit Dei Filius:
Nil hoc Veritatis verbo verius»
(AHMA 50, 589).
Visão, tato e paladar em ti falham,
Apenas ouvindo se crê com segurança:
Creio em tudo o que disse o Filho de Deus:
Nada mais verdadeiro que esta palavra da Verdade.

 VI. O banquete pascal

1382. A Missa é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o memorial sacrificial em que se perpetua o sacrifício da cruz e o banquete sagrado da comunhão do Corpo e Sangue do Senhor. Mas a celebração do sacrifício eucarístico está toda orientada para a união íntima dos fiéis com Cristo pela comunhão. Comungar é receber o próprio Cristo, que se ofereceu por nós.

1383. O altar, à volta do qual a Igreja se reúne na celebração da Eucaristia, representa os dois aspectos dum mesmo mistério: o altar do sacrifício e a mesa do Senhor, e isto tanto mais que o altar cristão é o símbolo do próprio Cristo, presente no meio da assembleia dos seus fiéis, ao mesmo tempo como vítima oferecida para a nossa reconciliação e como alimento celeste que se nos dá. «Com efeito, o que é o altar de Cristo senão a imagem do corpo de Cristo»? - Pergunta Santo Ambrósio (Santo Ambrósio, De Sacramentis, 5, 7: CSEL 73, 61 (PL 16, 447)); e noutro passo: «o altar representa o corpo [de Cristo], e o corpo de Cristo está sobre o altar» (Santo Ambrósio, De Sacramentis, 4, 7: CSEL73. 49 (PL 16. 437)). A liturgia exprime esta unidade do sacrifício e da comunhão em numerosas orações. Assim, a Igreja de Roma reza na sua anáfora:

- «humildemente Vos suplicamos, Deus todo-poderoso, que está nossa oferenda seja apresentada pelo vosso santo Anjo no altar celeste, diante da vossa divina majestade, para que todos nós, participando deste altar pela comunhão do santíssimo corpo e sangue do vosso Filho, alcancemos a plenitude das bênçãos e graças do céu»» (Oração Eucarística I ou Cânone Romano, 96: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanas 1970). p.453 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 521])

«TOMAI TODOS E COMEI»: A COMUNHÃO

1384. O Senhor dirige-nos um convite insistente a que O recebamos no sacramento da Eucaristia: «em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a Carne do Filho do Homem e não beberdes o seu Sangue, não tereis a vida em vós» (Jo. 6, 53).

1385. Para responder a este convite, devemos preparar-nos para este momento tão grande e santo. São Paulo exorta a um exame de consciência: «quem comer o pão ou beber do cálice do Senhor indignamente será réu do Corpo e do Sangue do Senhor. Examine-se, pois, cada qual a si mesmo e então coma desse pão e beba deste cálice; pois quem come e bebe, sem discernir o corpo do Senhor, come e bebe a própria condenação» (1ª Cor 11, 27-29). Aquele que tiver consciência dum pecado grave deve receber o sacramento da Reconciliação antes de se aproximar da Comunhão.

1386. Perante a grandeza deste sacramento, o fiel só pode retomar humildemente e com ardente fé a palavra do centurião (Cf. Mt 8, 8) : «domine, non sum dignus, ut intres sub tectum meum, sed tantum dic verbum, et sanabitur anima mea – Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma [só] palavra e serei salvo» (Rito da Comunhão. 133: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.474 [Missal Romano. Gráfica de Coimbra 1992, 546)). E na divina liturgia de São João Crisóstomo, os fiéis oram no mesmo Espírito:

- «faz-me comungar hoje, ó Filho de Deus, na tua ceia mística. Porque eu não revelarei o segredo aos teus inimigos, nem te darei o beijo de Judas. Mas, como o ladrão, eu te suplico: lembra-Te de mim, Senhor, no teu Reino» (Liturgia Bizantina. Anáfora de São João Crisóstomo, Prece antes da Comunhão: F. E. Brightman, Liturgies Eastern and Western (Oxford 1896) p. 394 (PG 63, 920)).

1387. Para se prepararem convenientemente para receber este sacramento, os fiéis devem observar o jejum prescrito na sua Igreja (Cf. CIC can. 919). A atitude corporal (gestos, traje) deve traduzir o respeito, a solenidade, a alegria deste momento em que Cristo Se torna nosso hóspede.

1388. É conforme ao próprio sentido da Eucaristia que os fiéis, se tiverem as disposições requeridas (Cf. CIC can. 916-917: AAS 75 (1983 II), pp. 165-166), recebam a Comunhão quando participam na missa (Os fiéis, no mesmo dia. só podem receber a ss. Eucaristia uma segunda vez. Comissão Pontifícia para a Interpretação Autêntica do Código de Direito Canónico, Responsa ad proposita dubia, 1: AAS 76 (1984) 746): «recomenda-se vivamente aquela mais perfeita participação na missa em que os fiéis, depois da comunhão do sacerdote, recebem, do mesmo sacrifício, o corpo do Senhor» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 55: AAS 56 (1964) 115).

1389. A Igreja impõe aos fiéis a obrigação de «participar na divina liturgia nos domingos e dias de festa» (Cf. Decr. Ecclesiarum Orientalium, 15: AAS 57 (1965) 81) e de receber a Eucaristia ao menos uma vez em cada ano, se possível no tempo pascal (Cf. CIC can. 920) preparados pelo sacramento da Reconciliação. Mas recomenda-lhes vivamente que recebam a santa Eucaristia aos domingos e dias de festa, ou ainda mais vezes, mesmo todos os dias.

1390. Graças à presença sacramental de Cristo sob cada uma das espécies, a comunhão apenas sob a espécie de pão permite receber todo o fruto de graça da Eucaristia. Por razões pastorais, esta maneira de comungar estabeleceu-se legitimamente como a mais habitual no rito latino. «A sagrada Comunhão tem uma forma mais plena, enquanto sinal, quando é feita sob as duas espécies. Com efeito, nesta forma manifesta-se mais perfeitamente o sinal do banquete eucarístico» (Instrução geral do Missal Romano, 240: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.68 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 51]). É a forma habitual de comungar, nos ritos orientais.

OS FRUTOS DA COMUNHÃO

1391. A Comunhão aumenta a nossa união com Cristo. Receber a Eucaristia na comunhão traz consigo, como fruto principal, a união íntima com Cristo Jesus. De fato, o Senhor diz: «quem come a minha Carne e bebe o meu Sangue permanece em Mim e Eu nele» (Jo. 6, 56). A vida em Cristo tem o seu fundamento no banquete eucarístico: «assim como o Pai, que vive, Me enviou, e Eu vivo pelo Pai, também o que Me come viverá por Mim» (Jo. 6, 57):

- «quando, nas festas do Senhor, os fiéis recebem o Corpo do Filho, proclamam uns aos outros a boa-nova de que lhes foram dadas as arras da vida, como quando o anjo disse a Maria de Magdala: "Cristo ressuscitou!". Eis que também agora a vida e a ressurreição são conferidas àquele que recebe Cristo» (Fanqîth. Breviarium iuxta ritum Ecclesiae Antiochenae Syrorum, v. 1 (Mossul 1886) p. 237 a-b).

1392. O que o alimento material produz na nossa vida corporal, realiza-o a Comunhão, de modo admirável, na nossa vida espiritual. A comunhão da carne de Cristo Ressuscitado, «vivificada pelo Espírito Santo e vivificante» (Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966)997), conserva, aumenta e renova a vida da graça recebida no Batismo. Este crescimento da vida cristã precisa de ser alimentado pela Comunhão eucarística, pão da nossa peregrinação, até à hora da morte, em que nos será dado como viático.

1393. A Comunhão afasta-nos do pecado. O corpo de Cristo que recebemos na Comunhão é «entregue por nós» e o sangue que nós bebemos é «derramado pela multidão, para remissão dos pecados». É por isso que a Eucaristia não pode unir-nos a Cristo sem nos purificar, ao mesmo tempo, dos pecados cometidos, e nos preservar dos pecados futuros:

- «sempre que O recebemos, anunciamos a morte do Senhor (Cf. 1ª Cor. 11, 26). Se nós anunciamos a morte do Senhor, anunciamos a remissão dos pecados. Se, de cada vez que o seu Sangue é derramado, é derramado para remissão dos pecados, eu devo recebê-lo sempre, para que sempre Ele perdoe os meus pecados. Eu que peco sempre, devo ter sempre um remédio» (Santo Ambrósio, De Sacramentis, 4. 28: CSEL 73, 57-58 (PL 16, 446)).

1394. Tal como o alimento corporal serve para restaurar as forças perdidas, assim também a Eucaristia fortifica a caridade que, na vida quotidiana, tende a enfraquecer-se; e esta caridade vivificada apaga os pecados veniais (Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª. Decretum de ss. Eucharista, c. 2: DS 1638). Dando-se a nós, Cristo reaviva o nosso amor e torna-nos capazes de quebrar as ligações desordenadas às criaturas e de nos radicarmos n'Ele.

«Uma vez que Cristo morreu por nós por amor, quando nós fazemos memória da sua morte no momento do sacrifício, pedimos que esse amor nos seja dado pela vinda do Espírito Santo; suplicamos humildemente que, em virtude desse amor pelo qual Cristo quis morrer por nós, também nós, recebendo a graça do Espírito Santo, possamos considerar o mundo como crucificado para nós e sermos nós próprios crucificados para o mundo; [...] tendo recebido o dom do amor, morramos para o pecado e vivamos para Deus» (São Fulgêncio de Ruspas, Contra gesta Fabiani 28, 17: CCL 91A, 813-814 (PL 65, 789)).

1395. Pela mesma caridade que acende em nós, a Eucaristia preserva-nos dos pecados mortais futuros. Quanto mais participarmos na vida de Cristo e progredirmos na sua amizade, mais difícil nos será romper com Ele pelo pecado mortal. A Eucaristia não está ordenada ao perdão dos pecados mortais. Isso é próprio do sacramento da Reconciliação. O que é próprio da Eucaristia é ser o sacramento daqueles que estão na plena comunhão da Igreja.

1396. A unidade do corpo Místico: a Eucaristia faz a Igreja. Os que recebem a Eucaristia ficam mais estreitamente unidos a Cristo. Por isso mesmo, Cristo une todos os fiéis num só corpo: a Igreja. A Comunhão renova, fortalece e aprofunda esta incorporação na Igreja já realizada pelo Batismo. No Batismo fomos chamados a formar um só corpo (Cf. 1ª Cor. 12, 13). A Eucaristia realiza esta vocação: «o cálice da bênção que abençoamos, não é comunhão com o Sangue de Cristo? O pão que partimos não é comunhão com o Corpo de Cristo? Uma vez que há um único pão, nós, embora muitos, somos um só corpo, porque participamos desse único pão» (1ª Cor. 10, 16-17):

- «se sois o corpo de Cristo e seus membros, é o vosso sacramento que está colocado sobre a mesa do Senhor, é o vosso sacramento que recebeis. Vós respondeis ”Amém” [“Sim, é verdade”!] àquilo que recebeis e, ao responder, o subscreveis. Tu ouves esta palavra: «o Corpo de Cristo»; e respondes:Amém”, Então, sê um membro de Cristo, para que o teu “Amém” seja verdadeiro» (Santo Agostinho, Sermão 272: PL 38, 1247).

1397. A Eucaristia compromete-nos com os pobres: para receber, na verdade, o Corpo e o Sangue de Cristo entregue por nós, temos de reconhecer Cristo nos mais pobres, seus irmãos (Cf. Mt. 25, 40):

- «saboreaste o Sangue do Senhor e não reconheces sequer o teu irmão. Desonras esta mesa, se não julgas digno de partilhar o teu alimento aquele que foi julgado digno de tomar parte nesta mesa. Deus libertou-te de todos os teus pecados e chamou-te para ela; e tu nem então te tornaste mais misericordioso» (São João Crisóstomo, In epistulam I ad Corinthios, homilia 27. 5: PG 61, 230).

1398. A Eucaristia e a unidade dos cristãos. Perante a grandeza deste mistério, Santo Agostinho exclama: «o sacramentum pietatis! O signum unitatis! O vinculum caritatis! (Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus 26, 13: CCL 36. 266 (PL 35, 1613): cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 47: AAS 56 (1964) 113) - Ó sacramento da piedade, ó sinal da unidade, ó vínculo da caridade»! Quanto mais dolorosas se fazem sentir as divisões da Igreja que rompem a comum participação na mesa do Senhor, tanto mais prementes são as orações que fazemos ao Senhor para que voltem os dias da unidade completa de todos os que creem n' Ele.

1399. As Igrejas orientais que não estão em comunhão plena com a Igreja Católica celebram a Eucaristia com um grande amor. «essas Igrejas, embora separadas, têm verdadeiros sacramentos; e principalmente, em virtude da sucessão apostólica, o sacerdócio e a Eucaristia, por meio dos quais continuam unidos a nós por vínculos estreitíssimos» (II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 15: AAS 57 (1965) 102). Portanto, «uma certa comunhão in sacris é não só possível, mas até aconselhável em circunstâncias oportunas e com aprovação da autoridade eclesiástica» (II Concílio do Vaticano, Decr, Unitatis redintegratio, 15: AAS 57 (1965) 102: ef. CIC can.844, § 3).

1400. As comunidades eclesiais saídas da Reforma, separadas da Igreja Católica, «não [conservaram] a genuína e íntegra substância do mistério eucarístico, sobretudo por causa da falta do sacramento da Ordem» (II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 22: AAS 57 (1965) 106). É por esse motivo que a intercomunhão eucarística com estas comunidades não é possível para a Igreja Católica. No entanto, estas comunidades eclesiais, «quando na santa ceia fazem memória da morte e ressurreição do Senhor, professam que a vida é significada na comunhão com Cristo e esperam a sua vinda gloriosa» (II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 22: AAS 57 (1965) 106).

1401. Se urgir uma grave necessidade, segundo o juízo do Ordinário os ministros católicos podem ministrar os sacramentos (Eucaristia, Penitência, Unção dos Enfermos) aos outros cristãos que não estão em plena comunhão com a Igreja Católica, mas que os pedem por sua livre vontade: requer-se, nesse caso, que manifestem a fé católica em relação a estes sacramentos e que se encontrem nas devidas disposições (Cf. CIC can. 844. § 4).

VII. A Eucaristia - «Penhor da futura glória»

1402. Numa antiga oração, a Igreja aclama assim o mistério da Eucaristia: «o sacrum convivium in quo Christus sumitur: recolitur memoria passionis eius; mens impletur gratia et futurae gloriae nobis pignus datur – Ó sagrado banquete, em que se recebe Cristo e se comemora a sua paixão, em que a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da futura glória» (Na solenidade do santíssimo corpo e sangue de Cristo, Antífona do «Magnificat» das Vésperas II: Liturgia Horarum, editio typica, v. 3 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 502 [Liturgia das Horas. v. 3 (Gráfica de Coimbra 1983) p. 621]). Se a Eucaristia é o memorial da Páscoa da Senhor, se pela nossa comunhão no altar somos cumulados da «plenitude das bênçãos se graças do céu» (Oração Eucarística I ou Cânone Romano. 96: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.453 [Missal Romano. Gráfica de Coimbra 1992, 521]), a Eucaristia é também a antecipação da glória celeste.

1403. Na última ceia, o próprio Senhor chamou a atenção dos seus discípulos para a consumação da Páscoa no Reino de Deus: «Eu vos digo que não voltarei a beber deste fruto da videira, até o dia em que beberei convosco o vinho novo no Reino do meu Pai» (Mt. 26, 29) (247. Cf. Lc 22, 18: Mc 14. 25). Sempre que a Igreja celebra a Eucaristia, lembra-se desta promessa, e o seu olhar volta-se para «Aquele que vem» (Ap. 1, 4). Na sua oração, ela clama pela sua vinda: «Marana tha» (1ª Cor. 16, 22), «Vem, Senhor Jesus»! (Ap. 22, 20), «que a Tua graça venha e que este mundo passe»! (Didaké 10, 6: SC 248, 180 (Funk, Patres apostolici 1, 24)).

1404. A Igreja sabe que, desde já, o Senhor vem na sua Eucaristia e que está ali, no meio de nós. Mas esta presença é velada. E é por isso que nós celebramos a Eucaristia «expectantes beatam spem et adventum Salvatoris nostri Jesu Christi - enquanto aguardamos a feliz esperança e a vinda de Jesus Cristo nosso Salvador» (Rito de Comunhão, 126 [Embolismo depois do Pai Nosso]: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.472 [a tradução oficial portuguesa difere um pouco: «enquanto esperamos a vinda gloriosa de Jesus Cristo nosso Salvador»: Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 5451: cf. Tt 2, 13), pedindo a graça de ser acolhidos «com bondade no vosso Reino, onde também nós esperamos ser recebidos, para vivermos [...] eternamente na vossa glória, quando enxugardes todas as lágrimas dos nossos olhos; e, vendo-Vos tal como sois, Senhor nosso Deus, seremos para sempre semelhantes a Vós e cantaremos sem fim os vossos louvores, por Jesus Cristo nosso Senhor» (Oração Eucarística III, 116: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 465 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 535]).

1405. Desta grande confiança - dos novos céus e da nova terra, onde habitará a justiça (Cf. 2ª Pe. 3, 13) - não temos garantia mais segura nem sinal mais manifesto do que a Eucaristia. Com efeito, cada vez que se celebra este mistério, «realiza-se a obra da nossa redenção» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6) e nós «partimos o mesmo pão, que é remédio de imortalidade, antídoto para não morrer, mas viver em Jesus Cristo para sempre» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6).

Resumindo:

1406. Jesus diz: «Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente [...] Quem come a minha Carne e bebe o meu Sangue tem a vida eterna [...], permanece em Mim, e Eu nele» (Jo. 6, 51.54.56).

1407. A Eucaristia é o coração e o cume da vida da Igreja, porque nela Cristo associa a sua Igreja e todos os seus membros ao seu sacrifício de louvor e de ação de graças, oferecido ao Pai uma vez por todas na cruz; por este sacrifício, Ele derrama as graças da salvação sobre o seu corpo, que é a Igreja.

1408. A celebração eucarística inclui sempre: a proclamação da Palavra de Deus, a ação de graças a Deus Pai por todos os seus benefícios, sobretudo pelo dom do seu Filho, a consagração do pão e do vinho e a participação no banquete litúrgico pela recepção do corpo e do sangue do Senhor Estes elementos constituem um só e mesmo ato de culto.

1409. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, isto é, da obra da salvação realizada pela vida, morte e ressurreição de Cristo, obra tornada presente pela ação litúrgica.

1410. É o próprio Cristo, sumo e eterno sacerdote da Nova Aliança, que, agindo pelo ministério dos sacerdotes, oferece o sacrifício eucarístico. E é ainda o mesmo Cristo, realmente presente sob as espécies do pão e do vinho, que é a oferenda do sacrifício eucarístico.

1411. Só os Sacerdotes validamente ordenados podem presidir à Eucaristia e consagrar o pão e o vinho, para que se tornem o Corpo e o Sangue do Senhor:

1412. Os sinais essenciais do sacramento eucarístico são o pão de trigo e o vinho da videira, sobre os quais é invocada a bênção do Espírito Santo, e o sacerdote pronuncia as palavras da consagração ditas por Jesus durante a última ceia: «isto é o meu Corpo, que será entregue por vós... Este é o cálice do meu Sangue...».

1413. Pela consagração, opera-se a transubstanciação do pão e do vinho no Corpo e no Sangue de Cristo. Sob as espécies consagradas do pão e do vinho, o próprio Cristo, vivo e glorioso, está presente de modo verdadeiro, real e substancial, com o seu Corpo e o seu Sangue, com a sua alma e a sua divindade (Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharistae. c. 3: DS 1640; Ibid., can. 1: DS 1651).

1414. Enquanto sacrifício, a Eucaristia é oferecida também em reparação dos pecados dos vivos e dos defuntos e para obter de Deus benefícios espirituais ou temporais.

1415. Aquele que quiser receber Cristo na Comunhão eucarística deve encontrar-se em estado de graça. Se alguém tiver consciência de ter pecado mortalmente, não deve aproximar-se da Eucaristia sem primeiro ter recebido a absolvição no sacramento da Penitência.

1416. A sagrada Comunhão do Corpo e Sangue de Cristo aumenta a união do comungante com o Senhor perdoa-lhe os pecados veniais e preserva-o dos pecados graves. E uma vez que os laços da caridade entre o comungante e Cristo são reforçados, a recepção deste sacramento reforça a unidade da Igreja, corpo Místico de Cristo.

1417. A Igreja recomenda vivamente aos fiéis que recebam a sagrada Comunhão quando participam na celebração da Eucaristia; e impõe-lhes a obrigação de o fazerem ao menos uma vez por ano.

1418. Uma vez que Cristo em pessoa está presente no Sacramento do Altar; devemos honrá-Lo com culto de adoração. «A visita ao Santíssimo Sacramento é uma prova de gratidão, um sinal de amor e um dever de adoração para com Cristo nosso Senhor» (Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 771).

