A Intermediação de Maria Mãe dos Homens
para nos levar ao Cordeiro de Deus

'O ROSÁRIO É A VIDA DE CRISTO CONTEMPLADA COM O OLHAR DE MARIA'
"
Maria é aquela que nos acompanha na escuridão da noite até o clarear do novo dia”

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                                                   Criado em 30 de março de 2005

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86 ANOS DE GRAÇAS E BÊNÇÃOS no Brasil e no mundo

Catecismo da Igreja - Parte 4

PÁGINA INICIAL

PARÁGRAFO 6

MARIA – MÃE DE CRISTO
MÃE DA IGREJA

963. Depois de termos falado do papel da Virgem Maria no mistério de Cristo e do Espírito, é conveniente considerarmos agora o seu lugar no mistério da Igreja. «Efetivamente, a Virgem Maria [...] é reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deus e do Redentor [...]. Ao mesmo tempo, porém, é verdadeiramente "Mãe dos membros (de Cristo) [...], porque cooperou com o seu amor para que na Igreja nascessem os fiéis, membros daquela Cabeça"» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 53: AAS 57 (1965) 57-58: cf. Santo Agostinho, De sancta virginitate 6, 6: CSEL 41, 240 (PL 40, 399)). «Maria, [...] Mãe de Cristo e Mãe da Igreja» (Paulo VI, Allocutio ad Conciliares Patres, tertia exata Oecumenicae Synodi Sessione (21 de novembro de 1964): AAS 56 (1964) 1015).

I. A maternidade de Maria em relação à Igreja

INTEIRAMENTE UNIDA A SEU FILHO...

964. O papel de Maria em relação à Igreja é inseparável da sua união com Cristo e decorre dela diretamente. «Esta associação de Maria com o Filho na obra da salvação, manifesta-se desde a concepção virginal de Cristo até à sua morte» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 57: AAS 57 (1965) 61). Mas é particularmente manifesta na hora da sua paixão:

- «a Bem-aventurada Virgem avançou na peregrinação de fé, e manteve fielmente a sua união como Filho até à Cruz, junto da qual esteve de pé, não sem um desígnio divino; padeceu acerbamente com o seu Filho único e associou-se com coração de mãe ao seu sacrifício, consentindo amorosamente na imolação da vítima que d'Ela nascera; e, por fim, foi dada por mãe ao discípulo pelo próprio Jesus Cristo, agonizante na Cruz, com estas palavras: "Mulher, eis aí o teu filho"» (Jo. 19, 26-27) (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 58: AAS 57 (1965) 61-62).

965. Depois da Ascensão do seu Filho, Maria «assistiu com suas orações aos começos da Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 69: AAS 57 (1965) 66). E, reunida com os Apóstolos e algumas mulheres, vemos «Maria implorando com as suas orações o dom daquele Espírito, que já na Anunciação a cobrira com a Sua sombra» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 58: AAS 57 (1965) 61-62).

... TAMBÉM NA SUA ASSUNÇÃO...

966. «Finalmente, a Virgem Imaculada, preservada imune de toda a mancha da culpa original, terminado o curso da vida terrena, foi elevada ao céu em corpo e alma e exaltada pelo Senhor como Rainha, para assim se conformar mais plenamente com o seu Filho, Senhor dos senhores e vencedor do pecado e da morte»
(II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 69: AAS 57 (1965) 66). A Assunção da santíssima Virgem é uma singular participação na ressurreição do seu Filho e uma antecipação da ressurreição dos outros cristãos: (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 59: AAS 57 (1965) 62: cf. Pio XII, Const. ap. Munificentissimus Deus (1 novembro de 1950): DS 3903)

- «no teu parto guardaste a virgindade e na tua dormição não abandonaste a mundo, ó Mãe de Deus: alcançaste a fonte da vida. Tu que concebeste o Deus vivo e que, pelas tuas orações, hás de livrar as nossas almas da morte» (Liturgia bizantina, Tropário para a festa da Dormição da bem-aventurada Virgem Maria: Horológion tò mega (Romae 1876) p. 215).

... ELA É NOSSA MÃE NA ORDEM DA GRAÇA

967. Pela sua plena adesão à vontade do Pai, à obra redentora do Filho e a todas as moções do Espírito Santo, a Virgem Maria é para a Igreja o modelo da fé e da caridade. Por isso, ela é «membro eminente e inteiramente singular da Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 53: AAS 57 (1965) 59) e constitui mesmo «a realização exemplar», o typus, da Igreja (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 63: AAS 57 (1965) 64).

968. Mas o seu papel em relação à Igreja e a toda a humanidade vai ainda mais longe. Ela «cooperou de modo inteiramente singular, com a sua fé, a sua esperança e a sua ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É, por essa razão, nossa Mãe, na ordem da graça» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 61: AAS 57 (1965) 63).

969. «Esta maternidade de Maria na economia da graça perdura sem interrupção, desde o consentimento, que fielmente deu na anunciação e que manteve inabalável junto da Cruz, até à consumação perpétua de todos os eleitos. De fato, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão salvadora, mas, com a sua multiforme intercessão, continua a alcançar-nos os dons da salvação eterna [...]. Por isso, a Virgem é invocada na Igreja com os títulos de advogada, auxiliadora, socorro e medianeira» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 62: AAS 57 (1965) 63).

970. «Mas a função maternal de Maria para com os homens, de modo algum ofusca ou diminui a mediação única de Cristo, mas antes manifesta a sua eficácia. Com efeito, todo o influxo salutar da Virgem santíssima [...] deriva da abundância dos méritos de Cristo, funda-se na sua mediação e dela depende inteiramente, haurindo aí toda a sua eficácia» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 60: AAS 57 (1965) 62). «Efetivamente, nenhuma criatura pode ser equiparada ao Verbo Encarnado e Redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de diversos modos pelos ministros e pelo povo fiel, e assim como a bondade de Deus, sendo uma só, se difunde variamente pelos seres criados, assim também a mediação única do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas, uma cooperação variada, que participa dessa fonte única» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 62: AAS 57 (1965) 63).

II. O culto à Santíssima Virgem

971. «Todas as gerações me hão de proclamar ditosa» (Lc. 1, 48): «a piedade da Igreja para com a santíssima Virgem pertence à própria natureza do culto cristão» (Paulo VI, Ex. Ap. Marialis cultus, 56: AAS 66 (1974) 162). A santíssima Virgem «é com razão venerada pela Igreja com um culto especial. E, na verdade, a santíssima Virgem é, desde os tempos mais antigos, honrada com o título de "Mãe de Deus", e sob a sua proteção se acolhem os fiéis implorando-a em todos os perigos e necessidades [...]. Este culto [...], embora inteiramente singular, difere essencialmente do culto de adoração que se presta por igual ao Verbo Encarnado, ao Pai e ao Espírito Santo, e favorece-o poderosamente» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 66: AAS 57 (1965) 65). Encontra a sua expressão nas festas litúrgicas dedicadas à Mãe de Deus (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 103: AAS 56 (1964) 125) e na oração mariana, como o santo Rosário, «resumo de todo o Evangelho» (Paulo VI, Ex. Ap. Marialis cultus, 42: AAS 66 (1974) 152-153).

III. Maria - ícone escatológico da Igreja

972. Depois de termos falado da Igreja, da sua origem, missão e destino, não poderíamos terminar melhor do que voltando a olhar para Maria, a fim de contemplar nela o que a Igreja é no seu mistério, na sua «peregrinação da fé», e o que será na pátria ao terminar a sua caminhada, onde a espera, na «glória da santíssima e indivisa Trindade» e «na comunhão de todos os santos» (
II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 69: AAS 57 (1965) 66-67), Aquela que a mesma Igreja venera como Mãe do seu Senhor e como sua própria Mãe:

- «assim como, glorificada já em corpo e alma, a Mãe de Jesus é imagem e início da igreja que se há de consumar no século futuro, assim também, brilha na terra como sinal de esperança segura e de consolação, para o povo de Deus ainda peregrino» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 68: AAS 57 (1965) 66).

Resumindo:

973. Ao pronunciar o «Fiat» da Anunciação e dando o seu consentimento ao mistério da Encarnação, Maria colabora desde logo com toda a obra a realizar por seu Filho. Ela é Mãe, onde quer que Ele seja Salvador e Cabeça do Corpo Místico.

974. Terminado o curso da sua vida terrena, a santíssima Virgem Maria foi elevada em corpo e alma para a glória do céu, onde participa já na glória da ressurreição do seu Filho, antecipando a ressurreição de todos os membros do Seu Corpo.

975. «Nós cremos que a santíssima Mãe de Deus, a nova Eva, a Mãe da Igreja, continua a desempenhar no céu o seu papel maternal para com os membros de Cristo» (Paulo VI, Sollemnis Professio fidei, 15: AAS 60 (1968) 439).

ARTIGO 10

«CREIO NA REMISSÃO DOS PECADOS»

976. O Símbolo dos Apóstolos liga a fé no perdão dos pecados à fé no Espírito Santo, mas também à fé na Igreja e na comunhão dos santos. Foi ao dar o Espírito Santo aos Apóstolos que Cristo o ressuscitado transmitiu o seu próprio poder divino de perdoar os pecados: «recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos» (Jo. 20, 22-23).

(A segunda parte do Catecismo tratará expressamente do perdão dos pecados por meio do Batismo, do sacramento da Penitência e dos outros sacramentos, sobretudo da Eucaristia. Por isso, basta evocar aqui brevemente alguns dados fundamentais).

I. Um só Batismo para a remissão dos pecados

977. Nosso Senhor ligou o perdão dos pecados à fé e ao Batismo: «ide por todo o mundo e proclamai a Boa-Nova a todas as criaturas. Quem acreditar e for batizado será salvo» (Mc. 16, 15-16). O Batismo é o primeiro e principal sacramento do perdão dos pecados, porque nos une a Cristo, que morreu pelos nossos pecados e ressuscitou para a nossa justificação (Cf. Rm. 4, 25), a fim de que «também nós vivamos numa vida nova» (Rm. 6, 4).

978. «No momento em que fazemos a nossa primeira profissão de fé, ao receber o santo Batismo que nos purifica, o perdão que recebemos é tão pleno e total que não fica absolutamente nada por apagar, quer da falta original, quer das faltas cometidas de própria vontade por ação ou omissão; nem qualquer pena a suportar para as expiar [...]. Mas apesar disso, a graça do Batismo não isenta ninguém de nenhuma das enfermidades da natureza. Pelo contrário, resta-nos ainda combater os movimentos da concupiscência, que não cessam de nos arrastar para o mal» (Cat Rom 1, 11, 3, P.123).

979. Neste combate contra a inclinação para o mal, quem seria suficientemente forte e vigilante para evitar todas as feridas do pecado? «Portanto, se era necessário que a Igreja tivesse o poder de perdoar os pecados, era também necessário que o Batismo não fosse para ela o único meio de se servir destas chaves do Reino dos céus que tinha recebido de Jesus Cristo; era necessário que fosse capaz de perdoar as faltas a todos os penitentes que tivessem pecado, até mesmo ao último dia da sua vida» (Cat Rom1, 11, 4, p. 123).

980. É pelo sacramento da Penitência que o batizado pode ser reconciliado com Deus e com a Igreja:

- «os Santos Padres tiveram razão quando chamaram à Penitência um "batismo laborioso" (São Gregório de Nazianzo, Oratio 39, 17: SC 358, 188 (PG 36, 356)). Este sacramento da Penitência é necessário para a salvação daqueles que caíram depois do Batismo, tal como o próprio Batismo o é para os que ainda não foram regenerados» (Concílio de Trento, Sess. 14ª, Doctrina de sacramento Paenitentiae, c. 2: DS 1672).

II. O poder das chaves

981. Depois da ressurreição, Cristo enviou os seus Apóstolos «a anunciar a todos os povos o arrependimento em seu nome, com vista à remissão dos pecados» (Lc. 24, 47). Este «ministério da reconciliação» (2ª Cor. 5, 18), não o cumprem os Apóstolos e os seus sucessores somente anunciando aos homens o perdão de Deus que nos foi merecido por Jesus Cristo, e chamando-os à conversão e à fé; mas também comunicando-lhes a remissão dos pecados pelo Batismo e reconciliando-os com Deus e com a Igreja, graças ao poder das chaves recebido de Cristo:

- a Igreja «recebeu as chaves do Reino dos céus, para que nela se faça a remissão dos pecados pelo Sangue de Cristo e a ação do Espírito Santo. É nesta Igreja que a alma, morta pelos pecados, recupera a vida para viver com Cristo, cuja graça nos salvou» (Santo Agostinho, Sermão 214, 11: ed. P. Verbraken: Revue Bénédictine 72 (1962) 21 (PL 38, 1071-1072)).

982. Não há nenhuma falta, por mais grave que seja, que a santa Igreja não possa perdoar. «Nem há pessoa, por muito má e culpável que seja, a quem não deva ser proposta a esperança certa do perdão, desde que se arrependa verdadeiramente dos seus erros» (Cat Rom 1, 11, 5, p. 124). Cristo, que morreu por todos os homens, quer que na sua Igreja as portas do perdão estejam sempre abertas a todo aquele que se afastar do pecado (Cf. Mt. 18, 21-22).

983. A catequese deve esforçar-se por despertar e alimentar, entre os fiéis, a fé na grandeza incomparável do dom que Cristo ressuscitado fez à sua Igreja: a missão e o poder de verdadeiramente perdoar os pecados, pelo ministério dos Apóstolos e seus sucessores:

- «o Senhor quer que os seus discípulos tenham um poder imenso: Ele quer que os seus pobres servidores façam, em seu nome, tudo quanto Ele fazia quando vivia na terra» (Santo Ambrósio, De Paenitentia 1, 8, 34: CSEL 73, 135-136 (PL 16, 476-477)).

- «os sacerdotes receberam um poder que Deus não deu nem aos anjos nem aos arcanjos. [...] Deus sanciona lá em cima tudo o que os sacerdotes fazem cá em baixo» (São João Cristóstomo, De sacerdotio 3, 5: SC 272, 148 (PG 48, 643)).

- «se na Igreja não houvesse a remissão dos pecados, nada havia a esperar, não existiria qualquer esperança duma vida eterna, duma libertação eterna. Dêmos graças a Deus, que deu à sua Igreja um tal dom» (Santo Agostinho, Sermão 213, 8, 8: ed. G. Morin, Sancti Augustini sermones post Maurinos reperti [Guelferbytanus 1, 9] (Romae 1930) p. 448 (PL 38, 1064)).

Resumindo:

984. O Credo relaciona «o perdão dos pecados» com a profissão de fé no Espírito Santo. De fato, Cristo ressuscitado confiou aos Apóstolos o poder de perdoar os pecados, quando lhes deu o Espírito Santo.

985. O Batismo é o primeiro e principal sacramento para o perdão dos pecados: une-nos a Cristo morto e ressuscitado e dá-nos o Espírito Santo.

 986. Por vontade de Cristo, a Igreja possui o poder de perdoar os pecados dos batizados e exerce-o através dos Bispos e dos Presbíteros, de modo habitual no sacramento da Penitência.

987. «Na remissão dos pecados, os sacerdotes e os sacramentos são instrumentos mediante os quais nosso Senhor Jesus Cristo, único autor e dispensador da salvação, nos concede a remissão dos pecados e a graça da justificação» (Cat Rom1, 11, 6, p. 124-125).

ARTIGO 11

«CREIO NA RESSURREIÇÃO DA CARNE»

988. O Credo cristão - profissão da nossa fé em Deus Pai, Filho e Espírito Santo, e na sua ação criadora, salvadora e santificadora - culmina na proclamação da ressurreição dos mortos no fim dos tempos, e na vida eterna.

989. Nós cremos e esperamos firmemente que, tal como Cristo ressuscitou verdadeiramente dos mortos e vive para sempre, assim também os justos, depois da morte, viverão para sempre com Cristo ressuscitado, e que Ele os ressuscitará no último dia (Cf. Jo. 6, 39-40). Tal como a d'Ele, também a nossa ressurreição será obra da Santíssima Trindade:

- «se o Espírito d'Aquele que ressuscitou Jesus de entre os mortos habita em vós, Ele, que ressuscitou Cristo Jesus de entre os mortos, também dará vida aos vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que habita em vós» (Rm. 8, 11) (Cf. 1ª Ts 4, 14; 1ª Cor 6, 14; 2ª Cor 4, 14; Fl. 3, 10-11).

990. A palavra «carne» designa o homem na sua condição de fraqueza e mortalidade (Cf. Gn. 6, 3: Sl. 56, 5: Is. 40, 6). «Ressurreição da carne» significa que, depois da morte, não haverá somente a vida da alma imortal, mas também os nossos «corpos mortais» (Rm. 8, 11) retomarão a vida.

991. Crer na ressurreição dos mortos foi, desde o princípio, um elemento essencial da fé cristã. «A ressurreição dos mortos é a fé dos cristãos: é por crer nela que somos cristãos» (Tertuliano, De resurrectione mortuorum 1, 1: CCL 2, 921 (PL 2, 841)):

- «como é que alguns de entre vós dizem que não há ressurreição dos mortos? Se não há ressurreição dos mortos, também Cristo não ressuscitou. Mas se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã é também a vossa fé. [...] Mas não! Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram» (1ª Cor. 15, 12-14, 20).

I. A ressurreição de Cristo e a nossa ressurreição

REVELAÇÃO PROGRESSIVA DA RESSURREIÇÃO

992. A ressurreição dos mortos foi revelada progressivamente por Deus ao seu povo. A confiança na ressurreição corporal dos mortos impôs-se como consequência intrínseca da fé num Deus criador do homem todo, alma e corpo. O Criador do céu e da terra é também aquele que mantém fielmente a sua aliança com Abraão e a sua descendência. É nesta dupla perspectiva que começará a exprimir-se a fé na ressurreição. Nas suas provações, os mártires Macabeus confessam:

- «o Rei do universo ressuscitar-nos-á para uma vida eterna, a nós que morremos pelas suas leis» (2º Mac. 7, 9). «É preferível morrermos às mãos dos homens e termos a confiança em Deus de que havemos de ser ressuscitados por Ele» (2º Mac. 7, 14) (Cf. 2º Mac. 7, 29: Dn. 12, 1-13).

993. Os fariseus (Cf. At. 23, 6) e muitos contemporâneos do Senhor (Cf. Jo 11, 24) esperavam a ressurreição. Jesus ensina-a firmemente. E aos saduceus, que a negavam, responde: «não andareis vós enganados, ignorando as Escrituras e o poder de Deus»? (Mc. 12, 24). A fé na ressurreição assenta na fé em Deus, que «não é um Deus de mortos, mas de vivos» (Mc. 12, 27).

994. Mas há mais: Jesus liga a fé na ressurreição à sua própria pessoa: «Eu sou a Ressurreição e a Vida» (Jo. 11, 25). É o próprio Jesus que, no último dia, há de ressuscitar os que n'Ele tiverem acreditado (Cf. Jo. 5, 24-25: 6, 40), comido o seu Corpo e bebido o seu Sangue (Cf. Jo. 6, 54). Desde logo, Ele dá um sinal disto mesmo e uma garantia, restituindo a vida a alguns mortos (Cf. Mc. 5, 21-43: Lc. 7, 11-17: Jo. 11) e preanunciando assim a sua própria ressurreição que, no entanto, será de ordem diferente. Jesus fala deste acontecimento único como do «sinal de Jonas» (Cf. Mt. 12, 39), do sinal do templo (Cf. Jo. 2, 19-22); Ele anuncia a sua ressurreição ao terceiro dia depois da morte (Cf. Mc. 10, 34).

995. Ser testemunha de Cristo é ser «testemunha da sua ressurreição» (At. 1, 22)
(Cf. At. 4, 33), é «ter comido e bebido com Ele depois da sua ressurreição dos mortos» (At. 10, 41). A confiança cristã na ressurreição é toda marcada pelos encontros com Cristo ressuscitado. Nós ressuscitaremos como Ele, com Ele e por Ele.

996. Desde o princípio, a fé cristã na ressurreição deparou com incompreensões e oposições (Cf. At. 17, 32: 1ª Cor. 15, 12-13). «Não há ponto em que a fé cristã encontre mais contradição do que o da ressurreição da carne» (Santo Agostinho, Enarratio Psalmum 88, 2. 5: CCL 39, 1237 (PL 37, 1134)). É bastante comum a aceitação de que, depois da morte, a vida da pessoa humana continua de modo espiritual. Mas como acreditar que este corpo, tão manifestamente mortal, possa ressuscitar para a vida eterna?

COMO É QUE OS MORTOS RESSUSCITAM?

997. O que é ressuscitar? Na morte, separação da alma e do corpo, o corpo do homem cai na corrupção, enquanto a sua alma vai ao encontro de Deus, embora ficando à espera de se reunir ao seu corpo glorificado. Deus, na sua omnipotência, restituirá definitivamente a vida incorruptível aos nossos corpos, unindo-os às nossas almas pela virtude da ressurreição de Jesus.

998. Quem ressuscitará? Todos os homens que tiverem morrido: «os que tiverem praticado o bem, para uma ressurreição de vida e os que tiverem praticado o mal, para uma ressurreição de condenação» (Jo. 5, 29) (Cf. Dn. 12, 2).

999. Como? Cristo ressuscitou com o seu próprio corpo: «vede as minhas mãos e os meus pés: sou Eu mesmo» (Lc. 24, 39); mas não regressou a uma vida terrena. De igual modo, n'Ele «todos ressuscitarão com o seu próprio corpo, com o corpo que agora têm» (IV Concílio de Trento, c. 1. De fide catholica: DS 801), mas esse corpo será «transformado em corpo glorioso» (Cf. Fl. 3, 21) em «corpo espiritual» (1ª Cor. 15, 44):

- «alguém poderia perguntar: "como ressuscitam os mortos? Com que espécie de corpo voltam eles"? Insensato! O que tu semeias não volta à vida sem morrer. E o que semeias não é o corpo que há de vir, é um simples grão [...]. O que é semeado sujeito à corrupção ressuscita incorruptível; [...] os mortos ressuscitarão incorruptíveis [...]. É, de fato, necessário que este ser corruptível se revista de incorruptibilidade, que este ser mortal se revista de imortalidade» (1ª Cor, 15, 35-37. 42. 52-53).

1000. Este «como» ultrapassa a nossa imaginação e o nosso entendimento; só na fé se torna acessível. Mas a nossa participação na Eucaristia dá-nos já um antegozo da transfiguração do nosso corpo, operada por Cristo:

- «assim como, depois de ter recebido a invocação de Deus, o pão que vem da terra deixa de ser pão ordinário e é Eucaristia, constituída por duas coisas, uma terrena, outra celeste, do mesmo modo os nossos corpos, que participam na Eucaristia, já não são corruptíveis, pois têm a confiança da ressurreição» (Santo Ireneu de Lião, Adversus Haereses 4, 18, 5: SC 100, 610-612 (PG 7, 1028-1029)).

1001. Quando? Definitivamente o «no último dia» (Jo. 6, 39-40.44.54; 11, 24), «no fim do mundo» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 54). Com efeito, a ressurreição dos mortos está intimamente associada à Parusia de Cristo:

- «ao sinal dado, à voz do arcanjo e ao som da trombeta divina, o próprio Senhor descerá do céu e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro» (1ª Ts. 4, 16).

RESSUSCITADOS COM CRISTO

1002. Se é verdade que Cristo nos há de ressuscitar «no último dia», também é verdade que, de certo modo, nós já ressuscitamos com Cristo. De fato, graças ao Espírito Santo, a vida cristã é desde já, na terra, uma participação na morte e ressurreição de Cristo:

- «pelo Batismo fostes sepultados com Cristo e também ressuscitastes com Ele, devido à fé que tivestes na força de Deus, que O ressuscitou dos mortos [...]. Uma vez que ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do Alto, onde Cristo Se encontra sentado à direita de Deus» (Cl. 2, 12; 3, 1).

1003. Unidos a Cristo pelo Batismo, os crentes participam já realmente na vida celeste de Cristo ressuscitado (Cf. Fl. 3, 20). Mas esta vida continua «escondida com Cristo em Deus» (Cl. 3, 3). «Ele próprio nos ressuscitou e nos fez sentar nos céus, em Cristo Jesus» (Ef. 2, 6). Alimentados pelo seu Corpo na Eucaristia, nós pertencemos já ao Corpo de Cristo. Quando ressuscitarmos no último dia, havemos também de nos «manifestar com Ele na glória» (Cl. 3, 4).

1004. À espera desse dia, o corpo e a alma do crente participam já na dignidade de ser «em Cristo». Daí a exigência do respeito para com o próprio corpo e também para com o corpo de outrem, particularmente quando sofre:

- «o corpo [...] é para o Senhor. E o Senhor é para o corpo. E Deus, que ressuscitou o Senhor, também nos há de ressuscitar a nós pelo seu poder. Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo? [...] Não sabeis que não pertenceis a vós próprios? [...]. Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo» (1ª Cor. 6, 13-15. 19-20).

II. Morrer em Cristo Jesus

1005. Para ressuscitar com Cristo, temos de morrer com Cristo, temos «de nos exilar do corpo para habitarmos junto do Senhor» (2ª Cor. 5, 8). Nesta «partida» (Cf. Fl. 1, 23) que é a morte, a alma é separada do corpo. Voltará a juntar-se-lhe no dia da ressurreição dos mortos (Cf. Paulo VI, Sollemnis Professio fidei, 28: AAS 60 (1968) 444).

A MORTE

1006. «É em face da morte que o enigma da condição humana mais se adensa» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 18: AAS 58 (1966) 1038). Num certo sentido, a morte do corpo é natural: mas sabemos pela fé que a morte é, de fato, «salário do pecado» (Rm. 6, 23) (Cf. Gn. 2, 17). E para aqueles que morrem na graça de Cristo, é uma participação na morte do Senhor, a fim de poder participar na sua ressurreição (Cf. Rm. 6, 3-9: Fl. 3, 10-11).

1007. A morte é o termo da vida terrena. As nossas vidas são medidas pelo tempo no decurso do qual nós mudamos e envelhecemos. E como acontece com todos os seres vivos da terra, a morte surge como o fim normal da vida. Este aspecto da morte confere uma urgência às nossas vidas: a lembrança da nossa condição de mortais também serve para nos lembrar de que temos um tempo limitado para realizar a nossa vida:

- «lembra-te do teu Criador nos dias da mocidade [...], antes que o pó regresse à terra, donde veio, e o espírito volte para Deus que o concedeu» (Ecl. 12, 1.7).

1008. A morte é consequência do pecado. Intérprete autêntico das afirmações da Sagrada Escritura (Cf. Gn. 2, 17; 3, 3.19; Sb. 1, 13; Rm. 5, 12; 6, 23) e da Tradição, o Magistério da Igreja ensina que a morte entrou no mundo por causa do pecado do homem (Cf. Concílio de Trento, Sess. 5ª. Decr. de peccato originali, can 1: DS 1511). Embora o homem possuísse uma natureza mortal. Deus destinava-o a não morrer. A morte foi, portanto, contrária aos desígnios de Deus Criador e entrou no mundo como consequência do pecado (Cf. Sb. 2, 23-24). «A morte corporal, de que o homem estaria isento se não tivesse pecado» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 18: AAS 58 (1966) 1038), é, pois, «o último inimigo» (1ª Cor. 15, 26) do homem a ter de ser vencido.

1009. A morte é transformada por Cristo. Jesus, Filho de Deus, também sofreu a morte, própria da condição humana. Mas apesar da repugnância que sentiu perante ela (Cf. Mc. 14, 33-34: Heb. 5, 7-8), assumiu-a num ato de submissão total e livre à vontade do Pai. A obediência de Jesus transformou em bênção a maldição da morte (Cf. Rm. 5, 19-21).

O SENTIDO DA MORTE CRISTÃ

1010. Graças a Cristo, a morte cristã tem um sentido positivo. «Para mim, viver é Cristo e morrer é lucro» (Fl. 1, 21). «É digna de fé esta palavra: se tivermos morrido com Cristo, também com Ele viveremos» (2ª Tm. 2, 11). A novidade essencial da morte cristã está nisto: pelo Batismo, o cristão já «morreu com Cristo» sacramentalmente para viver uma vida nova; se morremos na graça de Cristo, a morte física consuma este «morrer com Cristo» e completa assim a nossa incorporação n'Ele, no seu ato redentor:

- «é bom para mim morrer em (eis) Cristo Jesus, mais do que reinar dum extremo ao outro da terra. É a Ele que eu procuro, Ele que morreu por nós: é a Ele que eu quero, Ele que ressuscitou para nós. Estou prestes a nascer [...]. Deixai-me receber a luz pura: quando lá tiver chegado, serei um homem» (Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Romanos 6, 1-2: Sc: l0bis, 114 (Funk 1, 258-260)).

1011. Na morte, Deus chama o homem a Si. É por isso que o cristão pode experimentar, em relação à morte, um desejo semelhante ao de São Paulo: «desejaria partir e estar com Cristo» (Fl. 1, 23). E pode transformar a sua própria morte num ato de obediência e amor para com o Pai, a exemplo de Cristo (Cf. Lc. 23, 46):

- «o meu desejo terreno foi crucificado: [...] há em mim uma água viva que dentro de mim murmura e diz: "vem para o Pai"» (Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Romanos 7, 2: Sc 10bis, 116 (Funk 1, 260)).

«Ansiosa por ver-te, desejo morrer»
(Santa Teresa de Jesus, Poesía, 7: Biblioteca Mística Carmelitana, v. 6 (Burgos 1919) p. 86. [Santa Teresa de Ávila, Seta de Fogo (Lisboa, Assírio & Alvim 1989) p. 31]).
«Eu não morro, entro na vida»
(Santa Teresa do Menino Jesus, Lettre (9 de junho de 1897): Correspondance Générale, v. 2 (Paris 1973) p. 1015. [Santa Teresa do Menino Jesus e d Santa Face, Obras Completas (Paço de Arcos, Edições do Carmelo 1996) p. 622]).

1012. A visão cristã da morte (Cf. 1ª Ts. 4, 13-14) é expressa de modo privilegiado na liturgia da Igreja:

- «para os que creem em Vós, Senhor, a vida não acaba, apenas se transforma: e, desfeita a morada deste exílio terrestre, adquirimos no céu uma habitação eterna» (Prefácio dos Defuntos I: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 439 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 509]).

1013. A morte é o fim da peregrinação terrena do homem, do tempo de graça e misericórdia que Deus lhe oferece para realizar a sua vida terrena segundo o plano divino e para decidir o seu destino último. Quando acabar «a nossa vida sobre a terra, que é só uma» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 54), não voltaremos a outras vidas terrenas. «Os homens morrem uma só vez» (Heb. 9, 27). Não existe «reencarnação» depois da morte.

1014. A Igreja exorta-nos a prepararmo-nos para a hora da nossa morte («duma morte repentina e imprevista, livrai-nos, Senhor»: antiga Ladainha dos Santos), a pedirmos à Mãe de Deus que rogue por nós «na hora da nossa morte» (Oração da Ave-Maria) e a confiarmo-nos a S. José, padroeiro da boa morte:

- «em todos os teus atos em todos os teus pensamentos, havias de te comportar como se devesses morrer hoje. Se tivesses boa consciência, não terias grande receio da morte. Mais vale acautelares-te do pecado do que fugir da morte. Se hoje não estás preparado, como o estarás amanhã»? (Imitação de Cristo 1, 23, 5-8: ed. T. Lupo (Città del Vaticano 1982) p. 70).

«Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa irmã a morte corporal, à qual nenhum homem vivo pode escapar. Ai daqueles que morrem em pecado mortal: Bem-aventurados os que ela encontrar a cumprir as tuas santíssimas vontades, porque a segunda morte não lhes fará mal» (São Francisco de Assis, Cântico das criaturas: Opuscula sancti Patris Francisci Assisiensis, ed. C. Esser (Grottaferrata 1978) p. 85-86. [Cf. Fontes Franciscanas, I (Braga, Editorial Franciscana, 1994) p. 781).

Resumindo:

1015. «Caro salutis est cardo - A carne é o fulcro da salvação» (Tertuliano, De resurrectione mortuorum 8, 2: CCL 2, 931 (PL 2, 852)). Nós cremos em Deus, que é o Criador da carne; cremos no Verbo que se fez carne para remir a carne; cremos na ressurreição da carne, acabamento da criação e da redenção da carne.

1016. Pela morte, a alma é separada do corpo; mas, na ressurreição, Deus restituirá a vida incorruptível ao nosso corpo transformado, reunindo-o à nossa alma. Tal como Cristo ressuscitou e vive para sempre, todos nós ressuscitaremos no último dia.

1017. «Nós cremos na verdadeira ressurreição desta carne que possuímos agora» (II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 854. C). No entanto, semeia-se no túmulo um corpo corruptível e ressuscita um corpo incorruptível (Cf. 1ª Cor, 15, 42) um «corpo espiritual» (1ª Cor. 15, 44).

1018. Em consequência do pecado original, o homem deve sofrer a morte corporal, «de que estaria isento, se não tivesse pecado» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 18: AAS 58 (1966) 1038).

1019. Jesus, Filho de Deus, sofreu livremente a morte por nós, numa submissão total e livre à vontade de Deus seu Pai. Pela sua morte, Ele venceu a morte, abrindo assim a todos os homens a possibilidade da salvação.

ARTIGO 12

«CREIO NA VIDA ETERNA»

1020. O cristão, que une a sua própria morte à de Jesus, encara a morte como chegada até junto d'Ele, como entrada na vida eterna. A Igreja, depois de, pela última vez, ter pronunciado sobre o cristão moribundo as palavras de perdão da absolvição de Cristo e de, pela última vez, o ter marcado com uma unção fortificante e lhe ter dado Cristo, no Viático, como alimento para a viagem, fala-lhe com estas doces e confiantes palavras:

«parte deste mundo, alma cristã, em nome de Deus Pai omnipotente, que te criou, em nome de Jesus Cristo, Filho de Deus vivo, que por ti sofreu, em nome do Espírito Santo, que sobre ti desceu; chegues hoje ao lugar da paz e a tua morada seja no céu, junto de Deus, na companhia da Virgem Maria. Mãe de Deus, de São José e de todos os Anjos e Santos de Deus [...]. Confio-te ao Criador para que voltes aquele que te formou do pó da terra. Venham ao encontro de ti, que estás a partir desta vida, Santa Maria, os Anjos e todos os Santos [...]. Vejas o teu Redentor face a face e gozes da contemplação de Deus pelos séculos dos séculos» (Ordo Unctionis infirmorum eorumque pastoralis curae. Orto commendationis morientium. 146-147, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1972) p. 60-61 [em port.: Unção e Pastoral dos Doentes. Encomendação dos moribundos. 146-147, segunda edição típica (Coimbra, Gráfica de Coimbra — Conferência Episcopal Portuguesa, 1994) p. 1091).

I. O juízo particular

1021. A morte põe termo à vida do homem, enquanto tempo aberto à aceitação ou à rejeição da graça divina, manifestada em Jesus Cristo (Cf. 2ª Tm. 1, 9-10). O Novo Testamento fala do juízo, principalmente na perspectiva do encontro final com Cristo na sua segunda vinda. Mas também afirma, reiteradamente, a retribuição imediata depois da morte de cada qual, em função das suas obras e da sua fé. A parábola do pobre Lázaro (Cf. Lc. 16, 22) e a palavra de Cristo crucificado ao bom ladrão (Cf. Lc. 23, 43), assim como outros textos do Novo Testamento (Cf. 2ª Cor. 5, 5: Fl. 1, 23; Heb. 9, 27: 12, 23), falam dum destino final da alma (Cf. Mt. 16, 26), o qual pode ser diferente para umas e para outras.

1022. Ao morrer, cada homem recebe na sua alma imortal a retribuição eterna, num juízo particular que põe a sua vida em referência a Cristo, quer através duma purificação (Cf. II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 856: Concílio de Florença,  Decr. pro Graecis: DS 1304: Concílio de Trento, Sess. 25ª,  Decretum de purgatorio: DS 1820), quer para entrar imediatamente na felicidade do céu (Cf. II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 857; João XXII, Buda Ne super his: DS 991; Bento XII, Const. Benedictus Deus: DS 1000-1001; Concílio de Florença, Decr. pro Graecis: DS 1305), quer para se condenar imediatamente para sempre (Cf.  II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 858; Bento XII, Const. Benedictus Deus: DS 1002; Concílio de Florença, Decr. pro Graecis: DS 1306).

«Ao entardecer desta vida, examinar-te-ão no amor» (São João da Cruz, Avisos y sentencias. 57: Biblioteca Mística Carmelitana, N. 13 (Burgos 1931), p. 238. [S. João da Cruz, Ditos de luz, e amor. 57: Obras Completas (Paço de Arcos, Edições Carmelo 1986) P. 1015]).