1419. Tendo passado deste mundo para o Pai, Cristo deixou-nos na Eucaristia o penhor da glória junto d'Ele: a participação no santo sacrifício identifica-nos com o seu coração, sustenta as nossas forças ao longo da peregrinação desta vida, faz-nos desejar a vida eterna e desde já nos une à Igreja do céu, à Santíssima Virgem e a todos os santos.

OS SACRAMENTOS DE CURA

1420. Pelos sacramentos da iniciação cristã, o homem recebe a vida nova de Cristo. Ora, esta vida, nós trazemo-la «em vasos de barro». Por enquanto, ela está ainda «oculta com Cristo em Deus» (Cl. 3, 3). Vivemos ainda na «nossa morada terrena» (Cf. 2ª Cor. 5, 1), sujeita ao sofrimento à doença e à morte. A vida nova de filhos de Deus pode ser enfraquecida e até perdida pelo pecado.

1421. O Senhor Jesus Cristo, médico das nossas almas e dos nossos corpos, que perdoou os pecados ao paralítico e lhe restituiu a saúde do corpo (Cf. Mc. 2, 1-12) quis que a sua Igreja continuasse, com a força do Espírito Santo, a sua obra de cura e de salvação, mesmo para com os seus próprios membros. É esta a finalidade dos dois sacramentos de cura: o sacramente da Penitência e o da Unção dos enfermos.

ARTIGO 4

O SACRAMENTO DA PENITÊNCIA
E DA RECONCILIAÇÃO

1422. «Aqueles que se aproximam do sacramento da Penitência obtêm da misericórdia de Deus o perdão da ofensa a Ele feita e, ao mesmo tempo, são reconciliados com a Igreja, que tinham ferido com o seu pecado, a qual, pela caridade, exemplo e oração, trabalha pela sua conversão» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11 : AAS 57 (1965) 15).

I. Como se chama este sacramento?

1423. É chamado sacramento da conversão, porque realiza sacramentalmente o apelo de Jesus à conversão (Cf. Mc. 1, 15) e o esforço de regressar à casa do Pai (Cf. Lc. 15, 18) da qual o pecador se afastou pelo pecado.

- É chamado sacramento da Penitência, porque consagra uma caminhada pessoal e eclesial de conversão, de arrependimento e de satisfação por parte do cristão pecador.

1424. É chamado sacramento da confissão, porque o reconhecimento, a confissão dos pecados perante o Sacerdote é um elemento essencial deste sacramento. Num sentido profundo, este sacramento é também uma «confissão», reconhecimento e louvor da santidade de Deus e da sua misericórdia para com o homem pecador.

- E chamado sacramento do perdão, porque, pela absolvição sacramental do sacerdote. Deus concede ao penitente «o perdão e a paz» (Ordo Paenitentiae. 46.55 (TypisPolyglottis Vaticanis 1974) p. 27. 37 [Celebração da Penitência, 46.55 (Coimbra. Gráfica de Coimbra — Conferência Episcopal Portuguesa, 1997) p. 47. 65]).

- E chamado sacramento da Reconciliação, porque dá ao pecador o amor de Deus que reconcilia: «deixai-vos reconciliar com Deus» (2ª Cor. 5, 20). Aquele que vive do amor misericordioso de Deus está pronto para responder ao apelo do Senhor: «vai primeiro reconciliar-te com teu irmão» (Mt. 5, 24).

II. Porquê, um sacramento de Reconciliação depois do Batismo?

1425. «Vós fostes lavados, fostes santificados, fostes justificados pelo nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito do nosso Deus» (1ª Cor. 6, 11). Precisamos de tomar consciência da grandeza do dom de Deus que nos foi concedido nos sacramentos da iniciação cristã, para nos apercebermos de até que ponto o pecado é algo de inadmissível para aquele que foi revestido de Cristo (Cf. Gl. 3, 27). Mas o apóstolo São João diz também: «se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós» (1ª Jo. 1, 8). E o próprio Senhor nos ensinou a rezar: «perdoai-nos as nossas ofensas» (Lc, 11, 4), relacionando o perdão mútuo das nossas ofensas com o perdão que Deus concederá aos nossos pecados.

1426. A conversão a Cristo, o novo nascimento do Batismo, o dom do Espírito Santo, o corpo e sangue de Cristo recebidos em alimento, tornaram-nos «santos e imaculados na sua presença» (Ef. 1, 4), tal como a própria Igreja, esposa de Cristo, é «santa e imaculada na sua presença» (Ef. 5, 27). No entanto, a vida nova recebida na iniciação cristã não suprimiu a fragilidade e a fraqueza da natureza humana, nem a inclinação para o pecado, a que a tradição chama concupiscência, a qual persiste nos batizados, a fim de que prestem as suas provas no combate da vida cristã, ajudados pela graça de Cristo (Cf. Concílio de Trento, Sess. 5ª, Decretum de peccato originali, can. 5: DS 1515). Este combate é o da conversão, em vista da santidade e da vida eterna, a que o Senhor não se cansa de nos chamar (Cf. Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decretum de iustificatione, c. 16: DS 1545; II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 40: AAS 57 (1965) 44-45).

III. A conversão dos batizados

1427. Jesus chama à conversão. Tal apelo é parte essencial do anúncio do Reino: «o tempo chegou ao seu termo, o Reino de Deus está próximo: convertei-vos e acreditai na boa-nova» (Mc. 1, 15). Na pregação da Igreja, este apelo dirige-se, em primeiro lugar, àqueles que ainda não conhecem Cristo e o seu Evangelho. Por isso, o Batismo é o momento principal da primeira e fundamental conversão. É pela fé na boa-nova e pelo Batismo (Cf. At. 2, 38) que se renuncia ao mal e se adquire a salvação, isto é, a remissão de todos os pecados e o dom da vida nova.

1428. Ora, o apelo de Cristo à conversão continua a fazer-se ouvir na vida dos cristãos. Esta segunda conversão é uma tarefa ininterrupta para toda a Igreja, que «contém pecadores no seu seio» e que é, «ao mesmo tempo, santa e necessitada de purificação, prosseguindo constantemente no seu esforço de penitência e de renovação» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 8: AAS 57 (1965) 12). Este esforço de conversão não é somente obra humana. É o movimento do «coração contrito» (Cf. Sl. 51, 19) atraído e movido pela graça (Cf. Jo. 6, 44: 12, 32) para responder ao amor misericordioso de Deus, que nos amou primeiro (Cf. 1ª Jo. 4, 10).

1429. Testemunho disto mesmo, é a conversão de Pedro, depois de três vezes ter negado o seu mestre. O olhar infinitamente misericordioso de Jesus provoca-lhe lágrimas de arrependimento (Cf. Lc. 22, 61-62) e, depois da ressurreição do Senhor, a tríplice afirmação do seu amor para com Ele (Cf. Jo. 21, 15-17). A segunda conversão tem, também, uma dimensão comunitária. Isto aparece no apelo dirigido pelo Senhor a uma Igreja inteira: «arrepende-te»! (Ap. 2, 5-16).

Santo Ambrósio diz, a respeito das duas conversões que, na Igreja, «existem a água e as lágrimas: a água do Batismo e as lágrimas da Penitência»

 IV. A penitência interior

1430. Como já acontecia com os profetas, o apelo de Jesus à conversão e à penitência não visa primariamente as obras exteriores, «o saco e a cinza», (Santo Ambrósio, Epistula extra collection 1 [41], 12: CSEL 82/3, 152 (PL 16, 1116) os jejuns e as mortificações, mas a conversão do coração, a penitência interior: sem ela, as obras de penitência são estéreis e enganadoras; pelo contrário, a conversão interior impele à expressão dessa atitude cm sinais visíveis, gestos e obras de penitência (Cf. Jl. 2, 12-13: Is. 1,16-17: Mt. 6, 1-8.16-18).

1431. A penitência interior é uma reorientação radical de toda a vida, um regresso, uma conversão a Deus de todo o nosso coração, uma rotura com o pecado, uma aversão ao mal, com repugnância pelas más ações que cometemos. Ao mesmo tempo, implica o desejo e o propósito de mudar de vida, com a esperança da misericórdia divina e a confiança na ajuda da sua graça. Esta conversão do coração é acompanhada por uma dor e uma tristeza salutares, a que os Santos Padres chamaram animi cruciatus (aflição do espírito), compunctio cordis (compunção do coração) (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1676-1678; Id. Sess, 14ª, Canones de Paenitentiae, can. 5: DS1705: Cat Rom. 2, 5, 4, p. 289).

1432. O coração do homem é pesado e endurecido. É necessário que Deus dê ao homem um coração novo (Cf. Ez. 36, 26-27). A conversão é, antes de mais, obra da graça de Deus, a qual faz com que os nossos corações se voltem para Ele: «convertei-nos, Senhor, e seremos convertidos» (Lm, 5, 21). Deus é quem nos dá a coragem de começar de novo. É ao descobrir a grandeza do amor de Deus que o nosso coração é abalado pelo horror e pelo peso do pecado, e começa a ter receio de ofender a Deus pelo pecado e de estar separado d'Ele. O coração humano converte-se, ao olhar para Aquele a quem os nossos pecados trespassaram (Cf. Jo. 19, 37: Zc. 12, 10).

- «Tenhamos os olhos fixos no Sangue de Cristo e compreendamos quanto Ele é precioso para o seu Pai, pois que, derramado para nossa salvação, proporcionou ao mundo inteiro a graça do arrependimento» (São Clemente de Roma, Epistula ad Corinthios 7, 4: SC 167, 110 (Funk 1, 108)).

1433. Depois da Páscoa, é o Espírito Santo que «confunde o mundo no tocante ao pecado», isto é, faz ver ao mundo o pecado de não ter acreditado n'Aquele que o Pai enviou (Cf. Jo. 16, 8-9). Mas este mesmo Espírito, que desmascara o pecado, é o Consolador (Cf. Jo. 15, 26) que dá ao coração do homem a graça do arrependimento e da conversão (Cf. At. 2, 36-38: João Paulo II, Enc. Dominum et vivificantem, 27-48: AAS 78 (1986) 837-868).

V. As múltiplas formas da penitência na vida cristã

1434. A penitência interior do cristão pode ter expressões muito variadas. A Escritura e os Padres insistem sobretudo em três formas: o jejum, a oração e a esmola que exprimem a conversão, em relação a si mesmo, a Deus e aos outros. A par da purificação radical operada pelo Batismo ou pelo martírio, citam, como meios de obter o perdão dos pecados, (Cf. Tb. 12, 8; Mt. 6, 1-8) os esforços realizados para se reconciliar com o próximo, as lágrimas de penitência, a preocupação com a salvação do próximo (Cf. Tg. 5, 20), a intercessão dos santos e a prática da caridade «que cobre uma multidão de pecados» (1ª Pe. 4, 8).

1435. A conversão realiza-se na vida quotidiana por gestos de reconciliação, pelo cuidado dos pobres, o exercício e a defesa da justiça e do direito (Cf. Am. 5, 24; Is. 1, 17), pela confissão das próprias faltas aos irmãos, pela correção fraterna, a revisão de vida, o exame de consciência, a direção espiritual, a aceitação dos sofrimentos, a coragem de suportar a perseguição por amor da justiça. Tomar a sua cruz todos os dias e seguir Jesus é o caminho mais seguro da penitência (Cf. Lc. 9, 23).

1436. Eucaristia e Penitência. A conversão e a penitência quotidianas têm a sua fonte e alimento na Eucaristia: porque na Eucaristia torna-se presente o sacrifício de Cristo, que nos reconciliou com Deus: pela Eucaristia nutrem-se e fortificam-se os que vivem a vida de Cristo: «ela é o antídoto que nos livra das faltas quotidianas e nos preserva dos pecados mortais» (Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharitia, c. 2: DS 1638).

1437. A leitura da Sagrada Escritura, a oração da Liturgia das Horas e do Pai Nosso, todo o ato sincero de culto ou de piedade reavivam em nós o espírito de conversão e de penitência e contribuem para o perdão dos nossos pecados.

1438. Os tempos e os dias de penitência no decorrer do Ano Litúrgico (tempo da Quaresma, cada sexta-feira em memória da morte do Senhor) são momentos fortes da prática penitencial da Igreja (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 109-110: AAS 56 (1964) 127; CIC can. 1249-1253: CCEO can. 880-883). Estes tempos são particularmente apropriados para os exercícios espirituais, as liturgias penitenciais, as peregrinações em sinal de penitência, as privações voluntárias como o jejum e a esmola, a partilha fraterna (obras caritativas e missionárias).

1439 O dinamismo da conversão e da penitência foi maravilhosamente descrito por Jesus na parábola do «filho pródigo», cujo centro é «o pai misericordioso» (Cf. Lc, 15, 11-24): o deslumbramento duma liberdade ilusória e o abandono da casa paterna: a miséria extrema em que o filho se encontra depois de delapidada a fortuna: a humilhação profunda de se ver obrigado a guardar porcos e, pior ainda, de desejar alimentar-se das bolotas que os porcos comiam: a reflexão sobre os bens perdidos: o arrependimento e a decisão de se declarar culpado diante do pai: o caminho do regresso: o acolhimento generoso por parte do pai: a alegria do pai: eis alguns dos aspectos próprios do processo de conversão. O fato novo, o anel e o banquete festivo são símbolos desta vida nova, pura, digna, cheia de alegria, que é a vida do homem que volta para Deus e para o seio da família que é a Igreja. Só o coração de Cristo, que conhece a profundidade do amor do seu Pai, pôde revelar-nos o abismo da sua misericórdia, de um modo tão cheio de simplicidade e beleza.

VI. O sacramento da Penitência e da Reconciliação

1440. O pecado é, antes de mais, ofensa a Deus, ruptura da comunhão com Ele. Ao mesmo tempo, é um atentado contra a comunhão com a Igreja. É por isso que a conversão traz consigo, ao mesmo tempo, o perdão de Deus e a reconciliação com a Igreja, o que é expresso e realizado liturgicamente pelo sacramento da Penitência e Reconciliação (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15).

SÓ DEUS PERDOA O PECADO

1441. Só Deus perdoa os pecados (Cf. Mc. 2, 7). Jesus, porque é Filho de Deus, diz de Si próprio: «o Filho do Homem tem na terra o poder de perdoar os pecados» (Mc. 2, 10) e exerce este poder divino: «os teus pecados são-te perdoados»! (Mc. 2, 5) (Cf. Lc. 7, 48). Mais ainda: em virtude da sua autoridade divina, concede este poder aos homens para que o exerçam em seu nome.

1442. Cristo quis que a sua Igreja fosse, toda ela, na sua oração, na sua vida e na sua atividade, sinal e instrumento do perdão e da reconciliação que Ele nos adquiriu pelo preço do seu sangue. Entretanto, confiou o exercício do poder de absolvição ao ministério apostólico. É este que está encarregado do «ministério da reconciliação» (2ª Cor. 5, 18). O apóstolo é enviado «em nome de Cristo» e «é o próprio Deus» que, através dele, exorta e suplica: «deixai-vos reconciliar com Deus» (2ª Cor. 5, 20).

RECONCILIAÇÃO COM A IGREJA

1443. Durante a sua vida pública. Jesus não somente perdoou os pecados, como também manifestou o efeito desse perdão: reintegrou os pecadores perdoados na comunidade do povo de Deus, da qual o pecado os tinha afastado ou mesmo excluído. (Cf. Jo 20, 21-23) Sinal bem claro disso é o facto de Jesus admitir os pecadores à sua mesa, e mais ainda: de se sentar à mesa deles, gesto que exprime ao mesmo tempo, de modo desconcertante, o perdão de Deus (Cf. Lc 15), e o regresso ao seio do povo de Deus (Cf. Lc. 19, 9).

1444. Ao tornar os Apóstolos participantes do seu próprio poder de perdoar os pecados, o Senhor dá-lhes também autoridade para reconciliar os pecadores com a Igreja. Esta dimensão eclesial do seu ministério exprime-se, nomeadamente, na palavra solene de Cristo a Simão Pedro: «dar-te-ei as chaves do Reino dos céus; tudo o que ligares na terra ficará ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra ficará desligado nos céus» (Mt. 16, 19). «Este mesmo encargo de ligar e desligar, conferido a Pedro, foi também atribuído ao colégio dos Apóstolos unidos à sua cabeça» (Mt 18,18; 28, 16-20) (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 22: AAS 57 (1965) 26).

1445. As palavras ligar e desligar significam: aquele que vós excluirdes da vossa comunhão, ficará também excluído da comunhão com Deus; aquele que de novo receberdes na vossa comunhão, também Deus o acolherá na sua. A reconciliação com a Igreja é inseparável da reconciliação com Deus.

O SACRAMENTO DO PERDÃO

1446. Cristo instituiu o sacramento da Penitência para todos os membros pecadores da sua Igreja, antes de mais para aqueles que, depois do Batismo, caíram em pecado grave e assim perderam a graça batismal e feriram a comunhão eclesial. É a eles que o sacramento da Penitência oferece uma nova possibilidade de se converterem e de reencontrarem a graça da justificação. Os Padres da Igreja apresentam este sacramento como «a segunda tábua (de salvação), depois do naufrágio que é a perda da graça» (Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decretum de iustificatione, c. 14: DS 1542; cf. Tertuliano, De Paenitentia 4, 2: CCL 1, 326 (PL 1, 1343)).

1447. No decorrer dos séculos, a forma concreta segundo a qual a Igreja exerceu este poder recebido do Senhor variou muito. Durante os primeiros séculos, a reconciliação dos cristãos que tinham cometido pecados particularmente graves depois do Batismo (por exemplo: a idolatria, o homicídio ou o adultério) estava ligada a uma disciplina muito rigorosa, segundo a qual os penitentes tinham de fazer penitência pública pelos seus pecados, muitas vezes durante longos anos, antes de receberem a reconciliação. A esta «ordem dos penitentes» (que apenas dizia respeito a certos pecados graves) só raramente se era admitido e, em certas regiões, apenas uma vez na vida. Durante século VII, inspirados pela tradição monástica do Oriente, os missionários irlandeses trouxeram para a Europa continental a prática «privada» da penitência que não exigia a realização pública e prolongada de obras de penitência, antes de receber a reconciliação com a Igreja. O sacramento processa-se, a partir de então, dum modo mais secreto, entre o penitente e o sacerdote. Esta nova prática previa a possibilidade da repetição e abria assim o caminho a uma frequência regular deste sacramento. Permitia integrar, numa só celebração sacramental, o perdão dos pecados graves e dos pecados veniais. Nas suas grandes linhas, é esta forma de penitência que a Igreja tem praticado até aos nossos dias.

1448. Através das mudanças que a disciplina e a celebração deste sacramento têm conhecido no decorrer dos séculos, distingue-se a mesma estrutura fundamental. Esta inclui dois elementos igualmente essenciais: por um lado, os atos do homem que se converte sob a ação do Espírito Santo, a saber, a contrição, a confissão e a satisfação: por outro, a ação de Deus pela intervenção da Igreja. A Igreja que, por meio do Bispo e seus Presbíteros, concede, em nome de Jesus Cristo, o perdão dos pecados e fixa o modo da satisfação, também reza pelo pecador e faz penitência com ele. Assim, o pecador á curado e restabelecido na comunhão eclesial.

1449. A fórmula de absolvição, em uso na Igreja latina, exprime os elementos essenciais deste sacramento: o Pai das misericórdias é a fonte de todo o perdão. Ele realiza a reconciliação dos pecadores pela Páscoa do seu Filho e pelo dom do seu Espírito, através da oração e do ministério da Igreja:

- «Deus, Pai de misericórdia, que, pela morte e ressurreição de seu Filho, reconciliou o mundo consigo e enviou o Espírito Santo para a remissão dos pecados, te conceda, pelo ministério da Igreja, o perdão e a paz. E Eu te absolvo dos teus pecados em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo» (Cf. Ordo Paenitentiae, 46.55 (Typis Polyglottis Vaticanis 1974) p. 27.37 [Celebração da Penitência, 46.55 (Coimbra- Gráfica de Coimbra - Conferência Episcopal Portuguesa, 1997) p. 47.65]).

VII. Os atos do penitente

1450. «Poenitentia cogit peccatorem omnia libenter sufferre; in corde eius contritio, in ore confessio, in opere tota humilitas vel fructifera satisfactio - A penitência leva o pecador a tudo suportar de bom grado: no coração, a contrição; na boca, a confissão; nas obras, toda a humildade e frutuosa satisfação» (Cat Rom 2, 5, 21, p. 299: cf. Concílio de Trento, Sess.14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 3: DS 1673).

A CONTRIÇÃO

1451. Entre os atos do penitente, a contrição ocupa o primeiro lugar. Ela é «uma dor da alma e uma detestação do pecado cometido, com o propósito de não mais pecar no futuro» (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1676).

1452. Quando procedente do amor de Deus, amado sobre todas as coisas, a contrição é dita «perfeita» (contrição de caridade). Uma tal contrição perdoa as faltas veniais: obtém igualmente o perdão dos pecados mortais, se incluir o propósito firme de recorrer, logo que possível, à confissão sacramental (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1677).