II. O céu

1023. Os que morrerem na graça e na amizade de Deus e estiverem perfeitamente purificados, viverão para sempre com Cristo. Serão para sempre semelhantes a Deus, porque O verão «tal como Ele é» (1ª Jo. 3, 2), «face a face» (1ª Cor. 13, 12) (Cf. Ap. 22, 4):

«Com a nossa autoridade apostólica, definimos que, por geral disposição divina, as almas de todos os santos mortos antes da paixão de Cristo [...] e as de todos os outros fiéis que morreram depois de terem recebido o santo Batismo de Cristo e nas quais nada havia a purificar no momento da morte, ou ainda daqueles que, se no momento da morte houve ou ainda há qualquer coisa a purificar, acabaram por o fazer [...] mesmo antes de ressuscitarem em seus corpos e do Juízo universal - e isto depois da Ascensão ao céu do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo -, estiveram, estão e estarão no céu, associadas ao Reino dos céus e no paraíso celeste, com Cristo, na companhia dos santos anjos. E depois da paixão e morte de nosso Senhor Jesus Cristo, essas almas viram e veem a essência divina com uma visão intuitiva e face a face, sem a mediação de qualquer criatura» (Bento XII. Const. Benedictus Deus: DS 1000; cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 49 AAS 57 (1965) 54).

1024. Esta vida perfeita com a Santíssima Trindade, esta comunhão de vida e de amor com Ela, com a Virgem Maria, com os anjos e todos os bem-aventurados, chama-se «céu». O céu é o fim último e a realização das aspirações mais profundas do homem, o estado de felicidade suprema e definitiva.

1025. Viver no céu é «estar com Cristo» (Cf. Jo. 14, 3; Fl. 1, 23: 1ª Ts. 4, 17). Os eleitos vivem «n'Ele»; mas n'Ele conservam, ou melhor, encontram a sua verdadeira identidade, o seu nome próprio (Cf. Ap. 2, 17):

- «porque a vida consiste em estar com Cristo, onde está Cristo, aí está a vida, aí está o Reino» (Santo Ambrósio, Expositio evangelii secundum Lucam 10, 121: CCL, 14, 379 (PL 15-1927)).

1026. Pela sua morte e ressurreição, Jesus Cristo «abriu-nos» o céu. A vida dos bem-aventurados consiste na posse em plenitude dos frutos da redenção operada por Cristo, que associa à sua glorificação celeste aqueles que n'Ele acreditaram e permaneceram fiéis à sua vontade. O céu é a comunidade bem-aventurada de todos os que estão perfeitamente incorporados n'Ele.

1027. Este mistério de comunhão bem-aventurada com Deus e com todos os que estão em Cristo ultrapassa toda a compreensão e toda a representação. A Sagrada Escritura fala-nos dele por imagens: vida, luz, paz, banquete de núpcias, vinho do Reino, casa do Pai, Jerusalém celeste, paraíso: aquilo que «nem os olhos viram, nem os ouvidos escutaram, nem jamais passou pelo pensamento do homem, Deus o preparou para aqueles que O amam» (1ª Cor. 2, 9).

1028. Em virtude da sua transcendência, Deus não pode ser visto tal como é, senão quando Ele próprio abrir o seu mistério à contemplação imediata do homem e lhe der capacidade para O contemplar. Esta contemplação de Deus na sua glória celeste é chamada pela Igreja «visão beatífica»:

«Qual não será a tua glória e a tua felicidade quando fores admitido a ver a Deus, a ter a honra de participar nas alegrias da salvação e da luz eterna, na companhia de Cristo Senhor teu Deus, [...] gozar no Reino dos céus, na companhia dos justos e dos amigos de Deus, das alegrias da imortalidade alcançada!» (São Cipriano de Cartago, Epistula 58, 10: CSEL 3/2, (1996): 665; 58.10.1: CCL 3C, 333-334 (56, 10: PL 4, 367-368)).

1029. Na glória do céu, os bem-aventurados continuam a cumprir com alegria a vontade de Deus, em relação aos outros homens e a toda a criação. Eles já reinam com Cristo. Com Ele «reinarão pelos séculos dos séculos» (Ap. 22, 5) (Cf. Mt. 25, 21.23).

III. A purificação final ou Purgatório

1030. Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não de todo purificados, embora seguros da sua salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria do céu.

1031. A Igreja chama Purgatório a esta purificação final dos eleitos, que é absolutamente distinta do castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da fé relativamente ao Purgatório sobretudo nos concílios de Florença (Cf. Conc. de Florença, Decr. pro Graecis: DS 1304) e de Trento (Cf. Concílio de Trento, Sess. 25ª, Decretum de purgatorio: DS 1820: Sess. 6ª. Decr. de iustificatione, canon 30: DS 1580). A Tradição da Igreja, referindo-se a certos textos da Escritura (Por exemplo, 1ª Cor. 3, 15: 1ª Pe. 1, 7) fala dum fogo purificador:

«pelo que diz respeito a certas faltas leves, deve crer-se que existe, antes do julgamento, um fogo purificador, conforme afirma Aquele que é a verdade, quando diz que, se alguém proferir uma blasfémia contra o Espírito Santo, isso não lhe será perdoado nem neste século nem no século futuro (Mt. 12, 32). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas neste mundo e outras no mundo que há de vir» (São Gregório Magno, Dialogi 4, 41, 3: SC 265, 148 (4, 39: PL 77, 396)).

1032. Esta doutrina apoia-se também na prática da oração pelos defuntos, de que já fala a Sagrada Escritura: «por isso, [Judas Macabeu] pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres das suas faltas» (2º Mac. 12, 46). Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos, oferecendo sufrágios em seu favor, particularmente o Sacrifício eucarístico para que, purificados, possam chegar à visão beatífica de Deus. A Igreja recomenda também a esmola, as indulgências e as obras de penitência a favor dos defuntos: (Cf. II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 856)

- «socorramo-los e façamos comemoração deles. Se os filhos de Job foram purificados pelo sacrifício do seu pai (Cf. Job. 1, 5) por que duvidar de que as nossas oferendas pelos defuntos lhes levam alguma consolação? [...] Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer por eles as nossas orações» (São João Crisóstomo, In epistulam I ad Corinthios homilia 41, 5: PG 61, 361).

IV. O Inferno

1033. Não podemos estar em união com Deus se não escolhermos livremente amá-Lo. Mas não podemos amar a Deus se pecarmos gravemente contra Ele, contra o nosso próximo ou contra nós mesmos: «quem não ama permanece na morte. Todo aquele que odeia o seu irmão é um homicida: ora vós sabeis que nenhum homicida tem em si a vida eterna» (1ª Jo. 3, 14-15). Nosso Senhor adverte-nos de que seremos separados d'Ele, se descurarmos as necessidades graves dos pobres e dos pequeninos seus irmãos (Cf. Mt. 25, 31-46). Morrer em pecado mortal sem arrependimento e sem dar acolhimento ao amor misericordioso de Deus, significa permanecer separado d'Ele para sempre, por nossa própria livre escolha. E é este estado de autoexclusão definitiva da comunhão com Deus e com os bem-aventurados que se designa pela palavra «Inferno».

1034. Jesus fala muitas vezes da «gehena» do «fogo que não se apaga» (Cf. Mt. 5, 22.29; 13, 42.50; Mc. 9, 43-48) reservada aos que recusam, até ao fim da vida, acreditar e converter-se, e na qual podem perder-se, ao mesmo tempo, a alma e o corpo (Cf. Mt. 10, 28). Jesus anuncia, em termos muitos severos, que «enviará os seus anjos que tirarão do seu Reino [...] todos os que praticaram a iniquidade, e hão de lançá-los na fornalha ardente» (Mt. 13, 41-42), e sobre eles pronunciará a sentença: «afastai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno» (Mt. 25, 41).

1035. A doutrina da Igreja afirma a existência do Inferno e a sua eternidade. As almas dos que morrem em estado de pecado mortal descem imediatamente, após a morte, aos infernos, onde sofrem as penas do Inferno, «o fogo eterno» (Cf. Symbolum Quicumque: DS 76; Synodus Constantinopolitana. q (em 543), Anathematismi contra Origenem, 7: DS 409; Ibid, 9: DS 411; IV Concílio de Latrão, Cap. I, De fide catholica: DS 801: II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 858; Bento XII, Const. Benedictus Deus: DS 1002; Concílio de Florença, Decr. pro Iacobitis: DS 1351: Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decr. de iustificatione, canon 25: DS 1575; Paulo VI. Sollemnis Professio fidei, 12: AAS 60 (1968) 438). A principal pena do inferno consiste na separação eterna de Deus, o único em Quem o homem pode ter a vida e a felicidade para que foi criado e a que aspira.

1036. As afirmações da Sagrada Escritura e os ensinamentos da Igreja a respeito do Inferno são um apelo ao sentido de responsabilidade com que o homem deve usar da sua liberdade, tendo em vista o destino eterno. Constituem, ao mesmo tempo, um apelo urgente à conversão: «entrai pela porta estreita, pois larga é a porta e espaçoso o caminho que levam à perdição e muitos são os que seguem por eles. Que estreita é a porta e apertado o caminho que levam à vida e como são poucos aqueles que os encontram»! (Mt. 7, 13-14):

«Como não sabemos o dia nem a hora, é preciso que, segundo a recomendação do Senhor, vigiemos continuamente, a fim de que, no termo da nossa vida terrena, que é só uma, mereçamos entrar com Ele para o banquete de núpcias e ser contados entre os benditos, e não sejamos lançados, como servos maus e preguiçosos, no fogo eterno, nas trevas exteriores, onde "haverá choro e ranger de dentes"» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 54).

1037. Deus não predestina ninguém para o Inferno (II Concílio de Orange, Conclusio: DS 397; Concílio de Trento, Sess. 6ª. Decr: de iustificatione, canon 17: DS 1567). Para ter semelhante destino, é preciso haver uma aversão voluntária a Deus (pecado mortal) e persistir nela até ao fim. Na liturgia eucarística e nas orações quotidianas dos seus fiéis, a Igreja implora a misericórdia de Deus, «que não quer que ninguém pereça, mas que todos se convertam» (2ª Pe. 3, 9):

«Aceitai benignamente, Senhor, a oblação que nós, vossos servos, com toda a vossa família, vos apresentamos. Daí a paz aos nossos dias livrai-nos da condenação eterna e contai-nos entre os vossos eleitos» (Oração Eucarística I ou Cânone Romano, 88: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 450 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 518]).

V. O Juízo final

1038. A ressurreição de todos os mortos, «justos e pecadores» (At. 24, 15), há de preceder o Juízo final. Será «a hora em que todos os que estão nos túmulos hão de ouvir a sua voz e sairão: os que tiverem praticado o bem, para uma ressurreição de vida, e os que tiverem praticado o mal, para uma ressurreição de condenação» (Jo. 5, 28-29). Então Cristo virá «na sua glória, com todos os seus anjos [...]. Todas as nações se reunirão na sua presença e Ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos; e colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. [...] Estes irão para o suplício eterno e os justos para a vida eterna» (Mt. 25, 31-33.46).

1039. É perante Cristo, que é a Verdade, que será definitivamente posta descoberto a verdade da relação de cada homem com Deus (Cf. Jo. 12, 48). O Juízo final revelará, até às suas últimas consequências, o que cada um tiver feito ou deixado de fazer de bem durante a sua vida terrena:

- «todo o mal que os maus fazem é registrado - e eles não o sabem. No dia em que "Deus virá e não se calará" (Sl. 50, 3) [...]. Então, Ele Se voltará para os da sua esquerda: "na terra, dir-lhes-á, Eu tinha posto para vós os meus pobrezinhos, Eu, Cabeça deles, estava no céu sentado à direita do Pai - mas na terra os meus membros tinham fome: o que vós tivésseis dado aos meus membros, teria chegado à Cabeça. Quando Eu coloquei os meus pobrezinhos na terra, constituí-os vossos portadores para trazerem as vossas boas obras ao meu tesouro. Vós nada depositastes nas mãos deles: por isso nada encontrais em Mim"» (Santo Agostinho, Sermão 18, 4, 4: CCL 41, 247-249 (PL 38, 130-131)).

1040. O Juízo final terá lugar quando acontecer a vinda gloriosa de Cristo. Só o Pai sabe o dia e a hora, só Ele decide sobre a sua vinda. Pelo seu Filho Jesus Cristo. Ele pronunciará então a sua palavra definitiva sobre toda a história. Nós ficaremos a saber o sentido último de toda a obra da criação e de toda a economia da salvação, e compreenderemos os caminhos admiráveis pelos quais a sua providência tudo terá conduzido para o seu fim último. O Juízo final revelará como a justiça de Deus triunfa de todas as injustiças cometidas pelas suas criaturas e como o seu amor é mais forte do que a morte (Cf. Ct. 8, 6).

1041. A mensagem do Juízo final é um apelo à conversão, enquanto Deus dá ainda aos homens «o tempo favorável, o tempo da salvação» (2ª Cor. 6, 2). Ela inspira o santo temor de Deus, empenha na justiça do Reino de Deus e anuncia a «feliz confiança» (Tt. 2, 13) do regresso do Senhor, que virá «para ser glorificado nos seus santos, e admirado em todos os que tiverem acreditado» (2ª Ts. 1, 10).

VI. A esperança dos novos céus e da nova terra

1042. No fim dos tempos, o Reino de Deus chegará à sua plenitude. Depois do Juízo final, os justos reinarão para sempre com Cristo, glorificados em corpo e alma, e o próprio universo será renovado:

Então a Igreja alcançará «na glória celeste, a sua realização acabada, quando vier o tempo da restauração de todas as coisas e, quando, juntamente com o género humano, também o universo inteiro, que ao homem está intimamente ligado e por ele atinge o seu fim, for perfeitamente restaurado em Cristo» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 53).

1043. A esta misteriosa renovação, que há de transformar a humanidade e o mundo, a Sagrada Escritura chama «os novos céus e a nova terra» (2ª Pe. 3, 13) (Cf. Ap. 21, 1). Será a realização definitiva do desígnio divino de «reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas que há nos céus e na terra» (Ef. 1, 10).

1044. Neste «mundo novo»
(Cf. Ap. 21, 5), a Jerusalém celeste, Deus terá a sua morada entre os homens. «Há de enxugar-lhes dos olhos todas as lágrimas; a morte deixará de existir, e não mais haverá luto, nem clamor, nem fadiga. Porque o que havia anteriormente desapareceu» (Ap. 21, 4) (Cf. Ap 21, 27).

1045. Para o homem, esta consumação será a realização final da unidade do género humano, querida por Deus desde a criação e da qual a Igreja peregrina era «como que o sacramento» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 1: AAS 57 (1965) 5). Os que estiverem unidos a Cristo formarão a comunidade dos resgatados, a «Cidade santa de Deus» (Ap. 21, 2), a «Esposa do Cordeiro» (Ap. 21, 9). Esta não mais será atingida pelo pecado, pelas manchas (Cf. Ap, 21, 27), pelo amor próprio, que destroem e ferem a comunidade terrena dos homens. A visão beatífica, em que Deus Se manifestará aos eleitos de modo inesgotável, será a fonte inexaurível da felicidade, da paz e da mútua comunhão.

1046. Quanto ao cosmos, a Revelação afirma a profunda comunidade de destino entre o mundo material e o homem:

- «Na verdade, as criaturas esperam ansiosamente a revelação dos filhos de Deus [...] com a esperança de que as mesmas criaturas sejam também libertadas da corrupção que escraviza [...]. Sabemos que toda a criatura geme ainda agora e sofre as dores da maternidade. E não só ela, mas também nós, que possuímos as primícias do Espírito, gememos interiormente, esperando a adoção filial e a libertação do nosso corpo» (Rm. 8, 19-23).

1047. Assim, pois, também o universo visível está destinado a ser transformado, «a fim de que o próprio mundo, restaurado no seu estado primitivo, esteja sem mais nenhum obstáculo ao serviço dos justos» (Santo Ireneu de Lião, Adversus Haereses 5, 32. 1: SC 153, 398 (PG 7, 1210)), participando na sua glorificação em Jesus Cristo ressuscitado.

1048. «Ignoramos o tempo em que a terra e a humanidade atingirão a sua plenitude, e também não sabemos como é que o universo será transformado. Porque a figura deste mundo, deformada pelo pecado, passa certamente, mas Deus ensina-nos que se prepara uma nova habitação e uma nova terra, na qual reinará a justiça e cuja felicidade satisfará e superará todos os desejos de paz que se levantam no coração dos homens» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 39: AAS 58 (1966) 1056-1057).

1049. «A expectativa da nova terra não deve, porém, enfraquecer, mas antes ativar a solicitude em ordem a desenvolver esta terra onde cresce o corpo da nova família humana, que já consegue apresentar uma certa prefiguração do mundo futuro. Por conseguinte, embora o progresso terreno se deva cuidadosamente distinguir do crescimento do Reino de Cristo, todavia, na medida em que pode contribuir para a melhor organização da sociedade humana, interessa muito ao Reino de Deus» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 39: AAS 58 (1966) 1057).

1050. «Pois todos os bens da dignidade humana, da comunhão fraterna e da liberdade, ou seja, todos os frutos excelentes da natureza e do nosso esforço, depois de os termos propagado pela terra, no Espírito do Senhor e segundo o seu mandato, voltaremos de novo a encontrá-los, mas então purificados de qualquer mancha, iluminados e transfigurados, quando Cristo entregar ao Pai o Reino eterno e universal» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 39: AAS 58 (1966) 1057: cf. Const. dogm. Lumen Gentium, 2: AAS 57 (1965) 5-6). Então, Deus será «tudo em todos» (1ª Cor. 15, 28), na vida eterna:

- «a vida subsistente e verdadeira é o Pai que, pelo Filho e no Espírito Santo, derrama sobre todos sem excepção os dons celestes. Graças à sua misericórdia, também nós, homens, recebemos a promessa indefectível da vida eterna» (São Cirilo de Jerusalém, Catecheses illuminandorum 18, 29: Opera. v. 2. ed. J. Rupp  (Monaci 1870) p. 332 (PG 33, 1049)).

Resumindo:

1051. Ao morrer: cada homem recebe, na sua alma imortal, a sua retribuição eterna, num juízo particular feito por Cristo, Juiz dos vivos e dos mortos.

1052. «Nós cremos que as almas de todos os que morrem na graça de Cristo [...] constituem o povo de Deus no além da morte, a qual será definitivamente destinada no dia da ressurreição, quando estas almas forem reunidas aos seus corpos» (Paulo VI, Sollemnis Professio fidei, 28: AAS 60 (1968) 444).

1053. «Nós cremos que a multidão dessas almas que estão congregadas à volta de Jesus e de Maria, no paraíso, formam a Igreja celeste onde, na eterna bem-aventurança, veem Deus como Ele é onde também, certamente em graus e modos diversos, estão associadas aos santos anjos no governo divino exercido por Cristo glorioso, intercedendo por nós e ajudando a nossa fraqueza com a sua solicitude fraterna» (Paulo VI, Sollemnis Professio fidei, 29: AAS 60 (1968) 444).

1054. Os que morrem na graça e amizade de Deus, mas imperfeitamente purificados, embora seguros da sua salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria de Deus.

1055. Em virtude da «comunhão dos santos», a Igreja encomenda os defuntos à misericórdia de Deus e oferece em seu favor sufrágios, em particular o santo Sacrifício eucarístico.

1056. Seguindo o exemplo de Cristo, a Igreja adverte os fiéis da «triste e lamentável realidade da morte eterna» (Cf. Sagrada Congregação do Clero, Directorium catechisticum generale, 69: AAS 64 (1972) 141), também chamada «Inferno».

1057. A pena principal do Inferno consiste na separação eterna de Deus, o único em Quem o homem pode encontrar a vida e a felicidade para que foi criado e às quais aspira.

1058. A Igreja ora para que ninguém se perca: «Senhor [...], não permitais que eu me separe de Vós» (Oração antes da Comunhão, 132: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 474 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 546]). Sendo verdade que ninguém se pode salvar a si mesmo, também é verdade que «Deus quer que todos se salvem» (1ª Tm. 2, 4) e que a Ele «tudo é possível» (Mt. 19, 26).

1059. «A santa Igreja Romana crê e firmemente confessa que, no dia do Juízo, todos os homens hão de comparecer com o seu próprio corpo perante o tribunal de Cristo, para prestar contas dos seus próprios atos» (II Concílio de Lião, Professio fidei Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 859: cf. Concílio de Trento, Sess. 6ª, Decretum de iustificatione, c. 16: DS 1549).

1060. No fim dos tempos, o Reino de Deus chegará à sua plenitude. Então, os justos reinarão com Cristo para sempre, glorificados em corpo e alma; o próprio universo material será transformado. Deus será, então, «tudo em todos» (1ª Cor. 15, 28), na vida eterna.

«AMEN»

1061. O Credo, tal como o último livro da Sagrada Escritura (Cf. Ap. 22, 21) termina com a palavra hebraica Amém, palavra que se encontra com frequência no final das orações do Novo Testamento. Do mesmo modo, a Igreja termina com um «Amém» as suas orações.

1062. Em hebraico, Amém está ligado à mesma raiz que a palavra «crer», raiz que exprime solidez, confiança, fidelidade. Assim se compreende porque é que o «Amém» se pode dizer tanto da fidelidade de Deus para conosco como da nossa confiança n'Ele.

1063. No profeta Isaías encontramos a expressão «Deus de verdade», literalmente «Deus do Amém», quer dizer, o Deus fiel às suas promessas: «todo aquele que desejar ser abençoado sobre a terra deve desejar sê-lo pelo Deus fiel (do «Amém») (Is. 65, 16). Nosso Senhor emprega frequentemente a palavra «Amém» (Cf. Mt. 6, 2.5.16), por vezes sob forma redobrada (Cf. Jo. 5, 19), para sublinhar a confiança que deve inspirar a sua doutrina, a sua autoridade fundada na verdade de Deus.

1064. O «Amém» final do Credo retoma e confirma, portanto, a palavra com que começa: «Creio». Crer é dizer «Amém» às palavras, às promessas, aos mandamentos de Deus; é fiar-se totalmente n'Aquele que é o «Amém» de infinito amor e perfeita fidelidade. A vida cristã de cada dia será, então, o «Amém» ao «Creio» da profissão de fé do nosso Batismo:

- «Que o teu Símbolo seja para ti como um espelho. Revê-te nele, para ver se crês tudo quanto dizes crer. E alegra-te todos os dias na tua fé» (Santo Agostinho, Sermão 58, 11, 13: PL 38, 399).

1065. O próprio Jesus Cristo é o «Amém» (Ap. 3, 14). É o Amém definitivo do amor do Pai para conosco: assume e leva a bom termo o nosso «Amém» ao Pai: «é que todas as promessas de Deus encontram n'Ele um «sim»! Desse modo, por seu intermédio, nós dizemos «Ámen» a Deus, a fim de lhe darmos glória» (2ª Cor. 1, 20):

«Por Cristo, com Cristo, em Cristo,
a Vós, Deus Pai todo-poderoso,
na unidade do Espírito Santo,
toda a honra e toda a glória
agora e para sempre.
ÁMEN»
(Doxologia final da oração eucarística: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 455, 460, 464 e 471 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, p. 522, 528, 535, 543, etc.]).

SEGUNDA PARTE - A CELEBRAÇÃO DO MISTÉRIO CRISTÃO

A CELEBRAÇÃO DO MISTÉRIO CRISTÃO

INTRODUÇÃO

PORQUÊ A LITURGIA?

1066. No Símbolo da Fé, a Igreja confessa o mistério da Santíssima Trindade e o seu «desígnio admirável» (Ef. 1, 9) sobre toda a criação: o Pai realiza o «mistério da sua vontade», dando o seu Filho muito amado e o seu Espírito Santo para a salvação do mundo e para a glória do seu nome. Tal é o mistério de Cristo (Cf. Ef. 3, 4), revelado e realizado na história segundo um plano, uma «disposição» sabiamente ordenada, a que São Paulo chama «a economia do mistério» (Ef. 3, 9) e a que a tradição patrística chamará «a economia do Verbo encarnado» ou «economia da salvação».

1067. «Esta obra da redenção humana e da glorificação perfeita de Deus, cujo prelúdio foram as magníficas obras divinas operadas no povo do Antigo Testamento, realizou-a Cristo Senhor, principalmente pelo mistério pascal da sua bem-aventurada paixão, Ressurreição dos mortos e gloriosa ascensão, em que, "morrendo, destruiu a morte e ressuscitando restaurou a vida". Efetivamente, foi do lado de Cristo adormecido na cruz que nasceu "o sacramento admirável de toda a Igreja"» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 5: AAS 56 (1964) 99). É por isso que, na liturgia, a Igreja celebra principalmente o mistério pascal, pelo qual Cristo realizou a obra da nossa salvação.

1068. É este mistério de Cristo que a Igreja proclama e celebra na sua liturgia, para que os fiéis dele vivam e dele deem testemunho no mundo.

- «A liturgia, com efeito, pela qual, sobretudo no sacrifício eucarístico, "se atua a obra da nossa redenção", contribui em sumo grau para que os fiéis exprimam na vida e manifestem aos outros o mistério de Cristo e a autêntica natureza da verdadeira Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 2: AAS 56 (1964) 97-98).

QUAL O SIGNIFICADO DA PALAVRA LITURGIA?

1069. Originariamente, a palavra «liturgia» significa «obra pública», «serviço por parte dele em favor do povo». Na tradição cristã, quer dizer que o povo de Deus toma parte na «obra de Deus» (Cf. Jo. 17, 4). Pela liturgia, Cristo, nosso Redentor e Sumo-Sacerdote (Cf. At 13, 2: Lc 1, 23), continua na sua Igreja, com ela e por ela, a obra da nossa redenção.

1070. No Novo Testamento, a palavra «liturgia» é empregada para designar, não somente a celebração do culto divino, mas também o anúncio do Evangelho (Cf. Rm. 15, 16; Fl. 2, 14-17.30) e a caridade em ato (Cf. Rm. 15, 27; 2ª Cor. 9, 12; Fl. 2, 25). Em todas estas situações, trata-se do serviço de Deus e dos homens. Na celebração litúrgica, a Igreja é serva, à imagem do seu Senhor, o único «Liturgo» (Cf. Heb. 8, 2.6), participando no seu sacerdócio (culto) profético (anúncio) e real (serviço da caridade):

- «com razão se considera a liturgia como o exercício da função sacerdotal de Jesus Cristo. Nela, mediante sinais sensíveis e no modo próprio de cada qual, significa-se e realiza-se a santificação dos homens e é exercido o culto público integral pelo corpo Místico de Jesus Cristo, isto é, pela cabeça e pelos membros. Portanto, qualquer celebração litúrgica, enquanto obra de Cristo Sacerdote e do seu corpo que é a Igreja, é ação sagrada por excelência e nenhuma outra ação da Igreja a iguala em eficácia com o mesmo título e no mesmo grau» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 7: AAS 56 (1964) 101).

A LITURGIA COMO FONTE DE VIDA

1071. Obra de Cristo, a Liturgia é também uma ação da sua Igreja. Ela realiza e manifesta a Igreja como sinal visível da comunhão de Deus e dos homens por Cristo; empenha os fiéis na vida nova da comunidade, e implica uma participação «consciente, ativa e frutuosa» de todos (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 11: AAS 56 (1964) 103).

1072. «A liturgia não esgota toda a ação da Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 9: AAS 56 (1964) 101). Deve ser precedida pela evangelização, pela fé e pela conversão, e só então pode produzir os seus frutos na vida dos fiéis: a vida nova segundo o Espírito, o empenhamento na missão da Igreja e o serviço da sua unidade. (Cf. Ef. 3, 16-17)

ORAÇÃO E LITURGIA

1073. A liturgia é também participação na oração de Cristo, dirigida ao Pai no Espírito Santo. Nela, toda a oração cristã encontra a sua fonte e o seu termo. Pela liturgia, o homem interior lança raízes e alicerça-se no «grande amor com que o Pai nos amou» (Ef. 2, 4), em seu Filho bem-amado. É a mesma «maravilha de Deus» que é vivida e interiorizada por toda a oração, «em todo o tempo, no Espírito» (Ef 6, 18).

CATEQUESE E LITURGIA

1074. «A liturgia é simultaneamente o cume para o qual se encaminha a ação da Igreja e a fonte de onde dimana toda a sua força» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 10: AAS 56 (1964) 102). É, portanto, o lugar privilegiado da catequese do Povo de Deus. «A catequese está intrinsecamente ligada a toda a ação litúrgica e sacramental, pois é nos sacramentos, sobretudo na Eucaristia, que Jesus Cristo age em plenitude, em ordem à transformação dos homens» (João Paulo II, Ex. Ap. Catechesi tradendae, 23: AAS 71 (1979) 1296).

1075. A catequese litúrgica visa introduzir no mistério de Cristo (ela é «mistagogia»), partindo do visível para o invisível, do significante para o significado, dos «sacramentos» para os «mistérios». Tal catequese compete aos catecismos locais e regionais; o presente catecismo, que deseja colocar-se ao serviço de toda a Igreja na diversidade dos seus ritos e das suas culturas (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 3-4: AAS 56 (1964) 98) apresentará o que é fundamental e comum a toda a Igreja a respeito da liturgia, enquanto mistério e enquanto celebração (Primeira Secção), e depois, dos sete sacramentos e sacramentais (Segunda Secção).

SEGUNDA PARTE

A CELEBRAÇÃO
 DO MISTÉRIO CRISTÃO

PRIMEIRA SECÇÃO

A «ECONOMIA» SACRAMENTAL

1076. No dia do Pentecostes, pela efusão do Espírito Santo, a Igreja foi manifestada ao mundo (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 6: AAS 56 (1964) 100; Id, Const. dogm. Lumen Gentium, 2: AAS 57 (1965) 6). O dom do Espírito inaugura um tempo novo na «dispensação do mistério»: o tempo da Igreja, durante o qual Cristo manifesta, torna presente e comunica a sua obra de salvação pela liturgia da sua Igreja, «até que Ele venha» (1ª Cor. 11, 26). Durante este tempo da Igreja, Cristo vive e age, agora na sua Igreja e com ela, de um modo novo, próprio deste tempo novo. Age pelos sacramentos e é a isso que a Tradição comum do Oriente e do Ocidente chama «economia sacramental». Esta consiste na comunicação (ou «dispensação») dos frutos do mistério pascal de Cristo na celebração da liturgia «sacramental» da Igreja.

É por isso que importa, antes de mais, pôr em relevo está «dispensação sacramental» (Capítulo primeiro). Assim, aparecerão mais claramente a natureza e os aspectos essenciais da celebração litúrgica (Capítulo segundo).

CAPÍTULO PRIMEIRO

O MISTÉRIO PASCAL NO TEMPO DA IGREJA

 ARTIGO 1

A LITURGIA – OBRA DA SANTÍSSIMA TRINDADE

I. O Pai, fonte e fim da liturgia

1077. «Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, nos céus, nos encheu de toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. Foi assim que, n' Ele, nos escolheu antes da criação do mundo, para sermos, na caridade, santos e irrepreensíveis na sua presença. Destinou-nos de antemão a que nos tornássemos seus filhos adoptivos por Jesus Cristo. Assim aprouve à sua vontade, para que fosse enaltecida a glória da sua graça, com a qual nos favoreceu em seu Filho muito amado» (Ef. 1, 3-6).

1078. Abençoar é uma ação divina que dá a vida e de que o Pai é a fonte. A sua bênção é, ao mesmo tempo, palavra e dom («bene-dictio», «eu-logia»). Aplicada ao homem, tal palavra significará a adoração e a entrega ao seu Criador, em ação de graças.

1079. Desde o princípio até à consumação dos tempos, toda a obra de Deus é bênção. Desde o poema litúrgico da primeira criação até aos cânticos da Jerusalém celeste, os autores inspirados anunciam o desígnio da salvação como uma imensa bênção divina.

1080. Desde o princípio, Deus abençoa os seres vivos, especialmente o homem e a mulher. A aliança com Noé e todos os seres animados renova esta bênção de fecundidade, apesar do pecado do homem, pelo qual a terra fica «maldita». Mas é a partir de Abraão que a bênção divina penetra na história dos homens, que caminhava em direção à morte, para a fazer regressar à vida, à sua fonte: pela fé do «pai dos crentes» que acolhe a bênção, é inaugurada a história da salvação.

1081. As bênçãos divinas manifestam-se em acontecimentos maravilhosos e salvíficos: o nascimento de Isaac, a saída do Egito (Páscoa e Êxodo), o dom da terra prometida, a eleição de David, a presença de Deus no templo, o exílio purificador e o regresso do «pequeno resto». A Lei, os Profetas e os Salmos, que entretecem a liturgia do povo eleito, se por um lado recordam essas bênçãos divinas, por outro respondem-lhes com as bênçãos de louvor e ação de graças.

1082. Na liturgia da Igreja, a bênção divina é plenamente revelada e comunicada: o Pai é reconhecido e adorado como a Fonte e o Fim de todas as bênçãos da criação e da salvação; no seu Verbo - encarnado, morto e ressuscitado por nós -, Ele cumula-nos das suas bênçãos e, por Ele, derrama nos nossos corações o Dom que encerra todos os dons: o Espírito Santo.

1083. Compreende-se então a dupla dimensão da liturgia cristã, como resposta de fé e de amor às «bênçãos espirituais» com que o Pai nos gratifica. Por um lado, a Igreja, unida ao seu Senhor e «sob a ação do Espírito Santo» (Cf. Lc. 10, 21), bendiz o Pai «pelo seu Dom inefável» (2ª Cor. 9, 15), mediante a adoração, o louvor e a ação de graças. Por outro lado, e até à consumação do desígnio de Deus, a Igreja não cessa de oferecer ao Pai «a oblação dos seus próprios dons» e de Lhe implorar que envie o Espírito Santo sobre esta oblação, sobre si própria, sobre os fiéis e sobre o mundo inteiro, a fim de que, pela comunhão na morte e ressurreição de Cristo-Sacerdote e pelo poder do Espírito, estas bênçãos divinas produzam frutos de vida, «para que seja enaltecida a glória da sua graça» (Ef. 1, 6).

II. A ação de Cristo na liturgia

CRISTO GLORIFICADO...

1084. «Sentado à direita do Pai» e derramando o Espírito Santo sobre o seu corpo que é a Igreja, Cristo age agora pelos sacramentos, que instituiu para comunicar a sua graça. Os sacramentos são sinais sensíveis (palavras e ações), acessíveis à nossa humanidade atual. Realizam eficazmente a graça que significam, em virtude da ação de Cristo e pelo poder do Espírito Santo.

1085. Na liturgia da Igreja, Cristo significa e realiza principalmente o seu mistério pascal. Durante a sua vida terrena, Jesus anunciava pelo seu ensino e antecipava pelos seus atos o seu mistério pascal. Uma vez chegada a sua «Hora» (Cf. Jo. 13, 1; 17, 1), Jesus vive o único acontecimento da história que não passa jamais: morre, é sepultado, ressuscita de entre os mortos e senta-Se à direita do Pai «uma vez por todas» (Rm. 6, 10; Heb. 7, 27; 9, 12). É um acontecimento real, ocorrido na nossa história, mas único; todos os outros acontecimentos da história acontecem uma vez e passam, devorados pelo passado. Pelo contrário, o mistério pascal de Cristo não pode ficar somente no passado, já que pela sua morte, Ele destruiu a morte; e tudo o que Cristo é, tudo o que fez e sofreu por todos os homens, participa da eternidade divina, e assim transcende todos os tempos e em todos se torna presente. O acontecimento da cruz e da ressurreição permanece e atrai tudo para a vida.

... DESDE A IGREJA DOS APÓSTOLOS...

1086. «Assim como Cristo foi enviado pelo Pai, assim também Ele enviou os Apóstolos, cheios do Espírito Santo, não só para que, pregando o Evangelho a toda a criatura, anunciassem que o Filho de Deus, pela sua morte e ressurreição, nos libertara do poder de Satanás e da morte e nos introduzira no Reino do Pai, mas também para que realizassem a obra da salvação que anunciavam, mediante o Sacrifício e os sacramentos, à volta dos quais gira toda a vida litúrgica» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 6: AAS 56 (1964) 100).

1087. Deste modo, Cristo ressuscitado, ao dar o Espírito Santo aos Apóstolos, confia-lhes o seu poder de santificação: (Cf. Jo. 20, 21-23) eles tornam-se sinais sacramentais de Cristo. Pelo poder do mesmo Espírito Santo, eles confiam este poder aos seus sucessores. Esta «sucessão apostólica» estrutura toda a vida litúrgica da Igreja: ela própria é sacramental, transmitida pelo sacramento da Ordem.