1453. A contrição dita «imperfeita» (ou «atrição») é, também ela, um dom de Deus, um impulso do Espírito Santo. Nasce da consideração da fealdade do pecado ou do temor da condenação eterna e das outras penas de que o pecador está ameaçado (contrição por temor). Um tal abalo da consciência pode dar início a uma evolução interior, que será levada a bom termo sob a ação da graça, pela absolvição sacramental. No entanto, por si mesma, a contrição imperfeita não obtém o perdão dos pecados graves, mas dispõe para obtê-lo no sacramento da Penitência (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª. Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 4: DS 1678: ID., Sess. 14ª, Canones de sacramento Paenitentiae, can. 5: DS 1705).

1454. É conveniente que a recepção deste sacramento seja preparada por um exame de consciência, feito à luz da Palavra de Deus. Os textos mais adaptados para este efeito devem procurar-se no Decálogo e na catequese moral dos evangelhos e das cartas dos Apóstolos: sermão da montanha e ensinamentos apostólicos (Cf. Rm. 12-15: Cor. 12-13: Gl 5: Ef. 4-6).

A CONFISSÃO DOS PECADOS

1455. A confissão (a acusação) dos pecados, mesmo de um ponto de vista simplesmente humano, liberta-nos e facilita a nossa reconciliação com os outros. Pela confissão, o homem encara de frente os pecados de que se tornou culpado; assume a sua responsabilidade e, desse modo, abre-se de novo a Deus e à comunhão da Igreja, para tornar possível um futuro diferente.

1456. A confissão ao sacerdote constitui uma parte essencial do sacramento da Penitência: «os penitentes devem, na confissão, enumerar todos os pecados mortais de que têm consciência, após se terem seriamente examinado, mesmo que tais pecados sejam secretíssimos e tenham sido cometidos apenas contra os dois últimos preceitos do Decálogo (Cf. Ex. 20, 17; Mt. 5, 28); porque, por vezes, estes pecados ferem mais gravemente a alma e são mais perigosos que os cometidos à vista de todos» (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1680):

- «quando os fiéis se esforçam por confessar todos os pecados de que se lembram, não se pode duvidar de que os apresentam todos ao perdão da misericórdia divina. Os que procedem de modo diverso, e conscientemente ocultam alguns, esses não apresentam à bondade divina nada que ela possa perdoar por intermédio do sacerdote. Porque, "se o doente tem vergonha de descobrir a sua ferida ao médico, a medicina não pode curar o que ignora"» (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1680; São Jerónimo, Commentarius in Ecclesiasten, 10, 11: CCL 72, 338 (PL 23, 1096)).

1457. Segundo o mandamento da Igreja, «todo o fiel que tenha atingido a idade da discrição, está obrigado a confessar fielmente os pecados graves, ao menos uma vez ao ano» (CIC can. 989: cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1683 ID., Sess. 14°, Canones de sacramento Paenitentiae, can. 8: DS 1708). Aquele que tem consciência de haver cometido um pecado mortal, não deve receber a sagrada Comunhão, mesmo que tenha uma grande contrição, sem ter previamente recebido a absolvição sacramental (Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharistia, c. 7: DS 1647: Ibid., can. 11: DS 1661); a não ser que tenha um motivo grave para comungar e não lhe seja possível encontrar-se com um confessor (Cf. CIC can. 916; CCEO can. 711). As crianças devem aceder ao sacramento da Penitência antes de receberem pela primeira vez a Sagrada Comunhão (Cf. CIC can. 914).

1458. Sem ser estritamente necessária, a confissão das faltas quotidianas (pecados veniais) é, contudo, vivamente recomendada pela Igreja. (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 5: DS 1680; CIC can. 988. § 2) Com efeito, a confissão regular dos nossos pecados veniais ajuda-nos a formar a nossa consciência, a lutar contra as más inclinações, a deixarmo-nos curar por Cristo, a progredir na vida do Espírito. Recebendo com maior frequência, neste sacramento, o dom da misericórdia do Pai, somos levados a ser misericordiosos como Ele (Cf. Lc. 6, 36):

- «aquele que confessa os seus pecados e os acusa, já está de acordo com Deus. Deus acusa os teus pecados; se tu também os acusas, juntas-te a Deus. O homem e o pecador são, por assim dizer, duas realidades distintas. Quando ouves falar do homem, foi Deus que o criou: quando ouves falar do pecador, foi o próprio homem quem o fez. Destrói o que fizeste, para que Deus salve o que fez. [...] Quando começas a detestar o que fizeste, é então que começam as tuas boas obras, porque acusas as tuas obras más. O princípio das obras boas é a confissão das más. Praticaste a verdade e vens à luz» (Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus, 12, 13: CCL 36, 128 (PL 35, 1491)).

A SATISFAÇÃO

1459. Muitos pecados prejudicam o próximo. Há que fazer o possível por reparar esse dano (por exemplo: restituir as coisas roubadas, restabelecer a boa reputação daquele que foi caluniado, indemnizar por ferimentos). A simples justiça o exige. Mas, além disso, o pecado fere e enfraquece o próprio pecador, assim como as suas relações com Deus e com o próximo. A absolvição tira o pecado, mas não remedeia todas as desordens causadas pelo pecado (Cf. Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, can. 12: DS 1712). Aliviado do pecado, o pecador deve ainda recuperar a perfeita saúde espiritual. Ele deve, pois, fazer mais alguma coisa para reparar os seus pecados: «satisfazer» de modo apropriado ou «expiar» os seus pecados. A esta satisfação também se chama «penitência».

1460. A penitência que o confessor impõe deve ter em conta a situação pessoal do penitente e procurar o seu bem espiritual. Deve corresponder, quanto possível, à gravidade e natureza dos pecados cometidos. Pode consistir na oração, num donativo, nas obras de misericórdia, no serviço do próximo, em privações voluntárias, sacrifícios e, sobretudo, na aceitação paciente da cruz que temos de levar. Tais penitências ajudam-nos a configurar-nos com Cristo, que, por Si só, expiou os nossos pecados (Cf. Rm. 3, 25: 1 Jo. 2, 1-2) uma vez por todas. Tais penitências fazem que nos tornemos co-herdeiros de Cristo Ressuscitado, «uma vez que também sofremos com Ele» (Rm. 8, 17) (Cf. Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 8: DS 1690):

- «mas esta satisfação, que realizamos pelos nossos pecados, não é possível senão por Jesus Cristo: nós que, por nós próprios, nada podemos, com a ajuda "d'Aquele que nos conforta, podemos tudo" (Cf. Fl. 4, 13). Assim, o homem não tem nada de que se gloriar. Toda a nossa “glória” está em Cristo [...] em quem nós satisfazemos, “produzindo dignos frutos de penitência" (Cf. Lc. 3, 8), os quais vão haurir n'Ele toda a sua força, por Ele são oferecidos ao Pai, e graças a Ele são aceites pelo Pai» (Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 8: DS 1691).

VIII. O ministro deste sacramento

1461. Uma vez que Cristo confiou aos Apóstolos o ministério da reconciliação (Cf. Jo. 20, 23: 2ª Cor. 5, 18) os Bispos, seus sucessores, e os Presbíteros, colaboradores dos Bispos, continuam a exercer tal ministério. Com efeito, os Bispos e os Presbíteros é que têm, em virtude do sacramento da Ordem, o poder de perdoar todos os pecados, «em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo».

1462. O perdão dos pecados reconcilia com Deus, mas também com a Igreja. O Bispo, chefe visível da Igreja particular, é justamente considerado, desde os tempos antigos, como o principal detentor do poder e ministério da reconciliação: é o moderador da disciplina penitencial (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 26: AAS 57 (1965) 32). Os Presbíteros, seus colaboradores, exercem-no na medida em que receberam o respectivo encargo, quer do seu Bispo (ou dum superior religioso), quer do Papa, através do direito da Igreja (Cf. CIC can. 844. 967-969: CCEO can. 722. §§ 3-4).

1463. Certos pecados particularmente graves são punidos pela excomunhão, a pena eclesiástica mais severa, que impede a recepção dos sacramentos e o exercício de certos atos eclesiásticos (Cf. CIC can. 1331: CCEO can. 1431.1434) e cuja absolvição, por conseguinte, só pode ser dada, segundo o direito da Igreja, pelo Papa, pelo Bispo do lugar ou por Sacerdotes por eles autorizados (Cf. CIC can. 1354-1357: CCEO can. 1420). Em caso de perigo de morte, qualquer Sacerdote, mesmo que careça da faculdade de ouvir confissões, pode absolver de qualquer pecado e de toda a excomunhão (Cf. CIC can. 976: em relação à absolvição dos pecados, CCEO can. 725).

1464. Os sacerdotes devem exortar os fiéis a aproximarem-se do sacramento da Penitência; e devem mostrar-se disponíveis para a celebração deste sacramento, sempre que os cristãos o peçam de modo razoável (Cf. CIC can. 986: CCEO can. 735: II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 13: AAS 58 (1966) 1012).

1465. Ao celebrar o sacramento da Penitência, o sacerdote exerce o ministério do bom Pastor que procura a ovelha perdida: do bom Samaritano que cura as feridas; do Pai que espera pelo filho pródigo e o acolhe no seu regresso; do justo juiz que não faz acepção de pessoas e cujo juízo é, ao mesmo tempo, justo e misericordioso. Em resumo, o sacerdote é sinal e instrumento do amor misericordioso de Deus para com o pecador.

1466. O confessor não é dono, mas servidor do perdão de Deus. O ministro deste sacramento deve unir-se à intenção e à caridade de Cristo (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 13: AAS 58 (1966) 1012). Deve ter um conhecimento comprovado do comportamento cristão, experiência das coisas humanas, respeito e delicadeza para com aquele que caiu; deve amar a verdade, ser fiel ao Magistério da Igreja, e conduzir o penitente com paciência para a cura e a maturidade plena. Deve rezar e fazer penitência por ele, confiando-o à misericórdia do Senhor.

1467. Dada a delicadeza e a grandeza deste ministério e o respeito devido às pessoas, a igreja declara que todo o sacerdote que ouve confissões está obrigado a guardar segredo absoluto sobre os pecados que os seus penitentes lhe confessaram, sob penas severíssimas (Cf. CIC can. 983-984. 1388. § 1: CCEC can. 1456). Tão pouco pode servir-se dos conhecimentos que a confissão lhe proporciona sobre a vida dos penitentes. Este segredo, que não admite excepções, é chamado «sigilo sacramental», porque aquilo que o penitente manifestou ao Sacerdote fica «selado» pelo sacramento.

IX. Os efeitos deste sacramento

1468. «Toda a eficácia da Penitência consiste em nos restituir à graça de Deus e em unir-nos a Ele numa amizade perfeita» (Poenitentiae itaque omnis in eo vis est, ut nos in Dei gratiam restituat, cum Eoque summa amicitia coniungat»: Cat Rom 2, 5, 18, p. 297). O fim e o efeito deste sacramento são, pois, a reconciliação com Deus. Naqueles que recebem o sacramento da Penitência com coração contrito e disposição religiosa, seguem-se lhe «a paz e a tranquilidade da consciência, acompanhadas duma grande consolação espiritual» (Concílio de Trento, 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 3: DS 1674). Com efeito, o sacramento da reconciliação com Deus leva a uma verdadeira «ressurreição espiritual», à restituição da dignidade e dos bens próprios da vida dos filhos de Deus, o mais precioso dos quais é a amizade do mesmo Deus (Cf. Lc 15, 32).

1469. Este sacramento reconcilia-nos com a Igreja. O pecado abala ou rompe a comunhão fraterna. O sacramento da Penitência repara-a ou restaura-a. Nesse sentido, não se limita apenas a curar aquele que é restabelecido na comunhão eclesial, mas também exerce um efeito vivificante sobre a vida da Igreja que sofreu com o pecado de um dos seus membros (Cf. 1ª Cor. 12, 26). Restabelecido ou confirmado na comunhão dos santos, o pecador é fortalecido pela permuta de bens espirituais entre todos os membros vivos do corpo de Cristo, quer vivam ainda em estado de peregrinos, quer já tenham atingido a pátria celeste (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48-50: AAS 57 (1965) 53-57):

- «é de lembrar que a reconciliação com Deus tem como consequência, por assim dizer, outras reconciliações, que trarão remédio a outras rupturas produzidas pelo pecado: o penitente perdoado reconcilia-se consigo mesmo no mais profundo do seu ser, onde recupera a própria verdade interior: reconcilia-se com os irmãos, que de algum modo ofendeu e magoou: reconcilia-se com a Igreja; reconcilia-se com toda a criação» (João Paulo II, Ex. ap. Reconciliatio et paenitentia 31, § V: AAS 77 (1985) 265).

1470. Neste sacramento, o pecador, remetendo-se ao juízo misericordioso de Deus, de certo modo antecipa o julgamento a que será submetido no fim desta vida terrena. É aqui e agora, nesta vida, que nos é oferecida a opção entre a vida e a morte. Só pelo caminho da conversão é que podemos entrar no Reino de onde o pecado grave nos exclui? (Cf. 1ª Cor. 5, 11: Gl. 5, 19-21; Ap. 22, 15). Convertendo-se a Cristo pela penitência e pela fé, o pecador passa da morte à vida «e não é sujeito a julgamento» (Jo. 5, 24).

X. As indulgências

1471. A doutrina e a prática das indulgências na Igreja estão estreitamente ligadas aos efeitos do sacramento da Penitência.

O QUE É A INDULGÊNCIA?

«A indulgência é a remissão, perante Deus, da pena temporal devida aos pecados cuja culpa já foi apagada; remissão que o fiel devidamente disposto obtém em certas e determinadas condições, pela ação da Igreja, a qual, enquanto dispensadora da redenção, distribui e aplica por sua autoridade o tesouro das satisfações de Cristo e dos santos» (Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, Normae. I: AAS 59 (1967) 21). «A indulgência é parcial ou plenária, consoante liberta parcialmente ou na totalidade da pena temporal devida ao pecado» (Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, Normae. 2: AAS 59 (1967) 21). «O fiel pode lucrar para si mesmo as indulgências [...], ou aplicá-las aos defuntos» (CIC can. 994).

AS PENAS DO PECADO

1472. Para compreender esta doutrina e esta prática da Igreja, deve ter-se presente que o pecado tem uma dupla consequência. O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e, portanto, torna-nos incapazes da vida eterna, cuja privação se chama «pena eterna» do pecado. Por outro lado, todo o pecado, mesmo venial, traz consigo um apego desordenado às criaturas, o qual precisa de ser purificado, quer nesta vida quer depois da morte, no estado que se chama Purgatório. Esta purificação liberta do que se chama «pena temporal» do pecado. Estas duas penas não devem ser consideradas como uma espécie de vingança, infligida por Deus, do exterior, mas como algo decorrente da própria natureza do pecado. Uma conversão procedente duma caridade fervorosa pode chegar à total purificação do pecador, de modo que nenhuma pena subsista (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Canones de sacramento Paenitentiae. can. 12-13: DS 1712-1713; Id., Sess. 25ª, Decretum de purgatorio: DS 1820).

1473. O perdão do pecado e o restabelecimento da comunhão com Deus trazem consigo a abolição das penas eternas do pecado. Mas subsistem as penas temporais. O cristão deve esforçar-se por aceitar, como uma graça, estas penas temporais do pecado, suportando pacientemente os sofrimentos e as provações de toda a espécie e, chegada a hora, enfrentando serenamente a morte: deve aplicar-se, através de obras de misericórdia e de caridade, bem como pela oração e pelas diferentes práticas da penitência, a despojar-se completamente do «homem velho» e a revestir-se do «homem novo» (Cf. Ef,  4, 24).

NA COMUNHÃO DOS SANTOS

1474. O cristão que procura purificar-se do seu pecado e santificar-se com a ajuda da graça de Deus, não se encontra só. «A vida de cada um dos filhos de Deus está ligada de modo admirável, em Cristo e por Cristo, à vida de todos os outros irmãos cristãos, na unidade sobrenatural do corpo Místico de Cristo, como que numa pessoa mística» (Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5: AAS 59 (1967) 11).

1475. Na comunhão dos santos, «existe, portanto, entre os fiéis - os que já estão na pátria celeste, os que foram admitidos à expiação do Purgatório, e os que vivem ainda peregrinos na terra - um constante laço de amor e uma abundante permuta de todos os bens» (Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5: AAS 59 (1967) 12). Nesta admirável permuta, a santidade de um aproveita aos demais, muito para além do dano que o pecado de um tenha podido causar aos outros. Assim, o recurso à comunhão dos santos permite ao pecador contrito ser purificado mais depressa e mais eficazmente das penas do pecado.

1476. A estes bens espirituais da comunhão dos santos, também lhes chamamos o tesouro da Igreja, «que não é um somatório de bens, como quando se trata das riquezas materiais acumuladas no decurso dos séculos, mas sim o preço infinito e inesgotável que têm junto de Deus as expiações e méritos de Cristo, nosso Senhor, oferecidos para que a humanidade seja liberta do pecado e chegue à comunhão com o Pai. É em Cristo, nosso Redentor, que se encontram em abundância as satisfações e os méritos da sua redenção» (Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5: AAS 59 (1967) 11).

1477. «Pertencem igualmente a este tesouro o preço verdadeiramente imenso, incomensurável e sempre novo que têm junto de Deus as orações e boas obras da bem‑aventurada Virgem Maria e de todos os santos, que se santificaram pela graça de Cristo, seguindo as suas pegadas, e que realizaram uma obra agradável ao Pai; de modo que, trabalhando pela sua própria salvação, igualmente cooperaram na salvação dos seus irmãos na unidade do corpo Místico» (Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 5: AAS 59 (1967) 11-12).

OBTER A INDULGÊNCIA DE DEUS MEDIANTE A IGREJA

1478. «A indulgência obtém-se mediante a Igreja que, em virtude do poder de ligar e desligar que lhe foi concedido por Jesus Cristo, intervém a favor dum cristão e lhe abre o tesouro dos méritos de Cristo e dos santos, para obter do Pai das misericórdias o perdão das penas temporais devidas pelos seus pecados. É assim que a Igreja não quer somente vir em ajuda deste cristão, mas também incitá-lo a obras de piedade, penitência e caridade» (Cf. Paulo VI, Const. ap. Indulgentiarum doctrina, 8: AAS 59 (1967) 16-17; Concílio de Trento, Sess. 25ª, Decretum de Indulgentiis: DS 1835).

1479. Uma vez que os fiéis defuntos, em vias de purificação, também são membros da mesma comunhão dos santos, nós podemos ajudá-los, entre outros modos, obtendo para eles indulgências, de modo que sejam libertos das penas temporais devidas pelos seus pecados.

XI. A celebração do sacramento da Penitência

1480. Tal como todos os sacramentos, a Penitência é uma ação litúrgica. Ordinariamente, os elementos da sua celebração são os seguintes: saudação e bênção do sacerdote, leitura da Palavra de Deus para iluminar a consciência e suscitar a contrição e exortação ao arrependimento: a confissão que reconhece os pecados e os manifesta ao sacerdote; a imposição e aceitação da penitência; a absolvição do sacerdote; o louvor de ação de graças e a despedida com a bênção do sacerdote.

1481. A liturgia bizantina tem várias fórmulas de absolvição, em forma deprecativa, que exprimem admiravelmente o mistério do perdão: «Deus, que pelo profeta Natan perdoou a David, quando ele confessou os seus próprios pecados, a Pedro depois de ele ter chorado amargamente, à pecadora depois de ela ter derramado lágrimas a seus pés, ao publicano e ao pródigo, este mesmo Deus vos perdoe, por intermédio de mim pecador, nesta vida e na outra, e vos faça comparecer, sem vos condenar no seu temível tribunal: Ele que é bendito pelos séculos dos séculos. Amém» (Euchológion tò méga (Atenas 1992) p. 222).

1482. O sacramento da Penitência pode também ter lugar no âmbito duma celebração comunitária, na qual se faz uma preparação conjunta para a confissão e conjuntamente se dão graças pelo perdão recebido. Neste caso, a confissão pessoal dos pecados e a absolvição individual são inseridas numa liturgia da Palavra de Deus, com leituras e homilia, exame de consciência feito em comum, pedido comunitário de perdão, oração do Pai Nosso e ação de graças em comum. Esta celebração comunitária exprime mais claramente o carácter eclesial da penitência. No entanto, seja qual for a forma da sua celebração, o sacramento da Penitência é sempre, por sua própria natureza, uma ação litúrgica, portanto eclesial e pública (Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium, 26-27 AAS 56 (1964) 107).