... ESTÁ PRESENTE NA LITURGIA TERRESTRE...

1088. «Para realizar tão grande obra» - como é a dispensação ou comunicação da sua obra de salvação - «Cristo está sempre presente na sua igreja, sobretudo nas ações litúrgicas. Está presente no sacrifício da Missa, quer na pessoa do ministro - "o que se oferece agora pelo ministério sacerdotal é o mesmo que se ofereceu outrora na Cruz" - quer e sobretudo sob as espécies eucarísticas. Está presente com a sua virtude nos sacramentos, de modo que, quando alguém batiza, é o próprio Cristo que batiza. Está presente na sua Palavra, pois é Ele que fala ao ser lida na Igreja a Sagrada Escritura. Está presente, enfim, quando a Igreja reza e canta os salmos, Ele que prometeu: "onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, aí estou Eu, no meio deles"» (Mt. 18, 20) (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 7: AAS 56 (1964)100-101).

1089. «Em tão grande obra, pela qual Deus é perfeitamente glorificado e os homens santificados, Cristo associa sempre a Si a Igreja, sua amadíssima esposa, a qual invoca o seu Senhor e por meio d'Ele rende culto ao eterno Pai» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 7: AAS 56 (1964)101).

... QUE PARTICIPA NA LITURGIA CELESTE

1090. «Na liturgia da terra, participamos, saboreando-a de antemão, na liturgia celeste, celebrada na cidade santa de Jerusalém, para a qual nos dirigimos como peregrinos e onde Cristo está sentado à direita de Deus, como ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo; com todo o exército da milícia celestial, cantamos ao Senhor um hino de glória; venerando a memória dos santos, esperamos ter alguma parte e comunhão com eles; e aguardamos o Salvador, nosso Senhor Jesus Cristo, até que Ele apareça como nossa vida e também nós apareçamos com Ele na glória» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 7: AAS 56 (1964)101).

III. O Espírito Santo e a Igreja na liturgia

1091. Na liturgia, o Espírito Santo é o pedagogo da fé do povo de Deus, o artífice das «obras-primas de Deus» que são os sacramentos da Nova Aliança. O desejo e a obra do Espírito no coração da Igreja é que nós vivamos da vida de Cristo ressuscitado. Quando Ele encontra em nós a resposta da fé que suscitou, realiza-se uma verdadeira cooperação. E, por ela, a liturgia torna-se a obra comum do Espírito Santo e da Igreja.

1092. Nesta dispensação sacramental do mistério de Cristo, o Espírito Santo age do mesmo modo que nos outros tempos da economia da salvação: prepara a Igreja para o encontro com o seu Senhor; lembra e manifesta Cristo à fé da assembleia; torna presente e atualiza o mistério de Cristo pelo seu poder transformante; e finalmente, enquanto Espírito de comunhão, une a Igreja à vida e à missão de Cristo.

O ESPÍRITO SANTO PREPARA PARA ACOLHER CRISTO

1093. O Espírito Santo realiza, na economia sacramental, as figuras da Antiga Aliança. Uma vez que a Igreja de Cristo estava «admiravelmente preparada na história do povo de Israel e na Antiga Aliança» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 2: AAS 57 (1965) 6), a liturgia da Igreja conserva, como parte integrante e insubstituível, fazendo-os seus, elementos do culto dessa Antiga Aliança:

- principalmente a leitura do Antigo Testamento;
- a oração dos Salmos;
- e sobretudo, o memorial dos acontecimentos salvíficos e das realidades significativas, que encontraram o seu cumprimento no mistério de Cristo (a Promessa e a Aliança, o Êxodo e a Páscoa, o Reino e o Templo, o Exílio e o regresso).

1094. É com base nesta harmonia dos dois Testamentos (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Verbum, 14-16: AAS 58 (1966) 824-625) que se articula a catequese pascal do Senhor (Cf. Lc. 24, 13-49) e, depois, a dos Apóstolos e dos Padres da Igreja. Esta catequese desvenda o que estava oculto sob a letra do Antigo Testamento: o mistério de Cristo. É chamada «tipológica», porque revela a novidade de Cristo a partir das «figuras» (tipos) que a anunciavam nos fatos, palavras e símbolos da primeira Aliança. Por esta releitura no Espírito de verdade a partir de Cristo, as figuras são desvendadas (Cf. 2ª Cor. 3, 14-16). Assim, o dilúvio e a arca de Noé prefiguravam a salvação pelo Batismo (Cf. 1ª Pe. 3, 21), tal como a nuvem, a travessia do Mar Vermelho e a água do rochedo eram figura dos dons espirituais de Cristo (Cf. 1ª Cor. 10, 1-6); e o maná do deserto prefigurava a Eucaristia, «o verdadeiro Pão do céu» (Jo. 6, 48).

1095. É por isso que a Igreja, especialmente por ocasião dos tempos do Advento, da Quaresma e sobretudo na noite da Páscoa, relê e revive todos estes grandes acontecimentos da história da salvação no «hoje» da sua liturgia. Isso, porém, exige igualmente que a catequese ajude os fiéis a abrirem-se a esta inteligência «espiritual» da economia da salvação, tal como a liturgia da Igreja a manifesta e no-la faz viver.

1096. Liturgia judaica e liturgia cristã. Um melhor conhecimento da fé e da vida religiosa do povo judeu, tal como ainda agora são professadas e vividas, pode ajudar a compreender melhor certos aspectos da liturgia cristã. Para os judeus, tal como para os cristãos, a Sagrada Escritura é uma parte essencial das suas liturgias: para a proclamação da Palavra de Deus, a resposta a esta Palavra, a oração de louvor e de intercessão por vivos e mortos, o recurso à misericórdia divina. A liturgia da Palavra, na sua estrutura própria, encontra a sua origem na oração judaica. A Oração das Horas e outros textos e formulários litúrgicos têm nela os seus paralelos, assim como as próprias fórmulas das nossas orações mais veneráveis, como o Pai Nosso. As orações eucarísticas inspiram-se também em modelos de tradição judaica. A relação entre a liturgia judaica e a liturgia cristã, como igualmente a diferença dos respectivos conteúdos, são particularmente visíveis nas grandes festas do ano litúrgico, como a Páscoa. Tanto os cristãos como os judeus celebram a Páscoa: a Páscoa da história, virada para o futuro, entre os judeus: a Páscoa consumada na morte e ressurreição de Cristo, entre os cristãos - embora sempre na esperança da sua consumação definitiva.

1097. Na liturgia da Nova Aliança, toda a ação litúrgica, especialmente a celebração da Eucaristia e dos sacramentos, é um encontro entre Cristo e a Igreja. A assembleia litúrgica recebe a sua unidade da «comunhão do Espírito Santo», que reúne os filhos de Deus no único corpo de Cristo. Ultrapassa todas as afinidades humanas, raciais, culturais e sociais.

1098. A assembleia deve preparar-se para o encontro com o seu Senhor, ser «um povo bem disposto» (Cf. Lc. 1, 17). Esta preparação dos corações é obra comum do Espírito Santo e da assembleia, particularmente dos seus ministros. A graça do Espírito Santo procura despertar a fé, a conversão do coração e a adesão à vontade do Pai. Estas disposições pressupõem-se para receber outras graças oferecidas na própria celebração, e para os frutos de vida nova que ela é destinada a produzir em seguida.

O ESPÍRITO SANTO RECORDA O MISTÉRIO DE CRISTO

1099. O Espírito e a Igreja cooperam para manifestar Cristo e a sua obra de salvação na liturgia. Principalmente na Eucaristia, e analogicamente nos outros sacramentos, a liturgia é o memorial do mistério da salvação. O Espírito Santo é a memória viva da Igreja (Cf. Jo. 14, 26).

1100. A Palavra de Deus. O Espírito Santo lembra à assembleia litúrgica, em primeiro lugar, o sentido do acontecimento salvífico, dando vida à Palavra de Deus, que é anunciada para ser recebida e vivida:

- «é enorme a importância da Sagrada Escritura na celebração da liturgia. Porque é a ela que se vão buscar as leituras que se explicam na homilia e os salmos para cantar; com o seu espírito e da sua inspiração nasceram as preces, as orações e os hinos litúrgicos: dela tiram a sua capacidade de significação as ações e os sinais» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 24: AAS 56 (1964) 106-107).

1101. É o Espírito Santo que dá aos leitores e ouvintes, segundo a disposição dos seus corações, a inteligência espiritual da Palavra de Deus. Através das palavras, ações e símbolos, que formam a trama duma celebração, o Espírito Santo põe os fiéis e os ministros em relação viva com Cristo, Palavra e Imagem do Pai, de modo a poderem fazer passar para a sua vida o sentido daquilo que ouvem, veem e fazem na celebração.

1102. «É pela Palavra da salvação [...] que a fé é alimentada no coração dos fiéis; e é mercê da fé que tem início e se desenvolve a reunião dos fiéis» (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbiterorum ordinis, 4: AAS 58 (1966) 996). O anúncio da Palavra de Deus não se fica por um ensinamento: faz apelo à resposta da fé, enquanto assentimento e compromisso, em vista da aliança entre Deus e o seu povo. É ainda o Espírito Santo que dá a graça da fé, a fortifica e a faz crescer na comunidade. A assembleia litúrgica é, antes de mais, comunhão na fé.

1103. A anamnese. A celebração litúrgica refere-se sempre às intervenções salvíficas de Deus na história. «A economia da revelação realiza-se por meio de ações e palavras intimamente relacionadas entre si [...]; as palavras [...] declaram as obras e esclarecem o mistério nelas contido» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Verbum, 2: AAS 58 (1966) 818). Na liturgia da Palavra, o Espírito Santo «lembra» à assembleia tudo quanto Cristo fez por nós. Segundo a natureza das ações litúrgicas e as tradições rituais das Igrejas, uma celebração «faz memória» das maravilhas de Deus numa anamnese mais ou menos desenvolvida. O Espírito Santo, que assim desperta a memória da Igreja, suscita então a ação de graças e o louvor (doxologia).

O ESPÍRITO SANTO ATUALIZA O MISTÉRIO DE CRISTO

1104. A liturgia cristã não se limita a recordar os acontecimentos que nos salvaram: atualiza-os, torna-os presentes. O mistério pascal de Cristo celebra-se, não se repete; as celebrações é que se repetem. Mas em cada uma delas sobrevém a efusão do Espírito Santo, que atualiza o único mistério.

1105. A epiclese («invocação sobre») é a intercessão mediante a qual o sacerdote suplica ao Pai que envie o Espírito santificador para que as oferendas se tornem o corpo e o sangue de Cristo e para que, recebendo-as, os fiéis se tornem eles próprios uma oferenda viva para Deus.

1106 Juntamente com a anamnese, a epiclese é o coração de qualquer celebração sacramental, e mais particularmente da Eucaristia:

- «tu perguntas como é que o pão se torna corpo de Cristo, e o vinho [..] sangue de Cristo? Por mim, digo-te: o Espírito Santo irrompe e realiza isso que ultrapassa toda a palavra e todo o pensamento. [...] Baste-te ouvir que é pelo Espírito Santo, do mesmo modo que é da Santíssima Virgem e pelo Espírito Santo que o Senhor, por Si mesmo e em Si mesmo, assumiu a carne» (São João Damasceno, Expositio fidei, 86 [De fide orthodoxa, 4, 13]: PTS 12, 194-195 (PG 94, 1141.1145)).

1107. O poder transformante do Espírito Santo na liturgia apressa a vinda do Reino e a consumação do mistério da salvação. Na expectativa e na esperança. Ele faz-nos realmente antecipar a comunhão plena da Santíssima Trindade. Enviado pelo Pai, que atende a epiclese da Igreja, o Espírito dá a vida aos que O acolhem e constitui para eles, desde já, as «arras» da sua herança (Cf. Ef, 1, 14; 2ª Cor. 1, 22).

A COMUNHÃO DO ESPÍRITO SANTO

1108. A finalidade da missão do Espírito Santo em toda a ação litúrgica é pôr-nos em comunhão com Cristo, para formarmos o seu corpo. O Espírito Santo é como que a seiva da Videira do Pai, que dá fruto nos sarmentos (Cf. Jo. 15, 1-17; Gl. 5, 22). Na liturgia, realiza-se a mais íntima cooperação do Espírito Santo com a Igreja. Ele, Espírito de comunhão, permanece indefectivelmente na Igreja, e é por isso que a Igreja é o grande sacramento da comunhão divina que reúne os filhos de Deus dispersos. O fruto do Espírito na liturgia é, inseparavelmente, comunhão com a Santíssima Trindade e comunhão fraterna (Cf. 1ª Jo 1, 3-7).

1109. A epiclese é também oração pelo pleno efeito da comunhão da assembleia no mistério de Cristo. «A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo» (2ª Cor. 13, 13) devem estar sempre conosco e dar frutos, para além da celebração eucarística. Por isso, a Igreja pede ao Pai que envie o Espírito Santo, para que faça da vida dos fiéis uma oferenda viva para Deus pela transformação espiritual à imagem de Cristo, pela preocupação com a unidade da Igreja e pela participação na sua missão, mediante o testemunho e o serviço da caridade.

Resumindo:

1110. Na liturgia da Igreja, Deus Pai é bendito e adorado como fonte de todas as bênçãos da criação e da salvação, com que nos abençoou no seu Filho, para nos dar o Espírito da adopção filial.

1111. A obra de Cristo na liturgia é sacramental, porque o seu mistério de salvação torna-se ali presente pelo poder do seu Espírito Santo; porque o seu corpo, que é a Igreja, é como que o sacramento (sinal e instrumento) no qual o Espírito Santo dispensa o mistério da salvação; e porque, através das suas ações litúrgicas, a Igreja peregrina participa já, por antecipação, na liturgia do céu.

1112. A missão do Espírito Santo na liturgia da Igreja é preparar a assembleia para o encontro com Cristo, lembrar e manifestar Cristo à fé da assembleia, tornar presente e atualizar a obra salvífica de Cristo pelo seu poder transformante e fazer frutificar o dom da comunhão na Igreja.

ARTIGO 2

O MISTÉRIO PASCAL
NOS SACRAMENTOS DA IGREJA

1113. Toda a vida litúrgica da Igreja gravita em torno do sacrifício eucarístico e dos sacramentos (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 6: AAS 56 (1964) 100). Há na Igreja sete sacramentos: Batismo, Confirmação ou Crisma, Eucaristia, Penitência, Unção dos enfermos, Ordem e Matrimónio (Cf. II Concílio de Lião, Professio fidei. Michaelis Palaeologi imperatoris: DS 860; Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1310; Concílio de Trento, Sess. 7ª, Canones de sacramentis in genere, can 1: DS 160). Neste artigo, trata-se do que é comum aos sete sacramentos da Igreja, do ponto de vista doutrinal; o que lhes é comum sob o aspecto da celebração será exposto no capítulo II; e o que é próprio de cada um constituirá o objeto da secção II.

I. Os sacramentos de Cristo

1114. «Aderindo à doutrina da Sagrada Escritura, às tradições apostólicas [...] e ao sentir unânime dos santos Padres» (Concílio de Trento, Sess. 7ª, Decretum de sacramentis, Prooemium: DS 1600), nós professamos que os sacramentos da nova Lei [...] foram todos instituídos por nosso Senhor Jesus Cristo» (Concílio de Trento, Sess. 7ª, Canones de sacramentis in genere, can 1: DS 1601).

1115. As palavras e as ações de Jesus durante a sua vida ocultam e o seu ministério público já eram salvíficas. Antecipavam o poder do seu mistério pascal. Anunciavam e preparavam o que Ele ia dar à Igreja quando tudo estivesse cumprido. Os mistérios da vida de Cristo são os fundamentos do que, de ora em diante, pelos ministros da sua Igreja, Cristo dispensa nos sacramentos, porque «o que no nosso Salvador era visível, passou para os seus mistérios» (São Leão Magno, Sermão 74. 2: CCL 138A, 457 (PL 54, 398)).

1116. «Forças que saem» do corpo de Cristo (Cf. Lc. 5, 17; 6, 19; 8, 46), sempre vivo e vivificante: ações do Espírito Santo que opera no seu corpo que é a Igreja, os sacramentos são «as obras-primas de Deus», na nova e eterna Aliança.

II. Os sacramentos da Igreja

1117. Pelo Espírito que a conduz «para a verdade total» (Jo. 16, 13), a Igreja reconheceu, a pouco e pouco, este tesouro recebido de Cristo e foi-lhe precisando a «dispensação», tal como o fez relativamente ao cânon das Sagradas Escrituras e à doutrina da fé, enquanto fiel despenseira dos mistérios de Deus (Cf. Mt. 13, 52; 1ª Col. 4, 1). Assim, a Igreja discerniu, no decorrer dos séculos, que, entre as suas celebrações litúrgicas, há sete que são, no sentido próprio da palavra, sacramentos instituídos pelo Senhor.

1118. Os sacramentos são «da Igreja», no duplo sentido de que são «por ela» e «para ela». São «pela Igreja», porque ela é o sacramento da ação de Cristo que nela opera, graças à missão do Espírito Santo. E são «para a Igreja», são estes «sacramentos que fazem a Igreja» (Santo Agostinho, De civitate Dei 22, 17: CSEL 40/2, 625 (PL 41. 779); cf. São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 64, a. 2. ad 3; Ed. Leon. 12, 43), porque manifestam e comunicam aos homens, sobretudo na Eucaristia, o mistério da comunhão do Deus-Amor, um em três pessoas.

1119. Formando com Cristo-Cabeça «como que uma única pessoa mística» (Pio XII, Enc. Mystici corporis: AAS 35 (1943) 226), a Igreja age nos sacramentos como «comunidade sacerdotal», «organicamente estruturada» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15): pelo Batismo e pela Confirmação, o povo sacerdotal torna-se apto a celebrar a liturgia; e por outro lado, certos fiéis, «assinalados com a sagrada Ordem, ficam constituídos em nome de Cristo para apascentar a Igreja com a Palavra e a graça de Deus» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15).

1120. O ministério ordenado ou sacerdócio ministerial (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 14: AAS 57 (1965) 14) está ao serviço do sacerdócio batismal. Ele garante que, nos sacramentos, é de certeza Cristo que age pelo Espírito Santo em favor da Igreja. A missão de salvação, confiada pelo Pai ao seu Filho encarnado, é confiada aos Apóstolos e, por eles, aos seus sucessores; eles recebem o Espírito de Jesus para agirem em seu nome e na sua pessoa (Cf. Jo. 20. 21-23; Lc. 24. 47; Mt. 28, 18-20). Assim, o ministro ordenado é o laço sacramental que une a ação litúrgica àquilo que disseram e fizeram os Apóstolos e, por eles, ao que disse e fez o próprio Cristo, fonte e fundamento dos sacramentos.

1121. Os três sacramentos do Batismo, Confirmação e Ordem conferem, além da graça, um caráter sacramental ou «selo», pelo qual o cristão participa no sacerdócio de Cristo e faz parte da Igreja segundo estados e funções diversas. Esta configuração a Cristo e à Igreja, realizada pelo Espírito, é indelével (Concílio de Trento, Sess. 7ª, Canones de sacramentis in genere, can 9: DS 1609), fica para sempre no cristão como disposição positiva para a graça, como promessa e garantia da proteção divina e como vocação para o culto divino e para o serviço da Igreja. Por isso, estes sacramentos nunca podem ser repetidos.

III. Os sacramentos da fé

1122. Cristo enviou os Apóstolos para que, «em seu nome, pregassem a todas as nações a conversão para o perdão dos pecados» (Lc. 24, 47). «Fazei discípulos de todas as nações, batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo» (Mt. 28, 19). A missão de batizar, portanto a missão sacramental, está implicada na missão de evangelizar; porque o sacramento é preparado pela Palavra de Deus e pela fé, que é assentimento à dita Palavra:

- «o povo de Deus é reunido, antes de mais, pela Palavra de Deus vivo [...]. A pregação da Palavra é necessária para o próprio ministério dos sacramentos, enquanto são sacramentos da fé, que nasce e se alimenta da Palavra» (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 4: AAS 58 (1966) 995-996).

1123. «Os sacramentos estão ordenados à santificação dos homens, à edificação do corpo de Cristo e, por fim, a prestar culto a Deus; como sinais, têm também a função de instruir. Não só supõem a fé, mas também a alimentam, fortificam e exprimem por meio de palavras e coisas, razão pela qual se chamam sacramentos da fé» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosactum Concilium, 59: AAS 56 (1964) 116).

1124. A fé da Igreja é anterior à fé do fiel, que é chamado a aderir a ela. Quando a Igreja celebra os sacramentos, confessa a fé recebida dos Apóstolos. Daí o adágio antigo: «Lex orandi, lex credendi - A lei da oração é a lei da fé» (Ou: «Legem credendi lex statuat supplicandi - A lei da fé é determinada pela lei da oração», como diz Próspero de Aquitânia [século VI) (Próspero de Aquitânia [séc. V], Indiculus, c. 8: DS 246 (PL 51, 209)). A lei da oração é a lei da fé, a Igreja crê conforme reza. A liturgia é um elemento constitutivo da Tradição santa e viva (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Verbum, 8: AAS 58 (1966) 821).

1125. É por isso que nenhum rito sacramental pode ser modificado ou manipulado ao arbítrio do ministro ou da comunidade. Nem mesmo a autoridade suprema da Igreja pode mudar a liturgia a seu bel-prazer, mas somente na obediência da fé e no respeito religioso do mistério da liturgia.

1126. Aliás, uma vez que os sacramentos exprimem e desenvolvem a comunhão da fé na Igreja, a lex orandi é um dos critérios essenciais do diálogo que procura restaurar a unidade dos cristãos (Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 2: AAS 57 (1965) 91-92: Ibid., 15: AAS 57 (1965) 101-102).

IV. Os sacramentos da salvação

1127. Celebrados dignamente na fé, os sacramentos conferem a graça que significam (Cf. Concílio de Trento, Canones de sacramentis in genere, can 5: DS 1605; Ibid., can. 6: DS 1606). Eles são eficazes, porque neles é o próprio Cristo que opera: é Ele que batiza, é Ele que age nos sacramentos para comunicar a graça que o sacramento significa. O Pai atende sempre a oração da Igreja do seu Filho, a qual, na epiclese de cada sacramento, exprime a sua fé no poder do Espírito. Tal como o fogo transforma em si tudo quanto atinge, assim o Espírito Santo transforma em vida divina tudo quanto se submete ao seu poder.

1128. É esse o sentido da afirmação da Igreja (Cf. Concílio de Trento, Canones de sacramentis in genere, can 8: DS 1608): os sacramentos atuam ex opere operato (à letra: «pelo próprio fato de a ação ser executada»), quer dizer, em virtude da obra salvífica de Cristo, realizada uma vez por todas. Segue-se daí que «o sacramento não é realizado pela justiça do homem que o dá ou que o recebe, mas pelo poder de Deus» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3, q. 68, a. 8, c.: Ed. Leon. 12, 100). Desde que um sacramento seja celebrado conforme a intenção da Igreja, o poder de Cristo e do seu Espírito age nele e por ele, independentemente da santidade pessoal do ministro. No entanto, os frutos dos sacramentos dependem também das disposições de quem os recebe.

1129. A Igreja afirma que, para os crentes, os sacramentos da Nova Aliança são necessários para a salvação (Cf. Concílio de Trento, Canones de sacramentis in genere, can 4: DS 1604). A «graça sacramental» é a graça do Espírito Santo dada por Cristo e própria de cada sacramento. O Espírito cura e transforma aqueles que O recebem, conformando-os com o Filho de Deus. O fruto da vida sacramental é que o Espírito de adopção deifique os fiéis, unindo-os vitalmente ao Filho único, o Salvador.

V. Os sacramentos da vida eterna

1130. A Igreja celebra o mistério do seu Senhor «até que Ele venha» e «Deus seja tudo em todos» (1ª Cor. 11, 26; 15, 28). Desde a era Apostólica, a liturgia é atraída para o seu termo pelo gemido do Espírito na Igreja: «Marana tha»! (1ª Cor. 16, 22). A liturgia participa, assim, no desejo de Jesus: «tenho ardentemente desejado comer convosco esta Páscoa [...], até que ela se realize plenamente no Reino de Deus» (Lc. 22, 15-16) (Cf. 2ª Pe. 1, 4). Nos sacramentos de Cristo, a Igreja recebe já as arras da sua herança e já participa na vida eterna, embora «aguardando a ditosa esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo» (Tt. 2, 13). «O Espírito e a esposa dizem: "Vem!" [...] Vem, Senhor Jesus»! (Ap. 22, 17.20).

- São Tomás de Aquino define assim as diferentes dimensões do sinal sacramental: «Sacramentum est et signum rememorativum eius quod praecessit, scilicet passionis Christi; et demonstrativum eius quod in nobis efficitur per Christi passionem, scilicet gratiae; et prognosticum, id est, praenuntiativum futurae gloriae - O sacramento é sinal rememorativo daquilo que o precedeu, ou seja, da paixão de Cristo; e demonstrativo daquilo que em nós a paixão de Cristo realiza, ou seja, da graça; e prognóstico, quer dizer, que anuncia de antemão a glória futura» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3, q. 60, a. 3 c.: Ed. Leon. 12, 6).

Resumindo:

1131. Os sacramentos são sinais eficazes da graça, instituídos por Cristo e confiados à Igreja, pelos quais nos é dispensada a vida divina. Os ritos visíveis, com os quais são celebrados os sacramentos, significam e realizam as graças próprias de cada sacramento. Eles dão fruto naqueles que os recebem com as disposições requeridas.

1132. A Igreja celebra os sacramentos enquanto comunidade sacerdotal estruturada pelo sacerdócio batismal e pelo dos ministros ordenados.

1133. O Espírito Santo prepara para os sacramentos pela Palavra de Deus e pela fé, que acolhe a Palavra nos corações bem dispostos. Então, os sacramentos fortificam e exprimem a fé.

1134. O fruto da vida sacramental é, ao mesmo tempo, pessoal e eclesial. Por um lado, este fruto é, para todo o fiel, viver para Deus em Cristo Jesus; por outro, é para a Igreja crescimento na caridade e na sua missão de testemunho. 

CAPÍTULO SEGUNDO

A CELEBRAÇÃO SACRAMENTAL
DO MISTÉRIO PASCAL

1135. A catequese da liturgia implica, primeiramente, a compreensão da economia sacramental (capítulo primeiro). A esta luz revela-se a novidade da sua celebração. Tratar-se-á, pois, neste capítulo da celebração dos sacramentos da Igreja. Ter-se-á em vista aquilo que, através da diversidade das tradições litúrgicas, é comum à celebração dos sete sacramentos; o que é próprio de cada um será apresentado mais adiante. Esta catequese fundamental das celebrações sacramentais responderá às principais questões que os fiéis se colocam a este respeito:

- quem celebra?
- como celebrar?
- quando celebrar?
- onde celebrar?

ARTIGO 1

CELEBRAR A LITURGIA DA IGREJA

I. Quem celebra?

1136. A liturgia é «ação» do «Cristo total» (Christus totus). Os que agora a celebram para além dos sinais, estão já integrados na liturgia celeste, onde a celebração é totalmente comunhão e festa.

OS CELEBRANTES DA LITURGIA CELESTE

1137. O Apocalipse de São João, lido na liturgia da Igreja, revela-nos, primeiramente, um trono preparado no céu, e Alguém sentado no trono (Cf. Ap. 4, 2), «o Senhor Deus» (Is. 6, 1) (Cf. Ec. 1, 26-28). Depois, o Cordeiro «imolado e de pé» (Ap. 5, 6) (Cf. Jo 1, 29): Cristo crucificado e ressuscitado, o único Sumo-Sacerdote do verdadeiro santuário (Cf. Heb. 4, 14-15; 10, 19-21: etc.), o mesmo «que oferece e é oferecido, que dá e é dado» (Liturgia Bizantina. Anáfora de São João Crisóstomo: F. E. Brigtman, Liturgies Eastern and Western (Oxford 1896) p. 378 (Pg. 63, 913)). Enfim, «o rio da Vida [...] que corre do trono de Deus e do Cordeiro» (Ap. 22, 1), um dos mais belos símbolos do Espírito Santo (Cf. Jo. 4, 10-14; Ap. 21, 6).

1138. «Recapitulados» em Cristo, tomam parte no serviço do louvor de Deus e na realização do seu desígnio: os Poderes celestes (Cf. Ap. 4-5: Is. 6, 2-3), toda a criação (os quatro viventes), os servidores da Antiga e da Nova Aliança (os vinte e quatro anciãos), o novo povo de Deus (os cento e quarenta e quatro mil) (Cf. Ap. 7, 1-8; 14, 1), em particular os mártires, «degolados por causa da Palavra de Deus» (Ap. 6, 9) e a santíssima Mãe de Deus (a Mulher (Cf. Ap. 12); a Esposa do Cordeiro (Cf. Ap. 21, 9) enfim, «uma numerosa multidão que ninguém podia contar e provinda de todas as nações, tribos, povos e línguas» (Ap. 7, 9).

1139. É nesta liturgia eterna que o Espírito e a Igreja nos fazem participar, quando celebramos o mistério da salvação nos sacramentos.

OS CELEBRANTES DA LITURGIA SACRAMENTAL

1140. É toda a comunidade, o corpo de Cristo unido à sua Cabeça, que celebra. «As ações litúrgicas não são ações privadas, mas celebrações da Igreja, que é "o sacramento da unidade", isto é, povo santo reunido e ordenado sob a direção dos Bispos. Por isso, tais ações pertencem a todo o corpo da Igreja, manifestam-no e afetam-no, atingindo, porém, cada um dos membros de modo diverso, segundo a variedade de estados, funções e participação atual» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 26: AAS 56 (1964) 107). Também por isso, «sempre que os ritos comportam, segundo a natureza própria de cada qual, uma celebração comum, caracterizada pela presença e ativa participação dos fiéis, inculque-se que esta deve preferir-se, na medida do possível, à celebração individual e como que privada» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 27: AAS 56 (1964) 107).

1141. A assembleia que celebra é a comunidade dos batizados, que «pela regeneração e pela unção do Espírito Santo, são consagrados para ser uma casa espiritual e um sacerdócio santo, para oferecerem, mediante todas as obras do cristão, sacrifícios espirituais» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14). Este «sacerdócio comum» é o de Cristo, único Sacerdote, participado por todos os seus membros (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 14: Ibid., 34: AAS 57 (1965) 40: Id., Decr. Presbyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 991-992):

«É desejo ardente da Mãe Igreja que todos os fiéis cheguem àquela plena, consciente e ativa participação nas celebrações litúrgicas que a própria natureza da liturgia exige e que é, por força do Batismo, um direito e um dever do povo cristão, "raça escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido"» (1ª Pe. 2, 9) (Cf. 1ª Pe. 2, 4-5) (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 14: AAS 56 (1964) 104).

1142. Mas «nem todos os membros têm a mesma função» (Rm. 12, 4). Alguns deles são chamados por Deus, na Igreja e pela Igreja, a um serviço especial da comunidade. Estes servidores são escolhidos e consagrados pelo sacramento da Ordem, pelo qual o Espírito Santo os torna aptos para agirem na pessoa de Cristo-Cabeça ao serviço de todos os membros da Igreja (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 14: AAS 56 (1964) 104). O ministro ordenado é como que o «ícone» de Cristo-Sacerdote. Por ser na Eucaristia que se manifesta plenamente o sacramento da Igreja, na presidência da Eucaristia aparece em primeiro lugar o ministério do Bispo e, em comunhão com ele, o dos Presbíteros e Diáconos.

1143. Para o exercício das funções do sacerdócio comum dos fiéis, existem ainda outros ministérios particulares, não consagrados pelo sacramento da Ordem, e cuja função é determinada pelos Bispos segundo as tradições litúrgicas e as necessidades pastorais. «Também os acólitos, os leitores, os comentadores e os membros do coro desempenham um verdadeiro ministério litúrgico» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 29: AAS 56 (1964) 107).

1144. Assim, na celebração dos sacramentos, toda a assembleia é «liturga», cada qual segundo a sua função, mas «na unidade do Espírito» que age em todos. «Nas celebrações litúrgicas, limite-se cada um, ministro ou simples fiel, ao exercer o seu ofício, a fazer tudo e só o que é da sua competência, segundo a natureza do rito e as leis litúrgicas» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 28: AAS 56 (1964) 107).

II. Como celebrar?

SINAIS E SÍMBOLOS

1145. Uma celebração sacramental é tecida de sinais e de símbolos. Segundo a pedagogia divina da salvação, a sua significação radica na obra da criação e na cultura humana, determina-se nos acontecimentos da Antiga Aliança e revela-se plenamente na pessoa e na obra de Cristo.

1146. Sinais do mundo dos homens. Os sinais e os símbolos ocupam um lugar importante na vida humana. Sendo o homem um ser ao mesmo tempo corporal e espiritual, exprime e percebe as realidades espirituais através de sinais e símbolos materiais. Como ser social, o homem tem necessidade de sinais e de símbolos para comunicar com o seu semelhante através da linguagem. dos gestos e de ações. O mesmo acontece nas suas relações com Deus.

1147. Deus fala ao homem através da criação visível. O cosmos material apresenta-se à inteligência do homem para que leia nele os traços do seu Criador (Cf. Sb, 13, 1: Rm. 1, 19-20; At. 14, 17). A luz e a noite, o vento e o fogo, a água e a terra, a árvore e os frutos, tudo fala de Deus e simboliza, ao mesmo tempo, a sua grandeza e a sua proximidade.

1148. Enquanto criaturas, estas realidades sensíveis podem tornar-se o lugar de expressão da ação de Deus que santifica os homens e da ação dos homens que prestam a Deus o seu culto. O mesmo acontece com os sinais e símbolos da vida social dos homens: lavar e ungir, partir o pão e beber do mesmo copo podem exprimir a presença santificante de Deus e a gratidão do homem para com o seu Criador.

1149. As grandes religiões da humanidade dão testemunho, muitas vezes de modo impressionante, deste sentido cósmico e simbólico dos ritos religiosos. A liturgia da Igreja pressupõe, integra e santifica elementos da criação e da cultura humana, conferindo-lhes a dignidade de sinais da graça, da nova criação em Cristo Jesus.

1150. Sinais da Aliança. O povo eleito recebe de Deus sinais e símbolos distintivos, que marcam a sua vida litúrgica: já não são unicamente celebrações de ciclos cósmicos e práticas sociais, mas sinais da Aliança, símbolos das proezas operadas por Deus em favor do seu povo. Entre estes sinais litúrgicos da Antiga Aliança, podem citar-se a circuncisão, a unção e a sagração dos reis e dos sacerdotes, a imposição das mãos, os sacrifícios e sobretudo a Páscoa. A Igreja vê nestes sinais uma prefiguração dos sacramentos da Nova Aliança.

1151. Sinais assumidos por Cristo. Na sua pregação, o Senhor Jesus serve-se muitas vezes dos sinais da criação para dar a conhecer os mistérios do Reino de Deus
(Cf. Lc. 8, 10). Realiza as suas curas ou sublinha a sua pregação com sinais materiais ou gestos simbólicos (Cf. Jo. 9, 6: Mc. 7, 33-35; 8, 22-25). Dá um sentido novo aos fatos e sinais da Antiga Aliança, sobretudo ao Êxodo e à Páscoa (Cf. Lc. 9, 31; 22, 7-20), porque Ele próprio é o sentido de todos esses sinais.

1152. Sinais sacramentais. Depois do Pentecostes, é através dos sinais sacramentais da sua Igreja que o Espírito Santo opera a santificação. Os sacramentos da Igreja não vêm abolir, mas purificar e assumir, toda a riqueza dos sinais e símbolos do cosmos e da vida social. Além disso, realizam os tipos e figuras da Antiga Aliança, significam e realizam a salvação operada por Cristo, e prefiguram e antecipam a glória do céu.

PALAVRAS E ACÇÕES

1153. Cada celebração sacramental é um encontro dos filhos de Deus com o seu Pai, em Cristo e no Espírito Santo. Tal encontro exprime-se como um diálogo, através de ações e de palavras. Sem dúvida, as ações simbólicas são já, só por si, uma linguagem. Mas é preciso que a Palavra de Deus e a resposta da fé acompanhem e deem vida a estas ações, para que a semente do Reino produza os seus frutos em terra boa. As ações litúrgicas significam o que a Palavra de Deus exprime: ao mesmo tempo, a iniciativa gratuita de Deus e a resposta de fé do seu povo.