1483. Em casos de grave necessidade, pode-se recorrer à celebração comunitária da reconciliação, com confissão geral e absolvição geral. Tal necessidade grave pode ocorrer quando há perigo iminente de morte, sem que o Sacerdote ou os Sacerdotes tenham tempo suficiente para ouvir a confissão de cada penitente. A necessidade grave pode existir também quando, tendo em conta o número dos penitentes, não há confessores bastantes para ouvir devidamente as confissões individuais num tempo razoável, de modo que os penitentes, sem culpa sua, se vejam privados, durante muito tempo, da graça sacramental ou da sagrada Comunhão. Neste caso, para a validade da absolvição, os fiéis devem ter o propósito de confessar individualmente os seus pecados graves em tempo oportuno (Cf. CIC can. 962. § 1). Pertence ao Bispo diocesano julgar se as condições requeridas para a absolvição geral existem (Cf. CIC can. 962. § 2). Uma grande afluência de fiéis, por ocasião de grandes festas ou de peregrinações, não constitui um desses casos de grave necessidade (Cf. CIC can. 962. § 1, 2).

1484. «A confissão individual e íntegra e a absolvição constituem o único modo ordinário pelo qual o fiel, consciente de pecado grave, se reconcilia com Deus e com a Igreja: somente a impossibilidade física ou moral o escusa desta forma de confissão» (Ordo Paenitentiae, Praenotanda 31 (Typis Polyglottis Vaticanis1974) p. 21 [Celebração da Penitência, 31 (Coimbra, Gráfica de Coimbra - Conferência Episcopal Portuguesa.1997) p. 29]). Há razões profundas para que assim seja. Cristo age em cada um dos sacramentos. Ele dirige-se pessoalmente a cada um dos pecadores: «meu filho, os teus pecados são-te perdoados» (Mc. 2, 5); Ele é o médico que se inclina sobre cada um dos doentes com necessidade d'Ele (Cf. Mc. 2, 17) «para os curar: alivia-os e reintegra-os na comunhão fraterna. A confissão pessoal é, pois, a forma mais significativa da reconciliação com Deus e com a Igreja».

Resumindo:

1485. «Na tarde da Páscoa, o Senhor Jesus apareceu aos seus Apóstolos e disse-lhes: "recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos"» (Jo. 20, 22-23).

1486. 0 perdão dos pecados cometidos depois do Batismo é concedido por meio dum sacramento próprio, chamado sacramento da Conversão, da Confissão, da Penitência ou da Reconciliação.

1487. Quem peca, ofende a honra de Deus e o seu amor, a sua própria dignidade de homem chamado a ser filho de Deus, e o bem-estar espiritual da Igreja, da qual cada fiel deve ser pedra viva.

1488. Aos olhos da fé, não existe mal mais grave do que o pecado; nada tem piores consequências para os próprios pecadores, para a Igreja e para todo o mundo.

1489. Voltar à comunhão com Deus, depois de a ter perdido pelo pecado, é um movimento nascido da graça do mesmo Deus misericordioso e cheio de interesse pela salvação dos homens. Deve pedir-se esta graça preciosa, tanto para si mesmo como para os outros.

1490. O movimento de regresso a Deus, pela conversão e arrependimento, implica dor e aversão em relação aos pecados cometidos, e o propósito firme de não tornar a pecar no futuro. Portanto, a conversão refere-se ao passado e ao futuro: alimenta-se da confiança na misericórdia divina.

1491. O sacramento da Penitência é constituído pelo conjunto de três atos realizados pelo penitente e pela absolvição do Sacerdote. Os atos do penitente são: o arrependimento, a confissão ou manifestação dos pecados ao Sacerdote e o propósito de cumprir a reparação e as obras de reparação.

1492. O arrependimento (também chamado contrição) deve inspirar-se em motivações que brotam da fé. Se for motivado pelo amor de caridade para com Deus, diz-se «perfeito»; se fundado em outros motivos, diz-se «imperfeito».

1493. Aquele que quer obter a reconciliação com Deus e com a Igreja, deve confessar ao Sacerdote todos os pecados graves que ainda não tiver confessado e de que se lembre depois de ter examinado cuidadosamente a sua consciência. A confissão das faltas veniais, sem ser em si necessária, é, todavia, vivamente recomendada pela Igreja.

1494. O confessor propõe ao penitente o cumprimento de certos atos de «satisfação» ou «penitência», com o fim de reparar o mal causado pelo pecado e restabelecer os hábitos próprios dum discípulo de Cristo.

1495. Só os Sacerdotes que receberam da autoridade da Igreja a faculdade de absolver; podem perdoar os pecados em nome de Cristo.

1496. Os efeitos espirituais do sacramento da Penitência são:

- a reconciliação com Deus, pela qual o penitente recupera a graça;
a reconciliação com a Igreja;
a remissão da pena eterna, em que incorreu pelos pecados mortais;
a remissão, ao menos em parte, das penas temporais, consequência do pecado;
a paz e a serenidade da consciência e a consolação espiritual;
-  o acréscimo das forças espirituais para o combate cristão.

1497. A confissão individual e integral dos pecados graves, seguida da absolvição, continua a ser o único meio ordinário para a reconciliação com Deus e com a Igreja.

1495. Por meio das indulgências, os fiéis podem obter para si próprios, e também para as almas do Purgatório, a remissão das penas temporais, consequência do pecado.

ARTIGO 5  -

A UNÇÃO DOS ENFERMOS

1499. «Pela santa Unção dos Enfermos e pela oração dos presbíteros, toda a Igreja encomenda os doentes ao Senhor, sofredor e glorificado, para que os alivie e os salve: mais ainda, exorta-os a que, associando-se livremente à paixão e morte de Cristo, concorram para o bem do povo de Deus» (Cf. Mc. 2, 17).

I. Os seus fundamentos na economia da salvação

A DOENÇA NA VIDA HUMANA

1500. A doença e o sofrimento estiveram sempre entre os problemas mais graves que afligem a vida humana. Na doença, o homem experimenta a sua incapacidade, os seus limites, a sua finitude. Qualquer enfermidade pode fazer-nos entrever a morte. (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15)

1501. A doença pode levar à angústia, ao fechar-se em si mesmo e até, por vezes, ao desespero e à revolta contra Deus. Mas também pode tornar uma pessoa mais amadurecida, ajudá-la a discernir, na sua vida, o que não é essencial para se voltar para o que o é. Muitas vezes, a doença leva à busca de Deus, a um regresso a Ele.

O DOENTE PERANTE DEUS

1502. O homem do Antigo Testamento vive a doença à face de Deus. É diante de Deus que desafoga o seu lamento pela doença que lhe sobreveio (Cf. Sl. 38) e é d'Ele. Senhor da vida e da morte, que implora a cura (Cf. Sl. 6, 3: Is. 38). A doença torna-se caminho de conversão (Cf. Sl. 38, 5: 39, 9.12) e o perdão de Deus dá início à cura (Cf. Sl 32, 5: 107. 20; Mc 2, 5-12). Israel faz a experiência de que a doença está, de modo misterioso, ligada ao pecado e ao mal, e de que a fidelidade a Deus em conformidade com a sua Lei restitui a vida: «porque Eu, o Senhor, é que sou o teu médico» (Ex. 15, 26). O profeta entrevê que o sofrimento pode ter também um sentido redentor pelos pecados dos outros (Cf. Is. 53, 11). Finalmente, Isaías anuncia que Deus fará vir para Sião um tempo em que perdoará todas as faltas e curará todas as doenças (Cf. Is. 33, 24).

CRISTO-MÉDICO

1503. A compaixão de Cristo para com os doentes e as suas numerosas curas de enfermos de toda a espécie (Cf. Mt. 4, 24) são um sinal claro de que «Deus visitou o seu povo» (Cf. Lc. 7, 16) e de que o Reino de Deus está próximo. Jesus tem poder não somente para curar, mas também para perdoar os pecados (Cf. Mc. 2, 5-12): veio curar o homem na sua totalidade, alma e corpo: é o médico de que os doentes precisam (Cf. Mc. 2, 17). A sua compaixão para com todos os que sofrem vai ao ponto de identificar-Se com eles: «estive doente e visitastes-Me» (Mt. 25, 36). O seu amor de predileção para com os enfermos não cessou, ao longo dos séculos, de despertar a atenção particular dos cristãos para aqueles que sofrem no corpo ou na alma. Ele está na origem de incansáveis esforços para os aliviar.

1504. Frequentemente, Jesus pede aos doentes que acreditem (Cf. Mc. 5, 34.36: 9. 23). Serve-se de sinais para curar: saliva e imposição das mãos (Cf. Mc. 7. 32-36; 8, 22-25), lodo e lavagem (Cf. Jo. 9, 6-15). Por seu lado, os doentes procuram tocar-Lhe (Cf. Mc. 3, 10: 6. 56), «porque saía d'Ele uma força que a todos curava» (Lc. 6, 19). Por isso, nos sacramentos, Cristo continua a «tocar-nos» para nos curar.

1505. Comovido por tanto sofrimento, Cristo não só se deixa tocar pelos doentes, como também faz suas as misérias deles: «tomou sobre Si as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças» (Mt. 8, 17) (Cf. Is. 53, 4). Ele não curou todos os doentes. As curas que fazia eram sinais da vinda do Reino de Deus. Anunciavam uma cura mais radical: a vitória sobre o pecado e sobre a morte, mediante a sua Páscoa. Na cruz, Cristo tomou sobre Si todo o peso do mal (Cf. Is. 53, 4-6) e tirou «o pecado do mundo» (Jo. 1, 29), do qual a doença não é mais que uma consequência. Pela sua paixão e morte na cruz. Cristo deu novo sentido ao sofrimento: desde então este pode configurar-nos com Ele e unir-nos à sua paixão redentora.

«CURAI OS ENFERMOS...»

1506. Cristo convida os discípulos a seguirem-no, tomando a sua cruz (Cf. Mt. 10, 38). Seguindo-O, eles adquirem uma nova visão da doença e dos doentes. Jesus associa-os à sua vida pobre e servidora. Fá-los participar no seu ministério de compaixão e de cura: E eles «partiram e pregaram que era preciso cada um arrepender-se. Expulsavam muitos demónios, ungiam com óleo numerosos doentes, e curavam-nos» (Mc. 6, 12-13).

1507. O Senhor ressuscitado renova esta missão («em Meu nome... hão de impor as mãos aos doentes, e estes ficarão curados»: Mc. 16, 1 7-18) e confirma-a por meio dos sinais que a Igreja realiza invocando o seu nome
(Cf. At. 9, 34: 14, 3). Estes sinais manifestam de modo especial, que Jesus é verdadeiramente «Deus que salva» (Cf. Mt. 1, 21: At.  4, 12).

1508. O Espírito Santo confere a alguns o carisma especial de poderem curar (Cf. 1ª Cor. 12, 9. 28. 30) para manifestar a força da graça do Ressuscitado. Todavia, nem as orações mais fervorosas obtêm sempre a cura de todas as doenças. Assim, São Paulo deve aprender do Senhor que «a minha graça te basta: pois na fraqueza é que a minha força atua plenamente» (2ª Cor. 12, 9), e que os sofrimentos a suportar podem ter como sentido que «eu complete na minha carne o que falta à paixão de Cristo, em benefício do seu corpo, que é a Igreja» (Cl. 1, 24).

1509. «Curai os enfermos»! (Mt. 10, 8). A Igreja recebeu este encargo do Senhor e procura cumpri-lo, tanto pelos cuidados que dispensa aos doentes, como pela oração de intercessão com que os acompanha. Ela "crê na presença vivificante de Cristo, médico das almas e dos corpos, presença que age particularmente através dos sacramentos e de modo muito especial da Eucaristia, pão que dá a vida eterna” (Cf. Jo. 6, 54.58) e cuja ligação com a saúde corporal é insinuada por São Paulo (Cf. 1ª Cor. 11, 30).

1510. Entretanto, a Igreja dos Apóstolos conhece um rito próprio em favor dos enfermos, atestado por São Tiago: «alguém de vós está doente? Chame os Presbíteros da Igreja para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o Senhor o aliviará; e, se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados» (Ts. 5, 14-15). A Tradição reconheceu neste rito um dos sete sacramentos da Igreja (Cf. Santo Inocêncio, Epistula Si instituta ecclesiastica: DS 216; Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1324-1325: Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento extremae Unctionis, c. 1-2: DS 1695-1696; Id., Sess. 14ª, canones de extrema Unctione, can. 1-2: DS 1716-1717).

UM SACRAMENTO DOS ENFERMOS

1511. A Igreja crê e confessa que, entre os sete sacramentos, há um, especialmente destinado a reconfortar os que se encontram sob a provação da doença: a Unção dos enfermos:

«Esta santa unção dos enfermos foi instituída por Cristo nosso Senhor como sacramento do Novo Testamento, verdadeira e propriamente dito, insinuado por São Marco (Cf. Mc. 6, 13), mas recomendado aos fiéis e promulgado por São Tiago, apóstolo e irmão do Senhor» (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento extremae Unctionis, c. 1: DS 1695; Cf. Tg 5, 14-15).

1512. Na tradição litúrgica, tanto no Oriente como no Ocidente, temos, desde os tempos antigos, testemunhos de unções de doentes praticadas com óleo benzido. No decorrer dos séculos, a Unção dos enfermos começou a ser conferida cada vez mais exclusivamente aos que estavam prestes a morrer. Por causa disso, fora-lhe dado o nome de «Extrema-Unção». (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento extremae Unctionis, Sess. 14ª, c. 2: DS 1696) Porém, apesar dessa evolução, a liturgia nunca deixou de pedir ao Senhor pelo doente, para que recuperasse a saúde, se tal fosse conveniente para a sua salvação

1513. A Constituição Apostólica «Sacram Unctionem Infirmorum», de 30 de novembro de 1972, na sequência do II Concílio do Vaticano (Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium, 73: AAS 56 (1964) 118-119), estabeleceu que, a partir de então, se observasse o seguinte no rito romano:

- «o sacramento da Unção dos Enfermos é conferido aos que se encontram enfermos com a vida em perigo, ungindo-os na fronte e nas mãos com óleo de oliveira ou, segundo as circunstância, com outro óleo de origem vegetal, devidamente benzido, proferindo uma só vez, as palavras: "por esta santa unção e pela sua infinita misericórdia o Senhor venha em teu auxílio com a graça do Espírito Santo, para que, liberto dos teus pecados, Ele te salve e, na sua bondade, alivie os teus sofrimentos"» (Paulo VI. Const. ap. Sacram Unctionem infirmorum: AAS 65 (1973) 8. Cf. CIC 847, § 1).

II. Quem recebe e quem administra este sacramento?

EM CASO DE GRAVE ENFERMIDADE...

1514. A Unção dos Enfermos «não é sacramento só dos que estão prestes a morrer. Por isso, o tempo oportuno para a receber é certamente quando o fiel começa, por doença ou por velhice, a estar em perigo de morte» (II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium, 73: AAS 56 (1964) 118-119: cf. CIC can. 1004. § I. 1005.1007: CCEO can. 738).

1515. Se um doente que recebeu a Unção recupera a saúde, pode, em caso de nova enfermidade grave, receber outra vez este sacramento. No decurso da mesma doença, este sacramento pode ser repetido se o mal se agrava. É conveniente receber a Unção dos Enfermos antes duma operação cirúrgica importante. E o mesmo se diga a respeito das pessoas de idade, cuja fragilidade se acentua.

«... CHAME OS PRESBÍTEROS DA IGREJA»

1516. Só os Sacerdotes (Bispos e Presbíteros) são ministros da Unção dos Enfermos (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª. Doctrina de sacramento extremae Unctionis, c. 3: DS 1697: Id., Sess. 14ª, Canones de extrema Unctione, can. 4: DS 1719). É dever dos pastores instruir os fiéis acerca dos benefícios deste sacramento. Que os fiéis animem os enfermos chamarem o Sacerdote para receberem este sacramento. E que os doentes se preparem para o receber com boas disposições, com a ajuda do seu pastor e de toda a comunidade eclesial, convidada a rodear, de um modo muito especial, os doentes, com as suas orações e atenções fraternas.

III. Como se celebra este sacramento?

1517. Como todos os sacramentos, a Unção dos Enfermos é uma celebração litúrgica e comunitária (II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum concilium, 27: AAS 56 (1964) 107) quer tenha lugar no seio da família, quer no hospital ou na igreja, para um só doente ou para um grupo deles. É muito conveniente que seja celebrada durante a Eucaristia, memorial da Páscoa do Senhor. Se as circunstâncias a tal convidarem, a celebração do sacramento pode ser precedida pelo sacramento da Penitência e seguida pelo da Eucaristia. Enquanto sacramento da Páscoa de Cristo, a Eucaristia deveria ser sempre o último sacramento da peregrinação terrestre, o «viático» da «passagem» para a vida eterna.

1518. Palavra e sacramento formam um todo inseparável. A liturgia da Palavra, precedida dum ato penitenciai, abre a celebração. As palavras de Cristo e o testemunho dos Apóstolos despertam a fé do doente e da comunidade, para pedir ao Senhor a força do seu Espírito.

1519. A celebração do sacramento compreende principalmente os seguin­tes elementos: «os Presbíteros da Igreja» (Cf. Tg. 5, 14) impõem em silêncio - as mãos sobre os enfermos; rezam por eles na fé da Igreja (Cf. Tg. 5, 15); é a epiclese própria deste sacramento; então, conferem a unção com óleo, benzido, se possível, pelo Bispo.

Estes atos litúrgicos indicam a graça que este sacramento confere aos doentes.

IV. Os efeitos da celebração deste sacramento

1520. Um dom particular do Espírito Santo. A primeira graça deste sacramento é uma graça de reconforto, de paz e de coragem para vencer as dificuldades próprias do estado de doença grave ou da fragilidade da velhice. Esta graça é um dom do Espírito Santo, que renova a confiança e a fé em Deus, e dá força contra as tentações do Maligno, especialmente a tentação do desânimo e da angústia da morte
(Cf. Heb. 2, 15). Esta assistência do Senhor pela força do seu Espírito visa levar o doente à cura da alma, mas também à do corpo, se tal for a vontade de Deus (Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1325). Além disso, «se ele cometeu pecados, ser-lhe-ão perdoados» (Tg. 5, 15) (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, canones de extrema Unctione, can. 2: DS 1717).

1521. A união à paixão de Cristo. Pela graça deste sacramento, o enfermo recebe a força e o dom de se unir mais intimamente à paixão de Cristo: ele é, de certo modo, consagrado para produzir frutos pela configuração com a paixão redentora do Salvador. O sofrimento, sequela do pecado original, recebe um sentido novo: transforma-se em participação na obra salvífica de Jesus.

1522. Uma graça eclesial. Os doentes que recebem este sacramento, «associando-se livremente à paixão e morte de Cristo, concorrem para o bem do povo de Deus» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15). Ao celebrar este sacramento, a Igreja, na comunhão dos santos, intercede pelo bem do doente. E o doente, por seu lado, pela graça deste sacramento, contribui para a santificação da Igreja e para o bem de todos os homens, pelos quais a Igreja sofre e se oferece, por Cristo, a Deus Pai.

1523. Uma preparação para a última passagem. Se o sacramento da Unção dos Enfermos é concedido a todos os que sofrem de doenças e enfermidades graves, com mais forte razão o é aos que estão prestes a deixar esta vida («in exitu vitae constituti) (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento extremae Unctionis, c. 3: DS 1698): de modo que também foi chamado «sacramentum exeuntium – sacramento dos que partem» (Ibid). A Unção dos Enfermos completa a nossa conformação com a morte e ressurreição de Cristo, tal como o Batismo a tinha começado. Leva à perfeição as unções santas que marcam toda a vida cristã: a do Batismo selara em nós a vida nova: a da Confirmação robustecera-nos para o combate desta vida; esta última unção mune o fim da nossa vida terrena como que de um sólido escudo em vista das últimas batalhas, antes da entrada na Casa do Pai (Cf. Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento extremae Unctionis, Prooemium: DS 1694).

V. O Viático, último sacramento do cristão

1524. Àqueles que vão deixar esta vida, a Igreja oferece-lhes, além da Unção dos Enfermos, a Eucaristia como viático. Recebida neste momento de passagem para o Pai, a comunhão do corpo, e sangue de Cristo tem um significado e uma importância particulares. É semente de vida eterna e força de ressurreição, segundo as palavras do Senhor: «quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna: e Eu ressuscitá-lo‑ei no último dia» (Jo 6, 54). Sacramento de Cristo morto e ressuscitado, a Eucaristia é aqui sacramento da passagem da morte para a vida, deste mundo para o Pai (Cf. Jo. 13, 1).

1525. Assim, do mesmo modo que os sacramentos do Batismo, da Confirmação e da Eucaristia constituem uma unidade chamada «os sacramentos da iniciação cristã», também pode dizer-se que a Penitência, a Santa Unção e a Eucaristia, como viático, constituem, quando a vida do cristão chega ao seu termo, «os sacramentos que preparam a entrada na Pátria» ou os sacramentos com que termina a peregrinação.

Resumindo:

1526. «Algum de vós está doente? Chame os Presbíteros da Igreja, para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o Senhor o aliviará. E, se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados» (Tg. 5, 14-15).

1527. 0 sacramento da Unção dos Enfermos tem por finalidade conferir uma graça especial ao cristão que enfrenta as dificuldades inerentes ao estado de doença grave ou de velhice.

1528. 0 tempo oportuno para receber a Santa Unção chegou certamente quando o fiel começa a encontrar-se em perigo de morte, devido a doença ou a velhice.

1529. Todas as vezes que um cristão cai gravemente enfermo, pode receber a Santa Unção; e também quando, mesmo depois de a ter recebido, a doença se agrava.

1530. Só os Sacerdotes (Presbíteros e Bispos) podem ministrar o sacramento da Unção dos Enfermos; para isso, empregarão óleo benzido pelo Bispo ou, em caso de necessidade, pelo próprio Presbítero celebrante.

1531. 0 essencial da celebração deste sacramento consiste na unção na fronte e nas mãos do doente (no rito romano) ou sobre outras partes do corpo (no Oriente), unção acompanhada da oração litúrgica do Sacerdote celebrante que pede a graça especial deste sacramento.

1532. A graça especial do sacramento da Unção dos Enfermos tem como efeitos:

- a união do doente à paixão de Cristo, para o seu bem e para o de toda a Igreja;
o conforto, a paz e a coragem para suportar cristãmente os sofrimentos da doença ou da velhice;
o perdão dos pecados, se o doente não pôde obtê-lo pelo sacramento da Penitência;
o restabelecimento da saúde, se tal for conveniente para a salvação espiritual;
a preparação para a passagem para vida eterna.

SEGUNDA SECÇÃO

OS SETE SACRAMENTOS DA IGREJA

CAPÍTULO TERCEIRO

OS SACRAMENTOS AO SERVIÇO DA COMUNHÃO

1533. O Batismo, a Confirmação e a Eucaristia são os sacramentos da iniciação cristã. São o fundamento da vocação comum de todos os discípulos de Cristo - vocação à santidade e à missão de evangelizar o mundo. E conferem as graças necessárias para a vida segundo o Espírito, nesta existência de peregrinos em marcha para a Pátria.

1534. Dois outros sacramentos, a Ordem e o Matrimónio, são ordenados para a salvação de outrem. Se contribuem também para a salvação pessoal, é através do serviço aos outros que o fazem. Conferem uma missão particular na Igreja, e servem a edificação do povo de Deus.

1535. Nestes sacramentos, aqueles que já foram consagrados pelo Batismo e pela Confirmação (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14) para o sacerdócio comum de todos os fiéis, podem receber consagrações particulares. Os que recebem o sacramento da Ordem são consagrados para serem, em nome de Cristo, «com a palavra e a graça de Deus, os pastores da igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 [1965} 15). Por seu lado, «os esposos cristãos são fortalecidos e como que consagrados por meio de um sacramento especial em ordem ao digno cumprimento dos deveres do seu estado» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).

ARTIGO 6

O SACRAMENTO DA ORDEM

1536. A Ordem é o sacramento graças ao qual a missão confiada por Cristo aos Apóstolos continua a ser exercida na Igreja, até ao fim dos tempos: é, portanto, o sacramento do ministério apostólico. E compreende três graus: o Episcopado, o Presbiterado e o Diaconado.

- [Sobre a instituição e a missão do ministério apostólico por Cristo ver os números 874-896. Aqui apenas se trata da via sacramental pela qual se transmite este ministério].

 I. Por que este nome de sacramento da Ordem?

1537. A palavra Ordem, na antiguidade romana, designava corpos constituídos no sentido civil, sobretudo o corpo dos que governavam, Ordinatio designa a integração num ordo. Na Igreja existem corpos constituídos, que a Tradição, não sem fundamento na Sagrada Escritura (Cf. Heb. 5, 6; 7, 11: Sl. 110, 4), designa, desde tempos antigos, com o nome de táxeis (em grego), ordines (em latim): a liturgia fala assim do ordo episcoporum - ordem dos Bispos -, do ordo presbyterorum - ordem dos Presbíteros - e do ordo diaconorum - ordem dos Diáconos. Há outros grupos que também recebem este nome de ordo: os catecúmenos, as virgens, os esposos, as viúvas...

1538. A integração num destes corpos da Igreja fazia-se através dum rito chamado ordinatio, ato religioso e litúrgico que era uma consagração, uma bênção ou um sacramento. Hoje, a palavra ordinatio é reservada ao ato sacramental que integra na ordem dos Bispos, dos Presbíteros e dos Diáconos, e que ultrapassa a simples eleição, designação, delegação ou instituição pela comunidade, pois confere um dom do Espírito Santo que permite o exercício dum «poder sagrado» (sacra potestas) (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 11965) 14) que só pode vir do próprio Cristo, pela sua Igreja. A ordenação também é chamada consecratio consagração -, porque é um pôr à parte e uma investidura feita pelo próprio Cristo para a sua Igreja. A imposição das mãos do Bispo, com a oração consecratória, constituem o sinal visível desta consagração.

II. O sacramento da Ordem na economia da salvação

O SACERDÓCIO DA ANTIGA ALIANÇA

1539. O povo eleito foi constituído por Deus como «um reino de Sacerdotes e uma nação consagrada» (Ex. 19, 6) (Cf. Is. 61, 6). Mas, dentro do povo de Israel, Deus escolheu uma das doze tribos, a de Levi, segregada para o serviço litúrgico (Cf. Nm. 1, 48-53) o próprio Deus é a sua parte na herança (Cf. Js. 13, 33). Um rito próprio consagrou as origens do sacerdócio da Antiga Aliança (Cf. Ex. 29, 1-30; Lv. 8). Nela, os Sacerdotes são «constituídos em favor dos homens, nas coisas respeitantes a Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados» (Cf. Heb. 5, 1).

1540. Instituído para anunciar a Palavra de Deus (Cf. Ml. 2, 7-9) e para restabelecer a comunhão com Deus pelos sacrifícios e a oração, aquele sacerdócio é, no entanto, impotente para operar a salvação, precisando de repetir sem cessar os sacrifícios, sem poder alcançar uma santificação definitiva (Cf. Heb. 5, 3; 7, 27; 10, 1-4) a qual só o sacrifício de Cristo havia de conseguir.

1541. Apesar disso, no sacerdócio de Aarão e no serviço dos levitas, assim como na instituição dos setenta «Anciãos» (Cr. Nm. 11, 24-25), a liturgia da Igreja vê prefigurações do ministério ordenado da Nova Aliança. Assim, no rito latino, a Igreja pede, na oração consecratória da ordenação dos Bispos:

- «Senhor Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo [...] por vossa palavra e vosso dom instituístes a Igreja com as suas normas fundamentais, eternamente predestinastes a geração dos justos que havia de nascer de Abraão, estabelecestes príncipes e sacerdotes, e não deixastes sem ministério o vosso santuário...» (Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi, presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione Episcopi. Prex ordinationis, 47, editio typica altera (Typis Polyglottis Vaticanis1990) p.24 [Ordenação do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos. Oração de ordenação do Bispo, 47 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa.1992) 40]).

1542. Na ordenação dos Presbíteros, a Igreja reza:

- «Senhor, Pai santo, [...] já na Antiga Aliança se desenvolveram funções sagradas que eram sinais do sacramento novo. A Moisés e a Aarão, que pusestes à frente do povo para o conduzirem e santificarem, associastes como seus colaboradores outros homens também escolhidos por Vós. No deserto, comunicastes o espírito de Moisés a setenta homens prudentes, com o auxílio dos quais ele governou mais facilmente o vosso povo. Do mesmo modo, as graças abundantes concedidas a Aarão. Vós as transmitistes a seus filhos, a fim de não faltarem sacerdotes, segundo a Lei, para oferecer os sacrifícios do templo, sombra dos bens futuros...» (Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi, presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione presbyterorum. Prex ordinationis, 159, editio typica altera (Typis Polyglottis Vaticanis1990) p. 91-92 [Ordenação do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos. Oração de ordenação dos presbíteros, 159 (Coimbra, Gráfica de Coimbra Conferência Episcopal Portuguesa, 1992) p. 104]).

1543. E na oração consecratória para a ordenação dos Diáconos, a Igreja confessa:

«Senhor, Pai santo, [...] é o novo templo que se edifica quando estabeleceis os três graus dos ministros sagrados para servirem ao vosso nome, como já na primeira Aliança escolhestes os filhos de Levi, para o serviço do templo antigo» (Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi, presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione diaconorum. Prex ordinationis, 207, editio typica altera (Typis Polyglottis Vaticanis1990) p. 121 [Ordenação do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos. Oração de ordenação dos diáconos, 207 (Coimbra, Gráfica de Coimbra Conferência Episcopal Portuguesa, 1992) p. 179]).

O SACERDÓCIO ÚNICO DE CRISTO

1544. Todas as prefigurações do sacerdócio da Antiga Aliança encontram a sua realização em Jesus Cristo, «único mediador entre Deus e os homens» (1ª Tm. 2, 5). Melquisedec, «sacerdote do Deus Altíssimo» (Gn. 14, 18), é considerado pela Tradição cristã como uma prefiguração do sacerdócio de Cristo, único «Sumo-Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec» (Heb. 5, l0; 6, 20), «santo, inocente, sem mancha» (Heb. 7, 26), que «com uma única oblação, tornou perfeitos para sempre os que foram santificados» (Heb. 10, 14), isto é, pelo único sacrifício da sua cruz.

1545. O sacrifício redentor de Cristo é único, realizado uma vez por todas. E, no entanto, é tornado presente no sacrifício eucarístico da Igreja. O mesmo se diga do sacerdócio único de Cristo, que é tornado presente pelo sacerdócio ministerial, sem diminuição da unicidade do sacerdócio de Cristo: «e por isso, só Cristo é verdadeiro sacerdote, sendo os outros seus ministros» («Et ideo solus  Christus est verus sacerdos, alii autem ministri eius»: S. Tomás de Aquino,  Commentarium in epistolam ad Hebraeos, c. 7. lect. 4: Opera ommnia, v. 21 (Parisiis 1876) p. 647).

DUAS PARTICIPAÇÕES NO SACERDÓCIO ÚNICO DE CRISTO

1546. Cristo, sumo Sacerdote e único mediador, fez da Igreja «um reino de Sacerdotes para Deus seu Pai» (Cf. Ap. 1, 6; 5, 9-10; 1ª Pe. 2, 5.9). Toda a comunidade dos crentes, como tal, é uma comunidade sacerdotal. Os fiéis exercem o seu sacerdócio batismal através da participação, cada qual segundo a sua vocação própria, na missão de Cristo, sacerdote, profeta e rei. É pelos sacramentos do Batismo e da Confirmação que os fiéis são «consagrados para serem [...] um sacerdócio santo» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14).

1547. O sacerdócio ministerial ou hierárquico dos Bispos e dos Presbíteros e o sacerdócio comum de todos os fiéis - embora «um e outro, cada qual segundo o seu modo próprio, participem do único sacerdócio de Cristo» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14) - são, no entanto, essencialmente diferentes ainda que sendo «ordenados um para o outro» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14). Em que sentido? Enquanto o sacerdócio comum dos fiéis se realiza no desenvolvimento da vida batismal - vida de fé, confiança e caridade, vida segundo o Espírito - o sacerdócio ministerial está ao serviço do sacerdócio comum, ordena-se ao desenvolvimento da graça batismal de todos os cristãos. É um dos meios pelos quais Cristo não cessa de construir e guiar a sua igreja. E é por isso que é transmitido por um sacramento próprio, que é o sacramento da Ordem.

NA PESSOA DE CRISTO CABEÇA...

1548. No serviço eclesial do ministro ordenado, é o próprio Cristo que está presente à sua Igreja, como Cabeça do seu corpo, Pastor do seu rebanho, Sumo-Sacerdote do sacrifício redentor, mestre da verdade. É o que a Igreja exprime quando diz que o padre, em virtude do sacramento da Ordem, age in persona Christi Capitis - na pessoa de Cristo Cabeça (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14: Ibid., 28 AAS 57 (1965) 34: Id., Const. Sacrosanctum Concilium, 33 AAS 56 ( 1964) 108: In.. Decr. Christus Dominus, 11 AAS 58 (1966) 677: Id. Decr. Presbyterorum ordinis, 2. AAS 58 (1966) 992: Ibid. 6: AAS 58 (1966) 999):

- «É o mesmo Sacerdote, Jesus Cristo, de quem realmente o ministro faz as vezes. Se realmente o ministro é assimilado ao Sumo-Sacerdote, em virtude da consagração sacerdotal que recebeu, goza do direito de agir pelo poder do próprio Cristo que representa 'virtute ac persona ipsius Christi'» (Pio XII. Enc. Mediator Dei: AAS 39 (1947) 548).

- «Cristo é a fonte de todo o sacerdócio: pois o sacerdócio da [antiga] lei era figura d'Ele, ao passo que o sacerdote da nova lei age na pessoa d'Ele» («Christus est fons totius sacerdotii: nam sacerdos legalis erat figura ipsius, sacerdos autem novae leis in persona ipsius operatur»: São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3, q. 22, a. 4. e: Ed. Leon. 11, 260).

1549. Pelo ministério ordenado, especialmente dos Bispos e Padres, a presença de Cristo como cabeça da Igreja torna-se visível no meio da comunidade dos crentes (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21: AAS 57 (1965) 24). Segundo a bela expressão de Santo Inácio de Antioquia, o Bispo é týpos toû Patrós, como que a imagem viva de Deus Pai (Cf. Santo Inácio de Antioquia,  Epistula ad Trallianos 3, 1: SC 10bis, 96 (Funk 1, 244) Id., Epistula ad Magnesios 6, 1: SC 10bis, 84 (Funk 1, 234)).

1550. Esta presença de Cristo no seu ministro não deve ser entendida como se este estivesse premunido contra todas as fraquezas humanas, contra o afã de domínio, contra os erros, isto é, contra o pecado. A força do Espírito Santo não garante do mesmo modo todos os atos do ministro. Enquanto que nos sacramentos esta garantia é dada, de maneira que nem mesmo o pecado do ministro pode impedir o fruto da graça, há muitos outros atos em que a condição humana do ministro deixa vestígios, que nem sempre são sinal de fidelidade ao Evangelho e podem, por conseguinte, prejudicar a fecundidade apostólica da Igreja.

1551. Este sacerdócio é ministerial. «O encargo que o Senhor confiou aos pastores do seu Povo é um verdadeiro serviço» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 24: AAS 57 (1965) 29). Refere-se inteiramente a Cristo e aos homens. Depende inteiramente de Cristo e do seu sacerdócio único, e foi instituído em favor dos homens e da comunidade da Igreja. O sacramento da Ordem comunica «um poder sagrado», que não é senão o de Cristo. O exercício desta autoridade deve, pois, regular-se pelo modelo de Cristo, que por amor Se fez o último e servo de todos (Cf. Mc. 10, 43-45; 1ª Pe. 5,3). «O Senhor disse claramente que o cuidado dispensado ao seu rebanho seria uma prova de amor para com Ele» (São João Crisóstomo, De sacerdotio 2, 4: SC 272, 118 (PG 48, 635); cf. Jo 21, 15-17).

...«EM NOME DE TODA A IGREJA»

1552. O sacerdócio ministerial não tem somente o encargo de representar Cristo. cabeça da Igreja, perante a assembleia dos fiéis; age também em nome de toda a Igreja, quando apresenta a Deus a oração da mesma Igreja (Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum Concilium, 33: AAS 56 (1964) 108) e, sobretudo, quando oferece o sacrifício eucarístico (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14).

1553. «Em nome de toda a Igreja» não quer dizer que os Sacerdotes sejam os delegados da comunidade. A oração e a oferenda da Igreja são inseparáveis da oração e da oferenda de Cristo, sua cabeça. É sempre o culto de Cristo na e pela sua Igreja. É toda a Igreja, corpo de Cristo, que ora e se oferece, «por Cristo, com Cristo, em Cristo», na unidade do Espírito Santo, a Deus Pai. Todo o corpo, caput et memora - cabeça e membros -, ora e oferece-se; e, por isso, aqueles que, no corpo, são de modo especial os ministros, chamam-se ministros não apenas de Cristo, mas também da Igreja. É porque representa Cristo, que o sacerdócio ministerial pode representar a Igreja.

III. Os três graus do sacramento da Ordem

1554. «O ministério eclesiástico, instituído por Deus, é exercido em ordens diversas por aqueles que, desde a antiguidade, são chamados Bispos, Presbíteros e Diáconos» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 28: AAS 57 (1965) 33-34). A doutrina católica, expressa na liturgia, no Magistério e na prática constante da Igreja, reconhece que existem dois graus de participação ministerial no sacerdócio de Cristo: o episcopado e o presbiterado. O diaconado destina-se a ajudá-los e a servi-los. Por isso, o termo «sacerdos» designa, no uso atual, os Bispos e os Presbíteros, mas não os Diáconos. Todavia, a doutrina católica ensina que os graus de participação sacerdotal (episcopado e presbiterado) e o grau de serviço (diaconado), todos três são conferidos por um ato sacramental chamado «ordenação», ou seja, pelo sacramento da Ordem.

- «Reverenciem todos os diáconos como a Jesus Cristo e de igual modo o Bispo que é a imagem do Pai, e os Presbíteros como o senado de Deus e como a assembleia dos Apóstolos: sem eles, não se pode falar de Igreja» (Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Trallianos 3, 1: SC 10bis, 96 (Funk1, 244)).

A ORDENAÇÃO EPISCOPAL - PLENITUDE DO SACRAMENTO DA ORDEM

1555. «Entre os vários ministérios, que na Igreja se exercem desde os primeiros tempos, consta da Tradição que o principal é o daqueles que, constituídos no episcopado através de uma sucessão que remonta às origens, são os transmissores da semente apostólica» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 20: AAS 57 (1965) 23).

1556. Para desempenhar a sua sublime missão, «os Apóstolos foram enriquecidos por Cristo com uma efusão especial do Espírito Santo, que sobre eles desceu: e pela imposição das mãos eles próprios transmitiram aos seus colaboradores este dom espiritual que foi transmitido até aos nossos dias através da consagração episcopal» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21 : AAS 57 (1965) 24).

1557. O II Concílio do Vaticano «ensina que, pela consagração episcopal, se confere a plenitude do sacramento do Ordens, à qual o costume litúrgico da Igreja e a voz dos santos Padres chamam sumo sacerdócio e vértice ["summa"] do sagrado ministério» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21: AAS 57 (1965) 25).

1558. «A consagração episcopal, juntamente com a função de santificar, confere também as funções de ensinar e governar [...] De fato, pela imposição das mãos e pelas palavras da consagração, a graça do Espírito Santo é dada e é impresso o carácter sagrado, de tal modo que os Bispos fazem as vezes, de uma forma eminente e visível, do próprio Cristo, Mestre, Pastor e Pontífice, e atuam em vez d'Ele [«in Eius persona agant»]» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21 : AAS 57 (1965) 25). Por isso, pelo Espírito Santo que lhes foi dado, os Bispos foram constituídos verdadeiros e autênticos mestres da fé, pontífices e pastores (II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus, 2: AAS 58 (1966) 674).

1559. «É em virtude da consagração episcopal e pela comunhão hierárquica com a cabeça e os membros do colégio que alguém é constituído membro do corpo episcopal» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 22: AAS 57 (1965) 26).O caráter e a natureza colegial da ordem episcopal manifestam-se, entre outros modos, na antiga prática da Igreja que exige, para a consagração dum novo Bispo, a participação de vários Bispos (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 22: AAS 57 (1965) 26). Para a ordenação legítima dum Bispo requer-se, hoje, uma intervenção especial do Bispo de Roma, em virtude da sua qualidade de supremo vínculo visível da comunhão das Igrejas particulares na Igreja una, e de garante da sua liberdade.

1560. Cada Bispo tem, como vigário de Cristo, o encargo pastoral da Igreja particular que lhe foi confiada. Mas, ao mesmo tempo, partilha colegialmente com todos os seus irmãos no episcopado a solicitude por todas as Igrejas: «se cada Bispo é pastor próprio apenas da porção do rebanho que foi confiada aos seus cuidados, a sua qualidade de legítimo sucessor dos Apóstolos, por instituição divina, torna-o solidariamente responsável pela missão apostólica da Igreja» (Pio XII. Enc. Fidei donum: AAS 49 (1957) 237: ct. II Concílio do Vaticano, Cons. Dogm. Lumen Gentium, 23: AAS 57 (1965) 27-28: In. Decr. Christus Dominus, 4: AAS 58 (1966) 674-675: Ibid., 36: AAS 58 (1966) 692: Ibid., 37 AAS 58 (1966) 693; Id. Decr. Ad gentes, 5: AAS 58 (1966) 951-952; Ibid., 6: AAS 58 (1966) 952-953: Ibid., 38: AAS 58 (1966) 984-986).

1561. Tudo o que acaba de ser dito explica porque é que a Eucaristia celebrada pelo Bispo tem uma significação muito especial como expressão da Igreja reunida em torno do altar sob a presidência daquele que representa visivelmente Cristo, bom Pastor e Cabeça da sua Igreja (Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum Concilium, 41: AAS 56 (1964) 111; Id., Cons. Dogm. Lumen Gentium, 26: AAS 57 (1965) 31-32).