1154. A liturgia da Palavra é parte integrante das celebrações sacramentais. Para alimentar a fé dos fiéis, os sinais da Palavra de Deus devem ser valorizados: o livro da Palavra (leccionário ou evangeliário), a sua veneração (procissão, incenso, luz), o lugar da sua proclamação (ambão), a sua leitura audível e inteligível, a homilia do ministro que prolonga a sua proclamação, as respostas da assembleia (aclamações, salmos de meditação, litanias, confissão de fé...).

1155. Inseparáveis enquanto sinais e ensinamento, as palavras e a ação litúrgica são-no também enquanto realizam o que significam. O Espírito Santo não se limita a dar a compreensão da Palavra de Deus suscitando a fé nela; pelos sacramentos, realiza também as «maravilhas» de Deus anunciadas pela Palavra: torna presente e comunica a obra do Pai, realizada pelo Filho muito amado.

CANTO E MÚSICA

1156. «A tradição musical da Igreja universal criou um tesouro de inestimável valor, que excede todas as outras expressões de arte, sobretudo porque o canto sagrado, intimamente unido com o texto, constitui parte necessária ou integrante da liturgia solene» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 112: AAS 56 (1964) 128). A composição e o canto dos salmos inspirados, muitas vezes acompanhados por instrumentos musicais, estavam já estreitamente ligados às celebrações litúrgicas da Antiga Aliança. A Igreja continua e desenvolve esta tradição: «recitai entre vós salmos, hinos e cânticos inspirados, cantai e louvai ao Senhor no vosso coração» (Ef. 5,19) (Cf. Cl. 3, 16-17). Quem canta, reza duas vezes (Cf. Santo Agostinho, Enarratio in Psalmum, 72, 1: CCL 39, 986 (PL 36, 914)).

1157. O canto e a música desempenham a sua função de sinais, dum modo tanto mais significativo, quanto «mais intimamente estiverem unidos à ação litúrgica» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 112: AAS 56 (1964) 128), segundo três critérios principais: a beleza expressiva da oração, a participação unânime da assembleia nos momentos previstos e o carácter solene da celebração. Participam, assim, na finalidade das palavras e das ações litúrgicas: a glória de Deus e a santificação dos fiéis (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 112: AAS 56 (1964) 128).

- «Como eu chorei ao ouvir os vossos hinos, os vossos cânticos, as suaves harmonias que ecoavam pela vossa igreja! Que emoção me causavam! Passavam pelos meus ouvidos, derramando a verdade no meu coração. Um grande impulso de piedade me elevava, e as lágrimas rolavam-me pela face; mas faziam-me bem» (Santo Agostinho, Confissões 9, 6, 14: CCL27, 141 (PL 32, 769-770)).

1158. A harmonia dos sinais (canto, música, palavras e ações) é aqui tanto mais expressiva e fecunda quanto mais se exprimir na riqueza cultural própria do Povo de Deus que celebra (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 119: AAS 56 (1964) 129-130). Por isso, «promova-se com empenho o canto religioso popular para que, tanto nos exercícios piedosos e sagrados como nas próprias ações litúrgicas», de acordo com as normas da Igreja, «ressoem as vozes dos fiéis» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 118: AAS 56 (1964) 129). Mas «os textos destinados ao canto sacro devem estar de acordo com a doutrina católica e inspirar-se sobretudo na Sagrada Escritura e nas fontes litúrgicas» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 121: AAS56 (1964) 130).

AS SANTAS IMAGENS

1159. A imagem sagrada, o «ícone» litúrgico, representa principalmente Cristo. Não pode representar o Deus invisível e incompreensível: foi a Encarnação do Filho de Deus que inaugurou uma nova «economia» das imagens:

- «outrora Deus, que não tem nem corpo nem figura, não podia de modo algum, ser representado por uma imagem. Mas agora, que Ele se fez ver na carne e viveu no meio dos homens, eu posso fazer uma imagem daquilo que vi de Deus [...] Contemplamos a glória do Senhor com o rosto descoberto» (São João Damasceno, De sacris imaginibus oratio 1, 16: PTS 17, 89 e 92 (PG 94, 1245 e 1248)).

1160. A iconografia cristã transpõe para a imagem a mensagem evangélica que a Sagrada Escritura transmite pela palavra. Imagem e palavra esclarecem-se mutuamente:

- «para dizer brevemente a nossa profissão de fé, nós conservamos todas as tradições da Igreja, escritas ou não, que nos foram transmitidas intactas. Uma delas é a representação pictórica das imagens, que está de acordo com a pregação da história evangélica, acreditando que, de verdade e não só de modo aparente, o Deus Verbo Se fez homem, o que é tão útil como proveitoso, pois as coisas que mutuamente se esclarecem têm indubitavelmente uma significação recíproca» (II Concílio de Niceia (em 787) Terminus: COD p. 135).

1161. Todos os sinais da celebração litúrgica fazem referência a Cristo: também as imagens sagradas da Mãe de Deus e dos santos. De fato, elas significam Cristo que nelas é glorificado; manifestam «a nuvem de testemunhas» (Heb, 12, 1) que continuam a participar na salvação do mundo e às quais estamos unidos, sobretudo na celebração sacramental. Através dos seus ícones, é o homem «à imagem de Deus», finalmente transfigurado «à sua semelhança» (Cf. Rm, 8, 29; 1 Jo, 3, 2), que se revela à nossa fé - como ainda os anjos, também eles recapitulados em Cristo:

- «seguindo a doutrina divinamente inspirada dos nossos santos Padres e a tradição da Igreja Católica, que nós sabemos ser a tradição do Espírito Santo que nela habita, definimos com toda a certeza e cuidado que as veneráveis e santas imagens, bem como as representações da Cruz preciosa e vivificante, pintadas, representadas em mosaico ou de qualquer outra matéria apropriada, devem ser colocadas nas santas igrejas de Deus, sobre as alfaias e vestes sagradas, nos muros e em quadros, nas casas e nos caminhos: e tanto a imagem de nosso Senhor, Deus e Salvador, Jesus Cristo, como a de nossa Senhora, a puríssima e santa Mãe de Deus, a dos santos anjos e de todos os santos e justos» (II Concílio de Niceia, Definitio de sacris imaginibus: DS 600).

1162. «A beleza e a cor das imagens estimulam a minha oração. É uma festa para os meus olhos, e, tal como o espetáculo do campo, impele o meu coração a dar glória a Deus» (São João Damasceno, De sacris imaginibus oratio 1, 47: PTS 17. 151 (PG 94, 1268)). A contemplação dos sagrados ícones, unida à meditação da Palavra de Deus e ao canto dos hinos litúrgicos, entra na harmonia dos sinais da celebração, para que o mistério celebrado se imprima na memória do coração e se exprima depois na vida nova dos fiéis.

III. Quando celebrar?

O TEMPO LITÚRGICO

1163. «A santa Mãe Igreja considera seu dever celebrar com uma comemoração sagrada, em determinados dias do ano, a obra de salvação do seu divino Esposo. Em cada semana, no dia a que chamou Domingo, celebra a memória da ressurreição do Senhor, como a celebra também uma vez no ano, na Páscoa, a maior das solenidades, unida à memória da sua bem-aventurada paixão. E distribui todo o mistério de Cristo pelo decorrer do ano [...]. Comemorando assim os mistérios da Redenção, ela abre aos fiéis as riquezas das virtudes e merecimentos do seu Senhor, a ponto de os tornar de algum modo presentes a todos os tempos, para que os fiéis, em contato com eles, se encham da graça da salvação» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 102: AAS 56 (1964) 125).

1164. O povo de Deus, desde o tempo da lei mosaica, conheceu festas em datas fixadas a partir da Páscoa, para comemorar as ações portentosas do Deus Salvador, dar-Lhe graças por elas, perpetuar-lhes a lembrança e ensinar as novas gerações a conformarem com elas a sua conduta. No tempo da Igreja, situado entre a Páscoa de Cristo, já realizada uma vez por todas, e a sua consumação no Reino de Deus, a liturgia celebrada em dias fixos está toda impregnada da novidade do mistério de Cristo.

1165. Quando a Igreja celebra o mistério de Cristo, há uma palavra que ritma a sua oração: hoje! como um eco da oração que lhe ensinou o seu Senhor (Cf. Mt. 6, 1) e do chamamento do Espírito Santo (Cf. Heb. 3, 7-4, 11; Sl 95, 8). Este «hoje» do Deus vivo, em que o homem é chamado a entrar, é a «Hora» da Páscoa de Jesus, que atravessa e sustenta toda a história:

- «a vida derramou-se sobre todos os seres e todos são inundados duma grande luz: o Oriente dos orientes invade o universo e Aquele que era "antes da estrela da manhã" e antes dos astros, imortal e imenso, o grande Cristo, brilha mais que o Sol sobre todos os seres. É por isso que, para nós que n'Ele cremos, se instaura um dia de luz, longo, eterno, que não se extingue: a Páscoa mística» (Cf. Heb. 3, 7-4, 11; Sl. 95, 8).

O DIA DO SENHOR

1166. «Por tradição apostólica, que remonta ao próprio dia da ressurreição de Cristo, a Igreja celebra o mistério pascal todos os oito dias, no dia que bem se denomina dia do Senhor ou Domingo» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 106: AAS 56 (1964) 12642). O dia da ressurreição de Cristo é, ao mesmo tempo, o “’primeiro dia da semana”, memorial do primeiro dia da criação, e o “oitavo dia” em que Cristo, após o seu “repouso” do grande sábado, inaugura o “dia que o Senhor fez”», o «dia que não conhece ocaso» (Cf. Matinas do dia da Páscoa do rito Bizantino. Ode 9, tropário: Pentekostárion (Roma 1884) p. 11). A «Ceia do Senhor» é o seu centro, porque é nela que toda a comunidade dos fiéis encontra o Senhor ressuscitado, que os convida para o seu banquete (Cf. Jo. 21, 12: Lc. 24, 30):

- «o dia do Senhor, o dia da ressurreição, o dia dos cristãos é o nosso dia. Chama-se dia do Senhor por isso mesmo: porque foi nesse dia que o Senhor subiu vitorioso para junto do Pai. Se os pagãos lhe chamam dia do Sol, também nós, de bom grado o confessamos: porque hoje se ergueu a luz do mundo, hoje apareceu o sol da justiça, cujos raios nos trazem a salvação» (São Jerónimo, In die Dominica Paschae homilia: CCL 78, 550 (PL 30. 218-219)).

1167. O Domingo é o dia por excelência da assembleia litúrgica, em que os fiéis se reúnem «para, ouvindo a Palavra de Deus e participando na Eucaristia, fazerem memória da paixão, ressurreição e glória do Senhor Jesus, e darem graças a Deus, que os "regenerou para uma esperança viva pela ressurreição de Jesus Cristo de entre os mortos"» (São Jerónimo, In die Dominica Paschae homilia: CCL 78, 550 (PL 30. 218-219)):

- «quando meditamos, ó Cristo, nas maravilhas que tiveram lugar neste dia de domingo da tua santa ressurreição, dizemos: bendito o dia de Domingo, porque nele teve início a criação [...] a salvação do mundo [...] a renovação do género humano [...]. Foi nesse dia que o céu e a terra se congratularam e que todo o universo se encheu de luz. Bendito o dia de Domingo, porque nele foram abertas as portas do paraíso, para que Adão e todos os deportados nele entrassem sem temor» (Fanqîth. Breviarium iuxta Ecclesiae Antiochenae Syrorum, v. 6, (Mossul )886) p. 193b).

O ANO LITÚRGICO

1168. Partindo do Tríduo Pascal, como da sua fonte de luz, o tempo novo da ressurreição enche todo o ano litúrgico da sua claridade. Progressivamente, dum lado e doutro desta fonte, o ano é transfigurado pela liturgia. Ele é realmente o ano da graça do Senhor (Cf. Lc. 4, 19). A economia da salvação realiza-se no quadro do tempo, mas a partir do seu cumprimento na Páscoa de Jesus e da efusão do Espírito Santo, o fim da história é antecipado, pregustado, e o Reino de Deus entra no nosso tempo.

1169. É por isso que a Páscoa não é simplesmente uma festa entre outras: é a «festa das festas», a «solenidade das solenidades», tal como a Eucaristia é o sacramento dos sacramentos (o grande sacramento). Santo Atanásio chama-lhe «o grande domingo» (Santo Atanásio de Alexandria, Epistula festivalis 1 (em 329), 10: PG 26, 1366), tal como a Semana Santa é chamada no Oriente «a semana maior». O mistério da ressurreição, em que Cristo aniquilou a morte, penetra no nosso velho tempo com a sua poderosa energia, até que tudo Lhe seja submetido.

1170. No Concílio de Niceia (em 325), todas as Igrejas acordaram em que a Páscoa cristã fosse celebrada no domingo a seguir à lua cheia (14 de Nisan), depois do equinócio da Primavera. Devido a diferentes métodos usados para calcular o dia 14 de Nisan, a data da Páscoa nem sempre coincide nas Igrejas do Ocidente e do Oriente. Por isso, estas Igrejas procuram hoje um acordo, para chegarem de novo a celebrar numa data comum o dia da ressurreição do Senhor.

1171. O ano litúrgico é o desenrolar dos diferentes aspectos do único mistério pascal. Isto vale particularmente para o ciclo das festas em torno do mistério da Encarnação (Anunciação, Natal, Epifania), que comemoram o princípio da nossa salvação e nos comunicam as primícias do mistério da Páscoa.

O SANTORAL NO ANO LITÚRGICO

1172. «Na celebração deste ciclo anual dos mistérios de Cristo, a santa Igreja venera, com especial amor, porque indissoluvelmente unida à obra de salvação do seu Filho, a bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus; nela vê e exalta o mais excelso fruto da redenção e contempla com alegria, como numa imagem puríssima, o que ela própria deseja e espera ser inteiramente» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 103: AAS 56 (1964) 125).

1173. Quando a Igreja, no ciclo anual, faz memória dos mártires e dos outros santos, «proclama o mistério pascal» realizado naqueles homens e mulheres que «sofreram com Cristo e com Ele foram glorificados, propõe aos fiéis os seus exemplos, que a todos atraem ao Pai por Cristo, e implora, pelos seus méritos, os benefícios de Deus» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 104: AAS 56 (1964) 126; cf. Ibid., 108: AAS 56 (1964) 126 e Ibid., 111: AAS 56 (1964)127).

A LITURGIA DAS HORAS

1174. O mistério de Cristo, a sua Encarnação e a sua Páscoa, que celebramos na Eucaristia, especialmente na assembleia dominical, penetra e transfigura o tempo de cada dia pela celebração da Liturgia das Horas, «O Ofício divino» (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, IV, 83-101: AAS 56 (1964) 121-125). Esta celebração, na fidelidade às recomendações apostólicas de «orar sem cessar» (Cf. 1ª Ts. 5, 17; Ef. 6, 18) «constituiu-se de modo a consagrar, pelo louvor a Deus, todo o curso diurno e noturno do tempo» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 84: AAS 56 (1964) 121). É «a oração pública da Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 98: AAS 56 (1964) 124), na qual os fiéis (clérigos, religiosos e leigos) exercem o sacerdócio real dos batizados. Celebrada «segundo a forma aprovada» pela Igreja, a Liturgia das Horas «é verdadeiramente a voz da própria Esposa que fala com o Esposo; mais ainda, é a oração que Cristo, unido ao seu corpo, eleva ao Pai» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 84: AAS 56 (1964) 121).

1175. A Liturgia das Horas está destinada a tornar-se a oração de todo o povo de Deus. Nela, o próprio Cristo «continua a exercer o seu múnus sacerdotal por intermédio da sua Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 83: AAS 56 (1964) 121). Cada qual participa nela segundo o seu lugar próprio na Igreja e as circunstâncias da sua vida: os Sacerdotes, enquanto dedicados ao ministério pastoral, porque são chamados a permanecer assíduos na oração e no ministério da Palavra (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 86: AAS 56 (1964) 121: Ibid., 96: AAS 56 (1964) 123; Id., Decr. Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966) 998): os religiosos e religiosas, em virtude do carisma da sua vida consagrada (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 98: AAS 56 (1964) 124); e todos os fiéis, segundo as suas possibilidades: «cuidem os pastores de almas de que, nos domingos e festas mais solenes, se celebrem em comum na Igreja as Horas principais, sobretudo as Vésperas. Recomenda-se também aos próprios leigos que recitem o Ofício divino, quer juntamente com os Sacerdotes, quer reunidos entre si, ou mesmo sozinhos» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 100: AAS 56 (1964) 124).

1176. Celebrar a Liturgia das Horas exige, não somente harmonizar a voz com o coração que ora, mas também procurar «adquirir maior instrução litúrgica e bíblica, especialmente quanto aos salmos» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 90: AAS 56 (1964) 122).

1177. Os hinos e as preces litânicas da Liturgia das Horas inserem a oração dos salmos no tempo da Igreja, exprimindo o simbolismo do momento do dia, do tempo litúrgico ou da festa celebrada. Além disso, a leitura da Palavra de Deus em cada Hora (com os responsórios ou tropários que a seguem) e, em certas horas, as leituras dos Padres e mestres espirituais, revelam mais profundamente o sentido do mistério celebrado, ajudam a compreender os salmos e preparam para a oração silenciosa. A «lectio divina», na qual a Palavra de Deus é lida e meditada para se tornar oração, é deste modo enraizada na celebração litúrgica.

1178. A Liturgia das Horas, que é como que um prolongamento da celebração eucarística, não exclui, antes postula como complemento, as diversas devoções do povo de Deus, particularmente a adoração e o culto do Santíssimo Sacramento.

IV. Onde celebrar?

1179. O culto «em espírito e verdade» (Jo. 4, 24) da Nova Aliança não está ligado a nenhum lugar exclusivo. Toda a terra é santa e está confiada aos filhos dos homens. O que tem primazia, quando os fiéis se reúnem num mesmo lugar, sãs as «pedras vivas» que se juntam para «a edificação dum edifício espiritual» (1ª Pe. 2, 4-5). O corpo de Cristo ressuscitado é o templo espiritual donde brota a fonte de água viva. Incorporados em Cristo pelo Espírito Santo, «nós somos o templo do Deus vivo» (2ª Cor. 6, 16).

1180. Quando o exercício da liberdade religiosa não é impedido (Cf. II Concílio do Vaticano, Decl. Dignitatis humanae, 4: AAS 58 (1966) 932-933), os cristãos constroem edifícios destinados ao culto divino. Estas igrejas visíveis não são simples lugares de reunião, mas significam e manifestam a Igreja que vive nesse lugar, morada de Deus com os homens reconciliados e unidos em Cristo.