A ORDENAÇÃO DOS PRESBÍTEROS - COOPERADORES DOS BISPOS

1562. «Cristo, a Quem o Pai santificou e enviou ao mundo, por meio dos seus Apóstolos tornou os Bispos, que são sucessores deles, participantes da sua consagração e missão; e estes, por sua vez, transmitem legitimamente o múnus do seu ministério em grau diverso e a diversos sujeitos na Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 28: AAS 57 (1965) 33). O seu cargo ministerial foi transmitido em grau subordinado aos Presbíteros, para que, constituídos na Ordem do presbiterado, fossem cooperadores da Ordem episcopal para o desempenho perfeito da missão apostólica confiada por Cristo (II Concílio do Vaticano, Decr. Prebyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 992).

1563. «O ofício dos Presbíteros, enquanto unido à Ordem episcopal, participa da autoridade com que o próprio Cristo edifica, santifica e governa o seu corpo. Por isso, o sacerdócio dos Presbíteros, embora pressuponha os sacramentos da iniciação cristã, é conferido mediante um sacramento especial, em virtude do qual os Presbíteros, mediante a unção do Espírito Santo, ficam assinalados com um carácter particular e, dessa maneira, configurados a Cristo-Sacerdote, de tal modo que possam agir em nome e na pessoa de Cristo Cabeça» (II Concílio do Vaticano, Decr. Prebyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 992).

1564. «Os Presbíteros, embora não possuam o pontificado supremo e dependam dos Bispos no exercício do próprio poder, todavia estão-lhes unidos na honra do sacerdócio; e, por virtude do sacramento da Ordem, são consagrados, à imagem de Cristo, sumo e eterno sacerdote (Cf. Heb. 5, 1-10: 7, 24; 9, 11-28), para pregar o Evangelho, ser pastores dos fiéis e celebrar o culto divino como verdadeiros sacerdotes do Novo Testamento (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 28: AAS 57 (1965) 3447).

1565. Em virtude do sacramento da Ordem, os sacerdotes participam das dimensões universais da missão confiada por Cristo aos Apóstolos. O dom espiritual que receberam na ordenação prepara-os, não para uma missão limitada e restrita, «mas sim para uma missão de salvação de amplitude universal, "até aos confins da terra"» (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 10: AAS 58 (1966) 1007), «dispostos, no seu coração, a pregar o Evangelho em toda a parte» (II Concílio do Vaticano, Decr. Optatam totius, 20: AAS 58 (1966) 726).

1566. «É no culto ou sinaxe eucarística que, por excelência exercem o seu múnus sagrado: nela, agindo na pessoa de Cristo e proclamando o seu mistério, unem as preces dos fiéis ao sacrifício da cabeça e, no sacrifício da Missa, tornam presente e aplicam, até à vinda do Senhor, o único sacrifício do Novo Testamento, o de Cristo, o qual de uma vez por todas se ofereceu ao Pai, como hóstia imaculada» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 28: AAS 57 (1965) 34). É deste sacrifício único que todo o seu ministério sacerdotal tira a própria força (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 993).

1567. «Cooperadores esclarecidos da Ordem episcopal, sua ajuda e instrumento, chamados para o serviço do povo de Deus, os Presbíteros constituem com o seu Bispo um único presbyterium com diversas funções. Onde quer que se encontre uma comunidade de fiéis, eles tornam de certo modo, presente o Bispo, ao qual estão associados, de ânimo fiel e generoso, e cujos encargos e solicitude assumem, segundo a própria medida, traduzindo-os na prática do cuidado quotidiano dos fiéis» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 28: AAS 57 (1965) 35). Os Presbíteros só podem exercer o seu ministério na dependência do Bispo e em comunhão com ele. A promessa de obediência, que fazem ao Bispo no momento da ordenação, e o ósculo da paz dado pelo Bispo no final da liturgia de ordenação, significam que o Bispo os considera seus colaboradores, filhos, irmãos e amigos e que, em contrapartida, eles lhe devem amor e obediência.

1568. «Os Presbíteros, elevados pela ordenação à Ordem do presbiterado, estão unidos entre si numa íntima fraternidade sacramental. Especialmente na diocese, a cujo serviço, sob o Bispo respectivo, estão consagrados, formam um só presbitério» (II Concílio do Vaticano, Dec. Presbyterorum ordinis, 8: AAS 58 (1966) 1003). A unidade do presbitério tem uma expressão litúrgica no costume segundo o qual, durante o rito da ordenação presbiterial, os presbíteros impõem também eles as mãos, depois do Bispo.

A ORDENAÇÃO DO DIÁCONOS - «EM VISTA DO SERVIÇO»

1569. «No grau inferior da hierarquia estão os Diáconos, aos quais foram impostas as mãos, "não em vista do sacerdócio, mas do serviço"» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 29 AAS 57 (1965) 36; cf. Id. Decr. Christus Dominus, 15: AAS 58 (1966) 679). Para a ordenação no diaconado, só o Bispo é que impõe as mãos, significando com isso que o Diácono está especialmente ligado ao Bispo nos encargos próprios da sua «diaconia» (Cf. Santo Hipólito de Roma, Traditio apostolica, 8: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) P 22-24).

1570. Os Diáconos participam de modo especial na missão e na graça de Cristo (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 41: AAS 57 (1965) 46: Id. Decr Ad gentes 16: AAS 58 (1966) 967). O sacramento da Ordem marca-os com um selo («carácter») que ninguém pode fazer desaparecer e que os configura com Cristo, que se fez «Diácono», isto é, o servo de todos (Cf. Mc 10, 45: Lc 22, 27: São Policarpo de Esmirna, Epistula ad Philippenses 5, 2: SC 10bis. 182 (Funk 1, 300)). Entre outros serviços, pertence aos Diáconos assistir o Bispo e os sacerdotes na celebração dos divinos mistérios, sobretudo da Eucaristia, distribuí-la, assistir ao Matrimónio e abençoá-lo, proclamar o Evangelho e pregar, presidir aos funerais e consagrar-se aos diversos serviços da caridade (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 29: AAS 57 (1965) 36; Id.. Cons. Sacrosanctum Concilium, 35, 4: AAS 56 (1964) 109: Id., Decr. Ad gentes, 16: AAS 58 (1966) 967).

1571. A partir do II Concílio do Vaticano, a Igreja latina restabeleceu o diaconado «como grau próprio e permanente da hierarquia» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 29: AAS 57 (1965) 36), enquanto as Igrejas do Oriente o tinham sempre mantido. Este diaconado permanente, que pode ser conferido a homens casados, constitui um enriquecimento importante para a missão da Igreja. Com efeito, é apropriado e útil que homens, cumprindo na Igreja um ministério verdadeiramente diaconal, quer na vida litúrgica e pastoral, quer nas obras sociais e caritativas, «sejam fortificados pela imposição das mãos, transmitida desde os Apóstolos, e mais estreitamente ligados ao altar, para que cumpram o seu ministério mais eficazmente por meio da graça sacramental do diaconado» (II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 16: AAS 58 (1966) 967).

IV. A celebração deste sacramento

1572. A celebração da ordenação dum Bispo, de Presbíteros ou de Diáconos, dada a sua importância na vida duma Igreja particular, requer o concurso do maior número possível de fiéis. Terá lugar, de preferência, ao domingo e na Sé catedral, com solenidade adequada à circunstância. As três ordenações - do Bispo, do Presbítero e do Diácono - seguem o mesmo esquema. O lugar próprio de sua celebração é dentro da liturgia eucarística.

1573. O rito essencial do sacramento da Ordem é constituído, para os três graus, pela imposição das mãos, por parte do Bispo, sobre a cabeça do ordinando, bem como pela oração consecratória específica, que pede a Deus a efusão do Espírito Santo e dos seus dons apropriados ao ministério para que é ordenado o candidato (Cf. Pio XII. Const. ap. Sacramentum ordinis, DS 3858).

1574. Como em todos os sacramentos, ritos anexos envolvem a celebração. Variando muito nas diversas tradições litúrgicas, tem todos um traço comum: exprimem os múltiplos aspectos da graça sacramental. Assim, os ritos iniciais, no rito latino - a apresentação e a eleição do ordinando, a alocução do Bispo, o interrogatório do ordinando, as ladainhas dos Santos - atestam que a escolha do candidato se fez em conformidade com o costume da Igreja e preparam o ato solene da consagração depois da qual vários ritos vêm exprimir e completar, de modo simbólico, o mistério realizado: para o Bispo e para o \Sacerdote, a unção com o santo crisma, sinal da unção especial do Espírito Santo, que torna fecundo o seu ministério; entrega do livro dos Evangelhos do anel, da mitra e do báculo ao Bispo, em sinal da sua missão apostólica de anunciar a Palavra de Deus, da sua fidelidade à Igreja, esposa de Cristo, do seu múnus de pastor do rebanho do Senhor: para o presbítero, entrega da patena e do cálice, «a oferenda do povo santo» (Cf. Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi, presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione presbyterorum. Traditio panis et vini. 163, editio tipica altera (Typis PolyglottisVaticanis 1990) p. 95 [Ordenação do Bispo, dos presbíteros e diáconos, Entrega do pão e do vinho,163 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa.1992) p. 107]) que ele é chamado a apresentar a Deus; para o Diácono, entrega do livro dos Evangelhos, pois acaba de receber a missão de anunciar o Evangelho de Cristo.

V. Quem pode conferir este sacramento?

1575. Foi Cristo quem escolheu os Apóstolos e lhes deu parte na sua missão e autoridade. Depois de ter subido à direita do Pai, Cristo não abandona o seu rebanho, antes continuamente o guarda por meio dos Apóstolos com a sua proteção e continua a dirigi-lo através destes mesmos pastores que hoje prosseguem a sua obra (Cf. Prefácio dos Apóstolos I: Missale Romanum, editio typica(Typis Polyglottis Vaticanis1970). p. 426 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 493]). É, pois, Cristo «quem dá», a uns serem apóstolos, a outros serem pastores (Cf. Ef. 4, 11). E continua agindo por meio dos Bispos (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21: AAS 57 (1965) 24).

1576. Uma vez que o sacramento da Ordem é o sacramento do ministério apostólico, pertence aos Bispos, enquanto sucessores dos Apóstolos, transmitir «o dom espiritual» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21: AAS 57 (1965) 24), «a semente apostólica» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 20: AAS 57 (1965) 23). Os Bispos validamente ordenados, isto é, que estão na linha da sucessão apostólica, conferem validamente os três graus do sacramento da Ordem (Cf. Inocêncio III, Professio fidei Waldensibus praescripta: DS 794; IV Concílio de Latrão, Cap. 1, De fide catholica: DS 802; CIC can. 1012; CCEO can. 744,747).

VI. Quem pode receber este sacramento?

1577. «Só o varão (vir) batizado pode receber validamente a sagrada ordenação» (CIC can. 1024). O Senhor Jesus escolheu homens (viri) para formar o colégio dos Doze Apóstolos (Cf. Mc. 3, 14-19; Lc. 6, 12-16), e o mesmo fizeram os Apóstolos quando escolheram os seus colaboradores (Cf. 1ª Tm. 3, 1-13; 2ª Tm. 1, 6: Tt. 1, 5-9) para lhes sucederem no desempenho do seu ministério (Cf. São Clemente de Roma, Epistula ad Corinthios, 42, 4: SC 167, 168-170 (Funk I. 152); Ibid., 44. 3: SC 167, 172 (Funk 1, 156)). O Colégio dos Bispos, a que os Presbíteros estão unidos no sacerdócio, torna presente e atualiza, até que Cristo volte, o Colégio dos Doze. A Igreja reconhece-se vinculada por essa escolha feita pelo Senhor em pessoa. É por isso que a ordenação das mulheres não é possível (Cf João Paulo II, Ep. Ap. Mulieris dignitatem, 26-27: AAS 80 (1988) 1715-1720. Id.. Ep. Ap. Ordinatio sacerdotalis: AAS 86 (1994) 545-548; Sagrada Congregação da Doutrina da Fé, Decl. Inter insigniores: AAS 69 (1977) 98-116; Id., Responsum ad dubium circa doctrinam in Epist. Ap. "Ordinatio Sacerdotalis" traditam: AAS 87 (1995) 1114).

1578. Ninguém tem direito a receber o sacramento da Ordem. Com efeito, ninguém pode arrogar-se tal encargo. É-se chamado a ele por Deus (Cf. Heb. 5, 4). Aquele que julga reconhecer em si sinais do chamamento divino ao ministério ordenado, deve submeter humildemente o seu desejo à autoridade da Igreja, à qual incumbe a responsabilidade e o direito de chamar alguém para receber as Ordens. Como toda e qualquer graça, este sacramento só pode ser recebido como um dom imerecido.

1579. Todos os ministros ordenados da Igreja latina, à excepção dos Diáconos permanentes, são normalmente escolhidos entre homens crentes que vivem celibatários e têm vontade de guardar o celibato «por amor do Reino dos céus» (Mt. 19, 12). Chamados a consagrarem-se totalmente ao Senhor e às «suas coisas» (Cf. 1ª Cor. 7, 32) dão-se por inteiro a Deus e aos homens. O celibato é um sinal desta vida nova, para cujo serviço o ministro da Igreja é consagrado: aceite de coração alegre, anuncia de modo radioso o Reino de Deus (Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 16: AAS 58 (1966) 1915-1016).

1580. Nas Igrejas orientais vigora, desde há séculos, uma disciplina diferente: enquanto os Bispos são escolhidos unicamente entre os celibatários, homens casados podem ser ordenados Diáconos e Presbíteros. Esta prática é, desde há muito tempo, considerada legítima: estes Sacerdotes exercem um ministério frutuoso nas suas comunidades (Cf. II Concílio do Vaticano, Decr Presbyterorum ordinis, 16: AAS 58 (1966) 1015). Mas, por outro lado, o celibato dos Sacerdotes é tido em muita honra nas Igrejas orientais e são numerosos aqueles que livremente optam por ele, por amor do Reino de Deus. Tanto no Oriente como no Ocidente, aquele que recebeu o sacramento da Ordem já não pode casar-se.

VII. Os efeitos do sacramento da Ordem

O CARÁCTER INDELÉVEL

1581. Este sacramento configura o ordinando com Cristo por uma graça especial do Espírito Santo, a fim de servir de instrumento de Cristo em favor da sua Igreja. Pela ordenação, recebe-se a capacidade de agir como representante de Cristo, cabeça da Igreja. na sua tríplice função de sacerdote, profeta e rei.

1582. Tal como no caso do Batismo e da Confirmação, esta participação na função de Cristo é dada uma vez por todas. O sacramento da Ordem confere, também ele, um carácter espiritual indelével, e não pode ser repetido nem conferido para um tempo limitado (Cf. Concílio de Trento, Sess. 23ª,  Canones de sacramento Ordinis, c. 4: DS 1767: II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 21: AAS 57 (1965) 25: Ibid., 28 AAS 57 (1965) 34: Ibid., 29: AAS 57 (1965) 36: Id., Decr. Presbyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 992.).

1583. Uma pessoa validamente ordenada pode, é certo, por graves motivos, ser dispensada das obrigações e funções decorrentes da ordenação, ou ser proibido de as exercer (CIC can 290-293. 1336. § 1, 3 e 5. 1338. § 2): mas já não pode voltar a ser leigo, no sentido estrito (Cf. Concílio de Trento, Sess. 23ª, Canones de sacramento Ordinis, can. 4: DS 1774), porque o carácter impresso pela ordenação fica para sempre. A vocação e a missão recebidas no dia da ordenação marcam-no de modo permanente.

1584. Uma vez que é Cristo, afinal, quem age e opera a salvação através do ministro ordenado, a indignidade deste não impede Cristo de agir (Cf. Concílio de Trento, Sess. 7ª, Canones de sacramentis in genere, can. 12: DS 1612: Concílio de Constança, Errores Iohannis Wyclif, 4: DS 1154). Santo Agostinho di-lo numa linguagem vigorosa:

- «quanto ao ministro orgulhoso, deve ser contado juntamente com o diabo. E nem por isso se contamina o dom de Cristo: o que através de tal ministro se comunica, conserva a sua pureza: o que passa por ele mantém-se límpido e chega até à terra fértil. [...] De fato, a virtude espiritual do sacramento é semelhante à luz: os que devem ser iluminados recebem-na na sua pureza, e ela, embora atravesse seres manchados, não se suja» (Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus, 5, 15: CCL 36, 50 (PL 35, 1422)).

A GRAÇA DO ESPÍRITO SANTO

1585. A graça do Espírito Santo própria deste sacramento consiste numa configuração com Cristo, Sacerdote, Mestre e Pastor, de quem o ordenado é constituído ministro.

1586. Para o Bispo, é, em primeiro lugar, uma graça de fortaleza («Spiritum principalem - Espírito soberano», isto é, Espírito que faz chefes, pede a oração de consagração do Bispo, no rito latino (Pontificale Romanum. De Ordinatione Episcopi, presbyterorum et diaconorum. De Ordinatione Episcopi. Prex ordinationis, 47, editio typica altera (Typis Polyglottis Vaticanis1990)  p.24 [Ordenação do Bispo, dos presbíteros e dos diáconos, Oração de ordenação do Bispo, 47 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa.1992) 40])): a graça de guiar e defender, com força e prudência, a sua Igreja, como pai e pastor, com amor desinteressado para com todos e uma predileção pelos pobres, os enfermos e os necessitados (II Concílio do Vaticano, Decr. Christus Dominus, 13: AAS 58 (1966) 678-679: Ibid., 16: AAS 58 (1966) 680-681). Esta graça impele-o a anunciar o Evangelho a todos, a ser o modelo do seu rebanho, a ir adiante dele no caminho da santificação, identificando-se na Eucaristia com Cristo sacerdote e vítima, sem recear dar a vida pelas suas ovelhas:

- «ó Pai, que conheceis os corações, concedei ao vosso servo, que escolhestes para o episcopado, a graça de apascentar o vosso santo rebanho e de exercer de modo irrepreensível, diante de Vós, o supremo sacerdócio, servindo-Vos noite e dia: que ele torne propício o vosso rosto e ofereça os dons da vossa santa Igreja: tenha, em virtude do Espírito do supremo sacerdócio, o poder de perdoar os pecados segundo o vosso mandamento, distribua os cargos segundo a vossa ordem e desligue de todo o vínculo pelo poder que Vós destes aos Apóstolos: que ele Vos agrade pela sua doçura e coração puro, oferecendo-Vos um perfume agradável, por vosso Filho Jesus Cristo...» (São Hipólito de Roma, Traditio apostolica, 3: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 8-10).

1587. O dom espiritual, conferido pela ordenação presbiterial, está expresso nesta oração própria do rito bizantino. O bispo, impondo as mãos, diz, entre outras coisas:

«Senhor, enchei do dom do Espírito Santo aquele que Vos dignastes elevar ao grau de presbítero, para que seja digno de se manter irrepreensível diante do vosso altar, de anunciar o Evangelho do vosso Reino, de desempenhar o ministério da vossa Palavra de verdade, de Vos oferecer dons e sacrifícios espirituais, de renovar o vosso povo pelo banho da regeneração; de modo que, ele próprio, vá ao encontro do nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo, vosso Unigénito, no dia da sua segunda vinda, e receba da vossa imensa bondade a recompensa dum fiel desempenho do seu ministério» (Liturgia Bizantina, 2ª  oração da imposição das mãos presbiteral: Euchológion tò méga (Roma 1873) p. 136).

1588. Quanto aos diáconos, «fortalecidos pela graça sacramental, servem o povo de Deus na "diaconia" da liturgia, da palavra e da caridade, em comunhão com o Bispo e o seu Presbitério» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 29 AAS 57 (1965) 36).

1589. Perante a grandeza da graça e do múnus sacerdotais, os santos doutores sentiram o apelo urgente à conversão, a fim de corresponderem, por toda a sua vida, Àquele de Quem o sacramento os constituiu ministros. É assim que São Gregário de Nazianzo, ainda jovem presbítero. exclama:

- «Temos de começar por nos purificar, antes de purificarmos os outros: temos de ser instruídos, para podermos instruir: temos de nos tornar luz para alumiar, de nos aproximar de Deus para podermos aproximar d'Ele os outros, ser santificados para santificar, conduzir pela mão e aconselhar com inteligência» (São Gregório de Nazianzo, Oratio 2, 71: SC 247, 184 (PG 35, 480)). «Eu sei de Quem somos ministros, a que nível nos encontramos e para onde nos dirigimos. Conheço as alturas de Deus e a fraqueza do homem, mas também a sua força» (São Gregório de Nazianzo, Oratio 2, 74: SC 247, 186 (PG 35, 481)). [Quem é, pois, o Sacerdote? Ele é «o defensor da verdade, eleva-se com os anjos glorifica com os Arcanjos, faz subir ao altar do Alto as vítimas dos sacrifícios, participa no sacerdócio de Cristo, remodela a criatura, restaura [nela] a imagem [de Deus], recria-a para o mundo do Alto e, para dizer o que há de mais sublime, é divinizado e diviniza» (São Gregório de Nazianzo, Oratio 2, 73: SC 247, 186 (PG 35, 481).

- E diz o santo Cura d'Ars: «é o Sacerdote quem continua a obra da redenção na terra»... «Se bem se compreendesse o que o sacerdote é na terra, morrer-se-ia, não de medo, mas de amor». [...] «O sacerdócio é o amor do Coração de Jesus» (B. Nodet, Le Cure d'Ars. Sa pensée-son coeur (Le Puy 1966) p. 98).

Resumindo:

1590. São Paulo ao seu discípulo Timóteo: «exorto-te a que reavives o dom que Deus depositou em ti, pela imposição das minhas mãos» (2ª Tm. 1, 6), e «aquele que aspira ao lugar de Bispo, aspira a uma nobre função» (1ª Tm. 3, 1). A Tito, o mesmo Apóstolo dizia: «se te deixei em Creta, foi para acabares de organizar o que faltava e estabelecer anciãos em cada cidade, como te havia ordenado» (Tt. 1, 5).

1591. A Igreja é, na sua totalidade, um povo sacerdotal. Graças ao Batismo, todos os fiéis participam no sacerdócio de Cristo. Esta participação chama-se «sacerdócio comum dos fiéis». Na base deste sacerdócio e ao seu serviço, existe uma outra participação na missão de Cristo: a do ministério conferido pelo sacramento da Ordem, cuja missão é servir em nome e na pessoa de Cristo-Cabeça no meio da comunidade.

1592. O sacerdócio ministerial difere essencialmente do sacerdócio comum dos fiéis, porque confere um poder sagrado para o serviço dos mesmos fiéis. Os ministros ordenados exercem o seu serviço junto do povo de Deus pelo ensino (munus docendi), pelo culto divino (munus liturgicum) e pelo governo pastoral (munus regendi).

1593. Desde as origens, o ministério ordenado fui conferido e exercido em três graus: o dos Bispos, o dos Presbíteros e o dos Diáconos. Os ministérios conferidos pela ordenação são insubstituíveis na estrutura orgânica da Igreja: sem Bispo, Presbíteros e Diáconos, não pode falar-se de Igreja (Cf. Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Trallianos 3, 1: SC 10bis. 96 (Funk 1, 244)).

1594. O Bispo recebe a plenitude do sacramento da Ordem que o insere no colégio episcopal e faz dele o chefe visível da Igreja particular que lhe é confiada. Os Bispos, enquanto sucessores dos Apóstolos e membros do Colégio, têm parte na responsabilidade apostólica e na missão de toda a Igreja, sob a autoridade do Papa, sucessor de São Pedro.

1595. Os presbíteros estão unidos aos Bispos na dignidade sacerdotal e, ao mesmo tempo, dependem deles no exercício das suas funções pastorais; são chamados a ser os cooperadores providentes dos Bispos; formam, em volta do seu Bispo, o presbitério, que assume com ele a responsabilidade da Igreja particular: Os Presbíteros recebem do Bispo o encargo duma comunidade paroquial ou duma função eclesial determinada.

1596. Os Diáconos são ministros ordenados para as tarefas de serviço da Igreja; não recebem o sacerdócio ministerial, mas a ordenação confere-lhes funções importantes no ministério da Palavra, culto divino, governo pastoral e serviço da caridade, encargos que eles devem desempenhar sob a autoridade pastoral do seu Bispo.

1597. O sacramento da Ordem é conferido pela imposição das mãos, seguida duma solene oração consecratória, que pede a Deus para o ordinando as graças do Espírito Santo, requeridas para o seu ministério. A ordenação imprime um carácter sacramental indelével.

1598. A Igreja confere o sacramento da Ordem somente a homens (viris) batizados, cujas aptidões para o exercício do ministério tenham sido devidamente reconhecidas. Compete à autoridade da Igreja a responsabilidade e o direito de chamar alguém para receber a Ordem.

1599. Na Igreja latina, o sacramento da Ordem para o presbiterado, normalmente, apenas é conferido a candidatos decididos a abraçar livremente o celibato e que manifestem publicamente a sua vontade de o guardar por amor do Reino de Deus e do serviço dos homens.

1600. Pertence aos bispos o direito de conferir o sacramento da Ordem nos seus três graus.

ARTIGO 7

O SACRAMENTO DO MATRIMÔNIO

1601. «O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si a comunhão íntima de toda a vida, ordenado por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à procriação e educação da prole, entre os batizados foi elevado por Cristo Senhor à dignidade de sacramento» (CIC can. 1055. § 1).

I. O matrimónio no desígnio de Deus

1602. A Sagrada Escritura começa pela criação do homem e da mulher, à imagem e semelhança de Deus (Cf. Gn. 1, 26-27), e termina com a visão das «núpcias do Cordeiro» (Ap 19, 9) (Cf. Ap. 19, 7). Do princípio ao fim, a Escritura fala do matrimónio e do seu «mistério», da sua instituição e do sentido que Deus lhe deu, da sua origem e da sua finalidade, das suas diversas realizações ao longo da história da salvação, das suas dificuldades nascidas do pecado e da sua renovação «no Senhor» (1ª Cor. 7, 39), na Nova Aliança de Cristo e da Igreja (Cf. Ef. 5, 32-32).

O MATRIMÓNIO NA ORDEM DA CRIAÇÃO

1603. «A íntima comunidade da vida e do amor conjugal foi fundada pelo Criador e dotada de leis próprias [...]. O próprio Deus é o autor do matrimónio»
(II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1067). A vocação para o matrimónio está inscrita na própria natureza do homem e da mulher, tais como saíram das mãos do Criador. O matrimónio não é uma instituição puramente humana, apesar das numerosas variações a que esteve sujeito no decorrer dos séculos, nas diferentes culturas, estruturas sociais e atitudes espirituais. Tais diversidades não devem fazer esquecer os traços comuns e permanentes. Muito embora a dignidade desta instituição nem sempre e nem por toda a parte transpareça com a mesma clareza (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 47: AAS 58 11966) 1067), existe, no entanto, em todas as culturas, um certo sentido da grandeza da união matrimonial. Porque «a saúde da pessoa e da sociedade está estreitamente ligada a uma situação feliz da comunidade conjugal e familiar» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 47: AAS 58 (1966) 1067).

1604. Deus, que criou o homem por amor, também o chamou ao amor, vocação fundamental e inata de todo o ser humano. Porque o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus (Cf. Gn. 1, 27) que é amor (1ª Jo. 4, 8.16). Tendo-os Deus criado homem e mulher, o amor mútuo dos dois torna-se imagem do amor absoluto e indefectível com que Deus ama o homem. É bom, muito bom, aos olhos do Criador (Cf Gn. 1, 31). E este amor, que Deus abençoa, está destinado a ser fecundo e a realizar-se na obra comum do cuidado da criação: «Deus abençoou-os e disse-lhes: "sede fecundos e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a"» (Gn. 1, 28).

1605. Que o homem e a mulher tenham sido criados um para o outro, afirma-o a Sagrada Escritura: «não é bom que o homem esteja só» (Gn. 2, 18). A mulher, «carne da sua carne» (Cf. Gn. 2, 23), isto é, sua igual, a criatura mais parecidos com ele, é-lhe dada por Deus como uma auxiliar (Cf Gn. 2, 18), representando assim aquele «Deus que é o nosso auxílio» (Cf. Sl. 121, 2). «Por esse motivo, o homem deixará o pai e a mãe, para se unir à sua mulher: e os dois serão uma só carne» (Gn. 2, 24). Que isto significa uma unidade indefectível das duas vidas, o próprio Senhor o mostra, ao lembrar qual foi, «no princípio», o desígnio do Criador (Cf. Mt. 19, 4): «portanto, já não são dois, mas uma só carne» (Mt. 19, 6).

O MATRIMÓNIO SOB O REGIME DO PECADO

1606. Todo o homem faz a experiência do mal, à sua volta e em si mesmo. Esta experiência faz-se também sentir nas relações entre o homem e a mulher. Desde sempre, a união de ambos foi ameaçada pela discórdia, o espírito de domínio, a infidelidade, o ciúme e conflitos capazes de ir até ao ódio e à ruptura. Esta desordem pode manifestar-se de um modo mais ou menos agudo e ser mais ou menos ultrapassada, conforme as culturas, as épocas, os indivíduos. Mas parece, sem dúvida, ter um carácter universal.

1607. Segundo a fé, esta desordem, que dolorosamente comprovamos, não procede da natureza do homem e da mulher, nem da natureza das suas relações, mas do pecado. Ruptura com Deus, o primeiro pecado teve como primeira consequência a ruptura da comunhão original do homem e da mulher. As suas relações são distorcidas por acusações recíprocas
(Cf. Gn. 3, 12); a atracção mútua, dom próprio do Criador (Cf. Gn. 2, 22), converte-se em relação de domínio e de cupidez (Cf. Gn. 3, 16): a esplêndida vocação do homem e da mulher para serem fecundos, multiplicarem-se e submeterem a terra (Cf. Gn. 1, 28) fica sujeita às dores do parto e do ganha-pão (Cf. Gn. 3, 16-19).

1608. No entanto, a ordem da criação subsiste, apesar de gravemente perturbada. Para curar as feridas do pecado, o homem e a mulher precisam da ajuda da graça que Deus, na sua misericórdia infinita, nunca lhes recusou (Cf. Gn. 3, 21). Sem esta ajuda, o homem e a mulher não podem chegar a realizar a união das suas vidas para a qual Deus os criou «no princípio».

O MATRIMÓNIO SOB A PEDAGOGIA DA LEI

1609. Na sua misericórdia, Deus não abandonou o homem pecador. As penas que se seguiram ao pecado, «as dores do parto» (Cf. Gn. 3, 16), o trabalho «com o suor do rosto» (Gn. 3, 19), constituem também remédios que reduzem os malefícios do pecado. Depois da queda, o matrimónio ajuda a superar o auto isolamento, o egoísmo, a busca do próprio prazer, e a abrir-se ao outro, à mútua ajuda, ao dom de si.

1610. A consciência moral relativamente à unidade e indissolubilidade do matrimónio desenvolveu-se sob a pedagogia da antiga Lei. A poligamia dos patriarcas e dos reis ainda não é explicitamente rejeitada. No entanto, a Lei dada a Moisés visa proteger a mulher contra um domínio arbitrário por parte do homem, ainda que a mesma Lei comporte também, segundo a palavra do Senhor, vestígios da «dureza do coração» do homem, em razão da qual Moisés permitiu o repúdio da mulher (Cf.  Mt. 19, 8: Dt. 24, 1).

1611. Ao verem a Aliança de Deus com Israel sob a imagem dum amor conjugal, exclusivo e fiel (Cf. Os. 1-3: Is. 54; 62; Jr. 2-3; 31; Ez. 16; 23), os profetas prepararam a consciência do povo eleito para uma inteligência aprofundada da unicidade e indissolubilidade do matrimónio (Cf. Ml. 2, 13-17). Os livros de Rute e de Tobias dão testemunhos comoventes do elevado sentido do matrimónio, da fidelidade e da ternura dos esposos. E a Tradição viu sempre no Cântico dos Cânticos uma expressão única do amor humano, enquanto reflexo do amor de Deus, amor «forte como a morte», que «nem as águas caudalosas conseguem apagar» (Ct. 8, 6-7).

O MATRIMÓNIO NO SENHOR

1612. A aliança nupcial entre Deus e o seu povo Israel tinha preparado a Aliança nova e eterna, pela qual o Filho de Deus, encarnando e dando a sua vida, uniu a Si, de certo modo, toda a humanidade por Ele salva (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 22: AAS 58 (1966) 1042), preparando assim as «núpcias do Cordeiro» (Cf. Ap. 19, 7. 9).

1613. No umbral da sua vida pública, Jesus realiza o seu primeiro sinal - a pedido da sua Mãe - por ocasião duma festa de casamento (Cf. Jo. 2, 1-11). A Igreja atribui uma grande importância à presença de Jesus nas bodas de Caná. Ela vê nesse fato a confirmação da bondade do matrimónio e o anúncio de que, doravante, o matrimónio seria um sinal eficaz da presença de Cristo.

1614. Na sua pregação, Jesus ensinou sem equívocos o sentido original da união do homem e da mulher, tal como o Criador a quis no princípio: a permissão de repudiar a sua mulher, dada por Moisés, era uma concessão à dureza do coração (Cf. Mt. 19, 8): a união matrimonial do homem e da mulher é indissolúvel: foi o próprio Deus que a estabeleceu: «não separe, pois, o homem o que Deus uniu» (Mt. 19, 6).

1615. Esta insistência inequívoca na indissolubilidade do vínculo matrimonial pôde criar perplexidade e aparecer como uma exigência impraticável (Cf. Mt. 19, 10). No entanto, Jesus não impôs aos esposos um fardo impossível de levar e pesado demais (Cf. Mt. 11, 29-30), mais pesado que a Lei de Moisés. Tendo vindo restabelecer a ordem original da criação, perturbada pelo pecado, Ele próprio dá a força e a graça de viver o matrimónio na dimensão nova do Reino de Deus. É seguindo a Cristo, na renúncia a si próprios e tornando a sua cruz (Cf. Mc. 8, 34), que os esposos poderão «compreender» (Cf. Mt. 19, 11) o sentido original do matrimónio e vivê-lo com a ajuda de Cristo. Esta graça do Matrimónio cristão é fruto da cruz de Cristo, fonte de toda a vida cristã.

1616. É o que o Apóstolo Paulo nos dá a entender, quando diz: «maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e Se entregou por ela, a fim de a santificar» (Ef. 5, 25-26): e acrescenta imediatamente: «"por isso o homem deixará o pai e a mãe para se unir à sua mulher e serão os dois uma só carne". É grande este mistério, digo-o em relação a Cristo e à Igreja» (Ef. 5, 31-32).

1617. Toda a vida cristã tem a marca do amor esponsal entre Cristo e a Igreja. Já o Batismo, entrada no povo de Deus, é um mistério nupcial: é, por assim dizer, o banho de núpcias (Cf. Ef. 5, 26-27) que precede o banquete das bodas, a Eucaristia. O Matrimónio cristão, por sua vez, torna-se sinal eficaz, sacramento da aliança de Cristo com a Igreja. E uma vez que significa e comunica a graça desta aliança, o Matrimónio entre batizados é um verdadeiro sacramento da Nova Aliança (Cf. Concílio de Trento, Sess. 24ª. Doctrina de sacramento Matrimonii: DS 1800; CIC can. 1055, § I).

A VIRGINDADE POR AMOR DO REINO

1618. Cristo é o centro de toda a vida cristã. A união com Ele prevalece sobre todas as outras, quer se trate de laços familiares, quer sociais (Cf. Lc. 14, 26; Mc. 10, 28-31). Desde o princípio da Igreja, houve homens e mulheres que renunciaram ao grande bem do matrimónio, para seguirem o Cordeiro aonde quer que Ele vá (Cf. Ap. 14, 4), para cuidarem das coisas do Senhor, para procurarem agradar-Lhe para saírem ao encontro do Esposo que vem (Cf. 1ª Cor. 7, 32). O próprio Cristo convidou alguns a seguirem-no neste modo de vida, de que Ele é o modelo:

- «há eunucos que nasceram assim do seio materno; há os que foram feitos eunucos pelos homens; e há os que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus. Quem puder entender, entenda»! (Mt. 19, 12).

1619. A virgindade por amor do Reino dos céus é um desenvolvimento da graça batismal, um sinal poderoso da preeminência da união com Cristo e da espera fervorosa do seu regresso (Cf. Mt 25, 6), um sinal que lembra também que o matrimónio é uma realidade do tempo presente, que é passageiro (Cf. Mc. 12, 25: 1ª Cor. 7, 31).

1620. Quer, o sacramento do Matrimónio, quer a virgindade por amor do Reino de Deus, vêm do próprio Senhor. É Ele que lhes dá sentido e concede a graça indispensável para serem vividos em conformidade com a sua vontade (Cf. Mt. 19, 3-12). A estima pela virgindade por amor do Reino (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 42: AAS 57 (1965) 48: Id., Decr. Perfectae caritatis, 12 AAS 58 (1966) 707: In., Decr. Optatam totius, 10: AAS 58 (1966) 720-721) e o sentido cristão do matrimónio são inseparáveis e favorecem-se mutuamente:

- «denegrir o Matrimónio é, ao mesmo tempo, diminuir a glória da virgindade: enaltecê-lo é realçar a admiração devida à virgindade [...] Porque, no fim de contas, o que só em comparação com um mal parece bom, não pode ser um verdadeiro bem: mas o que ainda é melhor do que bens incontestados, esse é que é o bem por excelência» (São João Crisóstomo, De Virginitate 10, 1: SC 125, 122 (PG 48, 540): cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiares consortio, 16: AAS 74 (1982) 98).

II. A celebração do Matrimónio

1621. No rito latino, a celebração do Matrimónio entre dois fiéis católicos tem lugar normalmente no decorrer da santa Missa, em virtude da ligação de todos os sacramentos com o mistério pascal de Cristo (Cf. II Concílio do Vaticano, Sacrosanctum Concilium, 61:AAS 56 (1964) 116-117). Na Eucaristia realiza-se o memorial da Nova Aliança, pela qual Cristo se uniu para sempre à Igreja, sua esposa bem-amada, por quem se entregou (Cl. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 6: AAS 57 (1965) 9). Por isso, é conveniente que os esposos selem o seu consentimento à doação recíproca pela oferenda das próprias vidas, unindo-a à oblação de Cristo pela sua Igreja, tornada presente no sacrifício eucarístico, e recebendo a Eucaristia, para que, comungando o mesmo corpo e o mesmo sangue de Cristo, «formem um só corpo» em Cristo (Cf. 1ª Cor. 10, 17).

1622. «Enquanto ação sacramental de santificação, a celebração litúrgica do Matrimónio [...] deve ser por si mesma válida, digna e frutuosa» (João Paulo II, Ex. ap. Familiares consortio, 67: AAS 74 (1982) 162).  Por isso, é conveniente que os futuros esposos se preparem para a celebração do seu Matrimónio, recebendo o sacramento da Penitência.

1623. Segundo a tradição latina, são os esposos quem, como ministros da graça de Cristo, mutuamente se conferem o sacramento do Matrimónio, ao exprimirem, perante a Igreja, o seu consentimento. Nas tradições das Igrejas orientais, os Sacerdotes que oficiam - Bispos ou Presbíteros - são testemunhas do mútuo consentimento manifestado pelos esposos (Cf. CCEO can. 817), mas a sua bênção também é necessária para a validade do sacramento (CCEO can. 828).

1624. As diversas liturgias são ricas em orações de bênção e de epiclese, pedindo a Deus a sua graça e invocando a sua bênção sobre o novo casal, especialmente sobre a esposa. Na epiclese deste sacramento, os esposos recebem o Espírito Santo como comunhão do amor de Cristo e da Igreja (Cf. Ef. 5, 32). É Ele o selo da aliança de ambos, a nascente sempre oferecida do seu amor, a força pela qual se renovará a sua fidelidade.

III. O consentimento matrimonial

1625. Os protagonistas da aliança matrimonial são um homem e uma mulher batizados, livres para contrair Matrimónio e que livremente exprimem o seu consentimento. «Ser livre» quer dizer:

-  não ser constrangido;
- não estar impedido por nenhuma lei natural nem eclesiástica.

1626. A Igreja considera a permuta dos consentimentos entre os esposos como o elemento indispensável «que constitui o Matrimónios (CIC can. 1057. § 1). Se faltar o consentimento, não há Matrimónio».

1627. O consentimento consiste num «ato humano pelo qual os esposos se dão e se recebem mutuamente» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1067; CIC can. 1057, § 2): «eu recebo-te por minha esposa. Eu recebo-te por meu esposo» (Ordo celebrandi Matrimonium, 62, Editio typica altera (Typis Polyglottis Vaticanas 1991) p. 17 [Celebração do Matrimónio, 62, segunda edição típica (Coimbra, Gráfica de Coimbra — Conferência Episcopal Portuguesa 1993) p.31]). Este consentimento, que une os esposos entre si, tem a sua consumação no fato de os dois «se tornarem uma só carne» (Cf. Gn. 2, 24; Mc. 10, 8: Ef. 5, 31).

1628. O consentimento deve ser um ato da vontade de cada um dos contraentes, livre de violência ou de grave temor externo (Cf. CIC can. 1103). Nenhum poder humano pode substituir-se a este consentimento (Cf. CIC can. 1057, § 1). Faltando esta liberdade, o matrimónio é inválido.

1629. Por este motivo (ou por outras razões, que tornem nulo ou não realizado o casamento) (Cf. CIC can. 1083-1108), a Igreja pode, depois de examinada a situação pelo tribunal eclesiástico competente, declarar «a nulidade do Matrimónio», ou seja, que o Matrimónio nunca existiu. Em tal caso, os contraentes ficam livres para se casarem, salvaguardadas as obrigações naturais resultantes da união anterior (Cf. CIC can. 1071, § 1, 3).

1630. O Sacerdote (ou o Diácono), que assiste à celebração do Matrimónio, recebe o consentimento dos esposos em nome da Igreja e dá a bênção da Igreja. A presença do ministro da Igreja (bem como das testemunhas) exprime visivelmente que o Matrimónio é uma realidade eclesial.

1631. É por esse motivo que, normalmente, a Igreja exige para os seus fiéis a forma eclesiástica da celebração do Matrimónio (Cf. Concílio de Trento, Sess. 24ª, Decretum "Tametsi ": DS 1813-1816: CIC can. 1108). Muitas razões concorrem para explicar esta determinação:

- o Matrimónio sacramental é um ato litúrgico. Portanto, é conveniente que seja celebrado na liturgia pública da Igreja;
-  o Matrimónio introduz num ordo eclesial, cria direitos e deveres na Igreja, entre os esposos e para com os filhos;
-  uma vez que o Matrimónio é um estado de vida na Igreja, é necessário que haja a certeza a respeito dele (daí a obrigação de haver testemunhas);
-  o carácter público do consentimento protege o «sim» uma vez dado e ajuda a permanecer-lhe fiel.

1632. Para que o «sim» dos esposos seja um ato livre e responsável, e para que a aliança matrimonial tenha bases humanas e cristãs sólidas e duradoiras, é de primordial importância a preparação para o matrimónio:

o exemplo e o ensino dados pelos pais e pelas famílias continuam a ser o caminho privilegiado desta preparação.
O papel dos pastores e da comunidade cristã, como «família de Deus», é indispensável para a transmissão dos valores humanos e cristãos do Matrimónio e da família
(Cf. CIC can. 1063), e isto tanto mais quanto é certo que, nos nossos dias, muitos jovens conhecem a experiência de lares desfeitos, que já não garantem suficientemente aquela iniciação:

- «os jovens devem ser conveniente e oportunamente instruídos, sobretudo no seio da própria família, acerca da dignidade, missão e exercício do amor conjugal. Deste modo, educados na estima pela castidade, poderão passar, chegada à idade conveniente, de um noivado honesto para o matrimónio» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 49: AAS 58 (1966) 1070).

CASAMENTOS MISTOS E DISPARIDADE DE CULTOS

1633. Em muitos países, a situação do matrimónio misto (entre um católico e um batizado não católico) apresenta-se de modo bastante frequente. Tal situação pede uma atenção particular dos cônjuges e dos pastores. O caso dos casamentos com disparidade de culto (entre um católico e um não-batizado) exige uma atenção ainda maior.

1634. A diferença de confissão religiosa entre os cônjuges não constitui um obstáculo insuperável para o Matrimónio, quando eles conseguem pôr em comum o que cada um recebeu na sua comunidade e aprender um do outro o modo como cada um vive a sua fidelidade a Cristo. Mas as dificuldades dos matrimónios mistos nem por isso devem ser subestimadas. São devidas ao fato de a separação dos cristãos ainda não ter sido superada. Os esposos arriscam-se a vir a ressentir-se do drama da desunião dos cristãos no seio do próprio lar. A disparidade de culto pode agravar ainda mais estas dificuldades. As divergências em relação à fé, o próprio conceito do Matrimónio e ainda as diferentes mentalidades religiosas podem constituir uma fonte de tensões no Matrimónio, principalmente por causa da educação dos filhos. Pode então surgir uma tentação: a indiferença religiosa.

1635. Segundo o direito em vigor na Igreja latina, um Matrimónio misto precisa da permissão expressa da autoridade eclesiástica (Cf. CIC can. 1124) para a respectiva liceidade. Em caso de disparidade de culto, é requerida uma dispensa expressa do impedimento para a validade do Matrimónio (Cf. CIC can. 1086). Tanto a permissão como a dispensa supõem que as duas partes conhecem e não rejeitam os fins e propriedades essenciais do Matrimónio: e também que a parte católica confirma os seus compromissos, dados também a conhecer expressamente à parte não católica, de conservar a sua fé e de assegurar o Batismo e a educação dos filhos na Igreja Católica (Cf. C1C can. 1125).

1636. Em muitas regiões, graças ao diálogo ecuménico, as respectivas comunidades cristãs puderam organizar uma pastoral comum para os casamentos mistos. O seu papel consiste em ajudar os casais a viver a sua situação particular à luz da fé. Ela deve também ajudá-los a superar as tensões entre as obrigações dos cônjuges um para com o outro e para com as respectivas comunidades eclesiais. Deve estimular o desenvolvimento do que lhes é comum na fé e o respeito pelo que os divide.

1637. Nos casamentos com disparidade de culto, o cônjuge católico tem uma tarefa particular a cumprir, «porque o marido não-crente é santificado pela sua mulher e a mulher não-crente é santificada pelo marido crente» (1ª Cor. 7, 14). Será uma grande alegria para o cônjuge cristão e para a Igreja, se está «santificação» levar à conversão livre do outro à fé cristã» (Cf. 1ª Cor. 7, 16). O amor conjugal sincero, a prática humilde e paciente das virtudes familiares e a oração perseverante, podem preparar o cônjuge não-crente para receber a graça da conversão.

IV. Os efeitos do sacramento do Matrimónio

1638. «Do Matrimónio válido origina-se entre os cônjuges um vínculo de sua natureza perpétuo e exclusivo: no matrimónio cristão, além disso, são os cônjuges robustecidos e como que consagrados por um sacramento peculiar para os deveres e dignidade do seu estado» (CIC can.1134).

O VÍNCULO MATRIMONIAL

1639. O consentimento, pelo qual os esposos mutuamente se dão e se recebem, é selado pelo próprio Deus (Cf. Mc. 10, 9). Da sua aliança «nasce uma instituição, também à face da sociedade, tornada firme e estável pela lei divina» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1067). A aliança dos esposos é integrada na aliança de Deus com os homens: «o autêntico amor conjugal é assumido no amor divino» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).

1640. O vínculo matrimonial é, portanto, estabelecido pelo próprio Deus, de maneira que o matrimónio ratificado e consumado entre batizados não pode jamais ser dissolvido. Este vínculo, resultante do ato humano livre dos esposos e da consumação do matrimónio, é, a partir de então, uma realidade irrevogável e dá origem a uma aliança garantida pela fidelidade de Deus. A Igreja não tem poder para se pronunciar contra esta disposição da sabedoria divina (Cf. CIC can. 1141).

A GRAÇA DO SACRAMENTO DO MATRIMÓNIO

1641. Os esposos cristãos, «no seu estado de vida e na sua ordem, têm, no povo de Deus, os seus dons próprios» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 16). Esta graça própria do sacramento do Matrimónio destina-se a aperfeiçoar o amor dos cônjuges e a fortalecer a sua unidade indissolúvel. Por meio desta graça, «eles auxiliam-se mutuamente para chegarem à santidade pela vida conjugal e pela procriação e educação dos filhos» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15-16: cf. Ibid., 41. AAS 57 (1965) 47).

1632. Cristo é a fonte desta graça. «Assim como outrora Deus veio ao encontro do seu povo com unia aliança de amor e fidelidade, assim agora o Salvador dos homens e Esposo da Igreja vem ao encontro dos esposos cristãos com o sacramento do Matrimónio» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1068). Fica com eles, dá-lhes a coragem de O seguirem tomando sobre si a sua cruz, de se levantarem depois das quedas, de se perdoarem mutuamente, de levarem o fardo um do outro (Cf. Gl. 6, 2), de serem «submissos um ao outro no temor de Cristo» (Ef. 5, 21) e de se amarem com um amor sobrenatural, delicado e fecundo. Nas alegrias do seu amor e da sua vida familiar, Ele dá-lhes, já neste mundo, um antegosto do festim das núpcias do Cordeiro:

- «onde irei buscar forças para descrever, de modo satisfatório, a felicidade do Matrimónio que a Igreja une, que a oblação eucarística confirma e a bênção sela? Os Anjos proclamam-no, o Pai Celeste ratifica-o [...]. Que jugo o de dois cristãos, unidos por uma só esperança, um único desejo, uma única disciplina, um mesmo serviço! Ambos filhos do mesmo Pai, servos do mesmo Senhor; nada os separa, nem no espírito nem na carne; pelo contrário, eles são verdadeiramente dois numa só carne. Ora, onde a carne á só uma, também um só é o espírito» (Tertuliano, Ad Uxorem 2, 8. 6-7: CCL 1, 393 (PL 1, 1415-1416): cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 13: AAS 74 (1982) 94).

V. Os bens e as exigências do amor conjugal

1643. «O amor conjugal comporta um todo em que entram todas as componentes da pessoa - apelo do corpo e do instinto, força do sentimento e da afetividade, aspiração do espírito e da vontade -; visa uma unidade profundamente pessoal - aquela que, para além da união numa só carne, conduz à formação dum só coração e duma só alma -; exige a indissolubilidade e a fidelidade na doação recíproca definitiva; e abre-se à fecundidade. Trata-se, é claro, das características normais de todo o amor conjugal natural, mas com um significado novo que não só as purifica e consolida, mas as eleva ao ponto de fazer delas a expressão de valores especificamente cristãos» (João Paulo II, Ex. ap. Familiares consortio, 13: AAS 74 (1982) 96).

A UNIDADE E A INDISSOLUBILIDADE DO MATRIMÔNIO

1644. Pela sua própria natureza, o amor dos esposos exige a unidade e a indissolubilidade da sua comunidade de pessoas, a qual engloba toda a sua vida: «assim, já não são dois, mas uma só carne» (Mt. 19, 6) (Cf. Gn. 2, 24). «Eles são chamados a crescer sem cessar na sua comunhão, através da fidelidade quotidiana à promessa da mútua doação total que o Matrimónio implica» (João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 19: AAS 74 (1982) 101). Esta comunhão humana é confirmada, purificada e aperfeiçoada pela comunhão em Jesus Cristo, conferida pelo sacramento do Matrimónio; e aprofunda-se pela vida da fé comum e pela Eucaristia recebida em comum.

1645. «A igual dignidade pessoal, que se deve reconhecer à mulher e ao homem no amor pleno que têm um pelo outro, manifesta claramente a unidade do Matrimónio, confirmada pelo Senhor» (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 49: AAS 58 (1966) 1070). A poligamia é contrária a esta igual dignidade e ao amor conjugal, que é único e exclusivo (João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 19: AAS 74 (1982) 102).

A FIDELIDADE DO AMOR CONJUGAL

1646. Pela sua própria natureza, o amor conjugal exige dos esposos uma fidelidade inviolável. Esta é uma consequência da doação de si mesmos que os esposos fazem um ao outro. O amor quer ser definitivo. Não pode ser «até nova ordem». «Esta união íntima, enquanto doação recíproca de duas pessoas, tal como o bem dos filhos, exigem a inteira fidelidade dos cônjuges e reclamam a sua união indissolúvel» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).

1647. O motivo mais profundo encontra-se na fidelidade de Deus à sua aliança, de Cristo à sua Igreja. Pelo sacramento do Matrimónio, os esposos ficam habilitados a representar esta fidelidade e a dar testemunho dela. Pelo sacramento, a indissolubilidade do Matrimónio adquire um sentido novo e mais profundo.

1648. Pode parecer difícil, e até impossível, ligar-se por toda a vida a um ser humano. Por isso mesmo, é da maior importância anunciar a boa-nova de que Deus nos ama com um amor definitivo e irrevogável, de que os esposos participam neste amor que os conduz e sustém e de que, pela sua fidelidade, podem ser testemunhas do amor fiel de Deus. Os esposos que, com a graça de Deus, dão este testemunho, muitas vezes em condições bem difíceis, merecem a gratidão e o amparo da comunidade eclesial (João Paulo II. Ex. ap. Familiaris consortio, 20: AAS 74 (1982) 104).

1649. No entanto, há situações em que a coabitação matrimonial se torna praticamente impossível pelas mais diversas razões. Em tais casos, a Igreja admite a separação física dos esposos e o fim da coabitação. Mas os esposos não deixam de ser marido e mulher perante Deus: não são livres de contrair nova união. Nesta situação difícil, a melhor solução seria, se possível, a reconciliação. A comunidade cristã é chamada a ajudar estas pessoas a viverem cristãmente a sua situação, na fidelidade ao vínculo do seu Matrimónio, que continua indissolúvel (Cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 83: AAS 74 (1982) 184; CIC can. 1151-1155).

1650. Hoje em dia e em muitos países, são numerosos os católicos que recorrem ao divórcio, em conformidade com as leis civis, e que contraem civilmente uma nova união. A Igreja mantém, por fidelidade à palavra de Jesus Cristo («quem repudia a sua mulher e casa com outra comete adultério em relação à primeira; e se uma mulher repudia o seu marido e casa com outro, comete adultério») (Mc 10, 11-12), que não pode reconhecer como válida uma nova união, se o primeiro Matrimónio foi válido. Se os divorciados se casam civilmente, ficam numa situação objetivamente contrária à lei de Deus. Por isso, não podem aproximar-se da comunhão eucarística, enquanto persistir tal situação. Pelo mesmo motivo, ficam impedidos de exercer certas responsabilidades eclesiais. A reconciliação, por meio do sacramento da Penitência, só pode ser dada àqueles que se arrependerem de ter violado o sinal da Aliança e da fidelidade a Cristo e se comprometerem a viver em continência completa.

1651. Com respeito a cristãos que vivem nesta situação e que muitas vezes conservam a fé e desejam educar cristãmente os seus filhos, os sacerdotes e toda a comunidade devem dar provas duma solicitude atenta, para que eles não se sintam separados da Igreja, em cuja vida podem e devem participar como batizados que são:

- «serão convidados a ouvir a Palavra de Deus, a assistir ao sacrifício da Missa, a perseverar na oração, a prestar o seu contributo às obras de caridade e às iniciativas da comunidade em prol da justiça, a educar os seus filhos na fé cristã, a cultivar o espírito de penitência e a cumprir os atos respectivos, a fim de implorarem, dia após dia, a graça de Deus» (João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio,  84: AAS 74 (1982) 185).

A ABERTURA À FECUNDIDADE

1652. «Pela sua própria natureza, a instituição matrimonial e o amor conjugal estão ordenados à procriação e à educação dos filhos, que constituem o ponto alto da sua missão e a sua coroa». (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1068).

«Os filhos são, sem dúvida, o mais excelente dom do Matrimónio e contribuem muitíssimo para o bem dos próprios pais. O mesmo Deus que disse: "não é bom que o homem esteja só" (Gn. 2, 18) e que "desde o princípio fez o homem varão e mulher" (Mt. 19, 4), querendo comunicar-lhe uma participação especial na sua obra criadora, abençoou o homem e a mulher dizendo: "sede fecundos e multiplicai-vos" (Gn. 1, 28). Por isso, o culto autêntico do amor conjugal e toda a vida familiar que dele nasce, sem pôr de lado os outros fins do Matrimónio, tendem a que os esposos, com fortaleza de ânimo, estejam dispostos a colaborar com o amor do Criador e do Salvador, que, por meio deles, aumenta continuamente e enriquece a sua família» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 50: AAS 58 (1966) 1070-1071).

1653 A fecundidade do amor conjugal estende-se aos frutos da vida moral, espiritual e sobrenatural que os pais transmitem aos filhos pela educação. Os pais são os principais e primeiros educadores dos seus filhos (II Concílio do Vaticano, Decl. Gravissimum educationis, 3: AAS 58 (1966) 731). Neste sentido, a missão fundamental do Matrimónio e da família é estar ao serviço da vida (Cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 28: AAS 74(1982) 114).

1654. Os esposos a quem Deus não concedeu a graça de ter filhos podem, no entanto, ter uma vida conjugal cheia de sentido, humana e cristãmente falando. O seu Matrimónio irradiar uma fecundidade de caridade, de acolhimento e de sacrifício.

VI. A Igreja doméstica

1655. Cristo quis nascer e crescer no seio da Sagrada Família de José e de Maria. A Igreja outra coisa não é senão a «família de Deus». Desde as suas origens, o núcleo aglutinante da Igreja era, muitas vezes, constituído por aqueles que, «com toda a sua casa, se tinham tornado crentes» (Cf At. 18, 8). Quando se convertiam, desejavam que também «toda a sua casa» fosse salva (Cf. At. 16, 31; 11, 14). Estas famílias, que passaram a ser crentes, eram pequenas ilhas de vida cristã no meio dum mundo descrente.

1656. Nos nossos dias, num mundo muitas vezes estranho e até hostil à fé, as famílias crentes são de primordial importância, como focos de fé viva e irradiante. É por isso que o II Concílio do Vaticano chama à família, segundo uma antiga expressão, «Ecclesia doméstica - Igreja doméstica» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 16; cf. João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 21: AAS 74 (1982) 105). É no seio da família que os pais são, «pela palavra e pelo exemplo [...], os primeiros arautos da fé para os seus filhos, ao serviço da vocação própria de cada um e muito especialmente da vocação consagrada» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 16).

1657. É aqui que se exerce, de modo privilegiado, o sacerdócio batismal do pai de família, da mãe, dos filhos, de todos os membros da família, «na recepção dos sacramentos, na oração e ação de graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade efetiva» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium,10: AAS 57 (1965) 15). O lar é, assim, a primeira escola de vida cristã e «uma escola de enriquecimento humano» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 52: AAS 58 (1966) 1073). É aqui que se aprende a tenacidade e a alegria no trabalho, o amor fraterno, o perdão generoso e sempre renovado, e, sobretudo, o culto divino, pela oração e pelo oferecimento da própria vida.

1658. Não podem esquecer-se, também, certas pessoas que estão, em virtude das condições concretas em que têm de viver, muitas vezes sem assim o terem querido, particularmente próximas do coração de Cristo, e que merecem, portanto, a estima e a solicitude atenta da Igreja, particularmente dos pastores: o grande número de pessoas celibatárias. Muitas delas ficam sem família humana, frequentemente devido a condições de pobreza. Algumas vivem a sua situação no espírito das bem-aventuranças, servindo a Deus e ao próximo de modo exemplar. Mas a todas é necessário abrir as portas dos lares, «igrejas domésticas», e da grande família que é a Igreja. «Ninguém se sinta privado de família neste mundo: a Igreja é casa e família para todos, especialmente para quantos estão "cansados e oprimidos"» (Mt. 11, 28) (João Paulo II, Ex. ap. Familiaris consortio, 85: AAS 74 (1982) 187).

Resumindo:

1659. São Paulo diz: «maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja [...] É grande este mistério, que eu refiro a Cristo e à Igreja» (Ef. 5, 25.32).

1660. A aliança matrimonial, pela qual um homem e uma mulher constituem entre si uma comunidade íntima de vida e de amor; foi fundada e dotada das suas leis próprias pelo Criador: Pela sua natureza, ordena-se ao bem dos cônjuges, bem como à procriação e educação dos filhos. Entre os batizados, foi elevada por Cristo Senhor à dignidade de sacramento (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1067-1068; CIC can. 1055, § 1).

1661. O sacramento do Matrimónio significa a união de Cristo com a Igreja. Confere aos esposos a graça de se amarem com o amor com que Cristo amou a sua Igreja; a graça do sacramento aperfeiçoa assim o amor humano dos esposos, dá firmeza à sua unidade indissolúvel e santifica-os no caminho da vida eterna (Cf. Concílio de Trento, Sess. 24ª. Doctrina de sacramento Matrimonii: DS 1799).

1662. O Matrimónio assenta no consentimento dos contraentes, quer dizer; na vontade de se darem mútua e definitivamente, com o fim de viverem uma aliança de amor fiel e fecundo.

1663. Uma vez que o Matrimónio estabelece os cônjuges num estado público de vida na Igreja, é conveniente que a sua celebração seja pública, integrada numa celebração litúrgica, perante o sacerdote (ou testemunha qualificada da Igreja), as testemunhas e a assembleia dos fiéis.

1664. A unidade, a indissolubilidade e a abertura à fecundidade são essenciais ao Matrimónio. A poligamia é incompatível com a unidade do Matrimónio; o divórcio separa o que Deus uniu; a recusa da fecundidade desvia a vida conjugal do seu «dom mais excelente», o filho (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 50: AAS 58 (1966) 1070).

1665. O novo casamento dos divorciados, em vida do cônjuge legítimo, é contrário ao desígnio e à Lei de Deus ensinados por Cristo. Eles não ficam separados da Igreja, mas não têm acesso à comunhão eucarística. Viverão a sua vida cristã sobretudo educando os filhos na fé.

1666. O lar cristão é o lugar onde os filhos recebem o primeiro anúncio da fé. É por isso que a casa de família se chama, com razão, «Igreja doméstica», comunidade de graça e de oração, escola de virtudes humanas e de caridade cristã. 

continua na parte 6

 O Terço (Rosário) dos Homens não exige nada e não cobra nada da vida pessoal dos seus participantes, o que faz com que seus membros se sintam livres, e a liberdade dá ao homem o poder de ser aquilo que ele deseja ser, daí as transformações se sucederem de modo espontâneo causado pelo contato que os mesmos passam a ter com Deus por intercessão de Maria.