1181. «A casa de oração em que é celebrada e conservada a santíssima Eucaristia, em que os fiéis se reúnem, e na qual a presença do Filho de Deus, nosso Salvador, oferecido por nós no altar do sacrifício, é venerada para auxílio e consolação dos fiéis, deve ser bela e apta para a oração e para as celebrações sagradas» (II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966) 998; cf. Id., Const. Sacrosanctum Concilium, 122-127: AAS 56 (1964) 130-132). Nesta «casa de Deus», a verdade e a harmonia dos sinais que a constituem devem manifestar Cristo presente e atuante neste lugar (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 7: AAS 56 (1964) 100-101).

1182. O altar da Nova Aliança é a cruz do Senhor (Cf. Heb. 13, 10), de onde dimanam os sacramentos do mistério pascal. Sobre o altar, que é o centro da igreja, é tornado presente o sacrifício da Cruz sob os sinais sacramentais. Ele é também a mesa do Senhor, para a qual o povo de Deus é convidado (Cf. Instrução geral do Missal Romano, 259: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.75 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. p. 56]). Em certas liturgias orientais, o altar é, ainda, o símbolo do túmulo (Cristo morreu verdadeiramente e verdadeiramente ressuscitou).

1183. O «sacrário» deve ser situado, «nas igrejas, num dos lugares mais dignos, com a maior honra» (Paulo VI, Enc. Mysterium fedei: AAS 57 (1965) 771). A nobreza, o arranjo e a segurança do tabernáculo eucarístico (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 128: AAS 56 (1964) 132) devem favorecer a adoração do Senhor, realmente presente no Santíssimo Sacramento do altar.

O Santo Crisma (myron), cuja unção é o sinal sacramental do selo do dom do Espírito Santo, é tradicionalmente conservado e venerado num lugar seguro do santuário. Pode juntar-se-lhe o óleo dos catecúmenos e o dos enfermos.

1184. A cadeira do Bispo (cátedra) ou do sacerdote «deve significar a sua função de presidente da assembleia e guia da oração» (Instrução geral do Missal Romano, 271: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 77 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. p. 57]).

O ambão: «a dignidade da Palavra de Deus requer na igreja um lugar próprio para a sua proclamação. Durante a liturgia da Palavra, é para lá que deve convergir espontaneamente a atenção dos fiéis» (Instrução geral do Missal Romano, 272: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.77 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, p. 571).

1185. A reunião do povo de Deus começa pelo Batismo. Por isso, a igreja deve ter um lugar apropriado para a celebração do Batismo (batistério) e favorecer a lembrança das promessas do Batismo (água benta).

A renovação da vida batismal exige a Penitência. Por isso, a igreja deve prestar-se à expressão do arrependimento e à recepção do perdão dos pecados, o que reclama um lugar apropriado para acolher os penitentes.

A igreja deve ser, também, um espaço que convide ao recolhimento e à oração silenciosa, que prolongue e interiorize a grande oração da Eucaristia.

1186. Finalmente a igreja tem uma significação escatológica. Para entrar na casa de Deus, é preciso franquear um limiar, símbolo da passagem do mundo ferido pelo pecado para o mundo da vida nova, à qual todos os homens são chamados. A igreja visível simboliza a casa paterna, para a qual o Povo de Deus está a caminho e onde o Pai «enxugará todas as lágrimas dos seus olhos» (Ap. 21, 4). É também por isso que a igreja é a casa de todos os filhos de Deus, amplamente aberta e acolhedora.

Resumindo:

1187. A liturgia é obra do Cristo total, cabeça e corpo. O nosso Sumo-Sacerdote celebra-a sem cessar na liturgia celeste, com a Santa Mãe de Deus, os Apóstolos, todos os santos e a multidão dos seres humanos que já entraram no Reino.

1188. Numa celebração litúrgica, toda a assembleia é «liturga», cada qual segundo a sua função. O sacerdócio batismal é de todo o corpo de Cristo. Mas alguns fiéis são ordenados pelo sacramento da Ordem para representar Cristo como Cabeça do corpo.

1189. A celebração litúrgica comporta sinais e símbolos que se referem à criação (luz, água, fogo), à vida humana (lavar, tingir; partir o pão) e à história da salvação (ritos da Páscoa). Inseridos no mundo da fé e assumidos pela força do Espírito Santo, estes elementos cósmicos, estes ritos humanos, estes gestos memoriais de Deus, tornam-se portadores da ação salvadora e santificadora de Cristo.

1190. A liturgia da Palavra é parte integrante da celebração. O sentido da celebração é expresso pela Palavra de Deus que é anunciada e pelo compromisso da fé que lhe responde.

1191. 0 canto e a música estão em conexão estreita com a ação litúrgica. São critérios do seu bom uso: a beleza expressiva da oração, a participação unânime da assembleia e o carácter sagrado da celebração.

1192. As imagens sagradas, presentes nas nossas igrejas e nas nossas casas, destinam-se a despertar e alimentar a nossa fé no mistério de Cristo. Através do ícone de Cristo e das suas obras de salvação, é a Ele que adoramos. Através das imagens sagradas da Santa Mãe de Deus, dos anjos e dos santos, veneramos as pessoas que nelas vemos representadas.

1193. 0 Domingo, «Dia do Senhor», é o dia principal da celebração da Eucaristia, porque é o dia da ressurreição. É o dia por excelência da assembleia litúrgica, o dia da família cristã, o dia da alegria e do descanso do trabalho. É «o fundamento e o núcleo de todo o ano litúrgico» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 106: AAS 56 (1964) 126).

1194. A Igreja «desdobra todo o mistério de Cristo durante o ciclo anual, desde a Encarnação e o Natal até à Ascensão, ao dia do Pentecostes e à expectativa da feliz confiança e da vinda do Senhor» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 102: AAS 56 (1964) 125).

1195. Celebrando a memória dos santos, em primeiro lugar da Santa Mãe de Deus, depois dos Apóstolos, dos mártires e dos outros santos, em dias fixos do ano litúrgico, a Igreja da terra manifesta a sua união à liturgia celeste; glorifica Cristo por ter realizado a salvação nos seus membros glorificados; o exemplo deles é para ela um estímulo no seu peregrinar para o Pai.

1196. Os fiéis que celebram a Liturgia das Horas unem-se a Cristo, nosso Sumo-Sacerdote, pela oração dos salmos, a meditação da Palavra de Deus, os cânticos e as bênçãos, a fim de serem associados à sua oração contínua e universal, que dá glória ao Pai e implora o dom do Espírito Santo sobre o mundo inteiro.

1197. Cristo é o verdadeiro Templo de Deus, «o lugar em que reside a sua glória»; pela graça de Deus, também os cristãos se tornam templos do Espírito Santo, pedras vivas com que se constrói a Igreja.

1198. Na sua condição terrena, a Igreja tem necessidade de lugares onde a comunidade possa reunir-se: as nossas igrejas visíveis, lugares sagrados, imagens da Cidade santa, da Jerusalém celeste para a qual caminhamos como peregrinos.

1199. É nestas igrejas que a Igreja celebra o culto público para glória da Santíssima Trindade, ouve a Palavra de Deus e canta os seus louvores, eleva a sua oração e oferece o sacrifício de Cristo, sacramentalmente presente no meio da assembleia. Estas igrejas são também lugares de recolhimento e de oração pessoal.

ARTIGO 2

DIVERSIDADE LITÚRGICA E UNIDADE DO MISTÉRIO

TRADIÇÕES LITÚRGICAS E CATOLICIDADE DA IGREJA

1200. Desde a primeira comunidade de Jerusalém até à Parusia, as Igrejas de Deus celebram em toda a parte o mesmo mistério pascal, fiéis à fé apostólica. O mistério celebrado na liturgia é um só, mas as formas da sua celebração são diversas.

1201. A riqueza insondável do mistério de Cristo é tal, que nenhuma tradição litúrgica pode esgotar-lhe a expressão. A história da origem e desenvolvimento destes ritos testemunha uma complementaridade admirável. Sempre que as Igrejas viveram estas tradições litúrgicas em comunhão na fé e nos sacramentos da fé, enriqueceram-se mutuamente, crescendo na fidelidade à Tradição e à missão comum de toda a Igreja (Cf. Paulo VI, Ex. ap. Evangelii nuntiandi, 63-64: AAS 68 (1976) 53-55).

1202. As diversas tradições litúrgicas nasceram em razão da própria missão da Igreja. As Igrejas duma mesma área geográfica e cultural acabaram por celebrar o mistério de Cristo através de expressões particulares, culturalmente diferenciadas: na tradição do «depósito da fé» (Cf. 2º Tm. 1, 14), no simbolismo litúrgico, na organização da comunhão fraterna, na compreensão teológica dos mistérios e nos tipos de santidade. Assim, Cristo, Luz e Salvação de todos os povos, é manifestado pela vida litúrgica duma Igreja ao povo e à cultura a que a mesma Igreja é enviada e em que se radicou. A Igreja é católica: pode integrar na sua unidade, purificando-as, todas as verdadeiras riquezas das culturas (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 23: AAS 57 (1965) 28-29; in. Decr. Unitatis redintegratio, 4: AAS 57 (1965) 95).

1203. As tradições litúrgicas ou ritos, atualmente em uso na Igreja, são: o rito latino (principalmente o rito romano, mas também os ritos de certas igrejas locais, como o rito ambrosiano ou o de certas ordens religiosas) e os ritos bizantino, alexandrino ou copta, siríaco, arménio, maronita e caldeu. «Fiel à tradição, o sagrado Concílio declara que a santa Mãe Igreja considera iguais em direito e dignidade todos os ritos legitimamente reconhecidos e quer que no futuro se mantenham e sejam promovidos por todos os meios» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 4: AAS 56 (1964) 98).

LITURGIA E CULTURAS

1204. A celebração da Liturgia deve, pois, corresponder ao génio e à cultura dos diferentes povos (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 37-40: AAS 56 (1964)). Para que o mistério de Cristo seja «dado a conhecer a todos os gentios, para que obedeçam à fé» (Rm. 16, 26), tem de ser anunciado, celebrado e vivido em todas as culturas, de modo que estas não sejam abolidas, mas resgatadas e plenamente realizadas por ele (Cf. João Paulo II, Ex. Ap. Catechesi tradendae, 53: AAS 71 (1979) 1319-1321). É com e pela sua cultura humana própria, assumida e transfigurada por Cristo, que a multidão dos filhos de Deus tem acesso ao Pai, para O glorificar num só Espírito.

1205. «Na liturgia, sobretudo na dos sacramentos, existe uma parte imutável - por ser de instituição divina - da qual a Igreja é guardiã, e partes susceptíveis de mudança que a Igreja tem o poder e, por vezes, mesmo o dever de adaptar às culturas dos povos recentemente evangelizados» (Cf. João Paulo II, Ex. Ap. Catechesi tradendae, 53: AAS 71 (1979) 1319-1321).

1206. «A diversidade litúrgica pode ser fonte de enriquecimento, mas também pode provocar tensões, incompreensões recíprocas e até cismas. Neste domínio, é claro que a diversidade não deve prejudicar a unidade. Ela só pode exprimir-se na fidelidade à fé comum, aos sinais sacramentais que a Igreja recebeu de Cristo e à comunhão hierárquica. A adaptação às culturas exige uma conversão do coração e, se necessário, rupturas com hábitos ancestrais incompatíveis com a fé católica» (João Paulo II, Carta Ap. Vicesimus quintus annus, 16: AAS 81 (1989) 913).

Resumindo:

1207. Convém que a celebração da liturgia tenda a exprimir-se na cultura do povo em que a Igreja se encontra, sem se submeter a ela. Por outro lado, a própria liturgia é geradora e formadora de culturas.

1208. As diversas tradições litúrgicas, ou ritos, legitimamente reconhecidas, uma vez que significam e comunicam o mesmo mistério de Cristo, manifestam a catolicidade da Igreja.

1209. O critério que garante a unidade na pluriformidade das tradições litúrgicas é a fidelidade à Tradição apostólica, quer dizer: a comunhão na fé e nos sacramentos recebidos dos Apóstolos, comunhão que é significada e garantida pela sucessão apostólica.

SEGUNDA SECÇÃO

OS SETE SACRAMENTOS DA IGREJA

1210. Os sacramentos da nova Lei foram instituídos por Cristo e são em número de sete, a saber: o Batismo, a Confirmação, a Eucaristia, a Penitência, a Unção dos Enfermos, a Ordem e o Matrimónio. Os sete sacramentos tocam todas as etapas e momentos importantes da vida do cristão: outorgam nascimento e crescimento, cura e missão à vida de fé dos cristãos. Há aqui uma certa semelhança entre as etapas da vida natural e as da vida espiritual (São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 65, a. 1. c: Ed. Leon. 12, 56-57).

1211. Seguindo esta analogia, exporemos primeiro os três sacramentos da iniciação cristã (capítulo primeiro), depois os sacramentos de cura (capítulo segundo) e finalmente os que estão ao serviço da comunhão e da missão dos fiéis (capítulo terceiro). Esta ordem não é, certamente, a única possível, mas permite ver que os sacramentos formam um organismo, no qual cada sacramento particular tem o seu lugar vital. Neste organismo, a Eucaristia ocupa um lugar único, como «sacramento dos sacramentos»: «todos os outros sacramentos estão ordenados para este, como para o seu fim» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 65. a. 3. c: Ed. Leon. 12, 60).

CAPÍTULO PRIMEIRO

OS SACRAMENTOS DA INICIAÇÃO CRISTÃ

1212. Através dos sacramentos da iniciação cristã - Batismo, Confirmação e Eucaristia são lançados os alicerces de toda a vida cristã. «A participação na natureza divina, dada aos homens pela graça de Cristo, comporta uma certa analogia com a origem, crescimento e sustento da vida natural. Nascidos para uma vida nova pelo Batismo, os fiéis são efetivamente fortalecidos pelo sacramento da Confirmação e recebem na Eucaristia o Pilo da vida eterna Assim. por estes sacramentos da iniciação cristã, eles recebem cada vez mais riquezas da vida divina e avançam para a perfeição da caridade» (Paulo VI, Const. Ap. Divinae consortium naturae: AAS 63 (1971) 657: cf. Ordo initiationis christianae adultorum, Praenotanda 1-2 (Typis Polyglottis Vaticanis 1972) p. 7 [Iniciação cristã dos adultos, Segunda Edição, Preliminares, 1-2 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1996) p. 9-10]).

ARTIGO 1

O SACRAMENTO DO BATISMO

1213. O santo Batismo é o fundamento de toda a vida cristã, o pórtico da vida no Espírito («vitae spiritualis ianua - porta da vida espiritual») e a porta que dá acesso aos outros sacramentos. Pelo Batismo somos libertos do pecado e regenerados como filhos de Deus: tornamo-nos membros de Cristo e somos incorporados na Igreja e tornados participantes na sua missão (Cf. Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1314: CIC can 204, § 1. 849; CCEO can 675 § 1). «Batismos est sacramentam regeneratiorais per aquam in Verbo - O Batismo pode definir-se como o sacramento da regeneração pela água e pela Palavra» (Cat. Rom. 2, 2, 5, p. 179).

I. Como se chama este sacramento?

1214. Chama-se Batismo, por causa do rito central com que se realiza: batizar (batizeis, em grego) significa «mergulhar», «imergir». A «imersão» na água simboliza a sepultura do catecúmeno na morte de Cristo, de onde sai pela ressurreição com Ele (Cf. Rm. 6, 3-4; Cl 2, 12) como «nova criatura» (2ª Cor 5, 17; Gl 6, 15).

1215. Este sacramento é também chamado «banho da regeneração e da renovação no Espírito Santo» (Tt. 3, 5), porque significa e realiza aquele nascimento da água e do Espírito, sem o qual «ninguém pode entrar no Reino de Deus» (Jo. 3, 5).

1216. «Este banho é chamado iluminação, porque aqueles que recebem este ensinamento [catequético] ficam com o espírito iluminado...» (São Justino, Apologia 1, 61: CA 1, 168 (PG 6, 421)). Tendo recebido no Batismo o Verbo, «luz verdadeira que ilumina todo o homem» (Jo. 1, 9), o batizado, «depois de ter sido iluminado» (Cf. Heb. 10, 32), tornou-se «filho da luz» (Cf. 1ª Ts. 5, 5) e ele próprio «luz» (Ef. 5, 8):

«O Batismo é o mais belo e magnífico dos dons de Deus [...] Chamamos-lhe dom, graça, unção, iluminação, veste de incorruptibilidade, banho de regeneração, selo e tudo o que há de mais precioso. Dom, porque é conferido àqueles que não trazem nada: graça, porque é dado mesmo aos culpados: batismo, porque o pecado é sepultado nas águas; unção, porque é sagrado e régio (como aqueles que são ungidos); iluminação, porque é luz irradiante; veste, porque cobre a nossa vergonha; banho, porque lava; selo, porque nos guarda e é sinal do senhorio de Deus» (São Gregório Nazianzo, Oratio 40, 3-4: SC 358, 202-204 (PG 36, 361-364)).

II. O Batismo na economia da salvação

AS PREFIGURAÇÕES DO BATISMO NA ANTIGA ALIANÇA

1217. Na liturgia da Vigília Pascal, a quando da bênção da água batismal, a Igreja faz solenemente memória dos grandes acontecimentos da história da salvação que prefiguravam já o mistério do Batismo:

- «Senhor nosso Deus: pelo vosso poder invisível, realizais maravilhas nos vossos sacramentos. Ao longo dos tempos, preparastes a água para manifestar a graça do Batismo» (Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 283 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 315]).

1218. Desde o princípio do mundo, a água, esta criatura humilde e admirável, é a fonte da vida e da fecundidade. A Sagrada Escritura vê-a como «incubada» pelo Espírito de Deus (Cf. Gn. 1, 2):

- «logo no princípio do mundo, o vosso Espírito pairava sobre as águas, para que já desde então concebessem o poder de santificar» (Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970). p. 283 [A tradução oficial portuguesa desta oração não inclui a metáfora da «concepção»: «Logo no princípio do mundo, o vosso Espírito pairava sobre as águas, prefigurando o seu poder de santificar»: Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 315]).

1219. A Igreja viu na arca de Noé uma prefiguração da salvação pelo Batismo. Com efeito, graças a ela, «um pequeno grupo, ao todo oito pessoas, foram salvas pela água» (1ª Pe. 3, 20):

«Nas águas do dilúvio, destes-nos uma imagem do Batismo, sacramento da vida nova, porque as águas significam ao mesmo tempo o fim do pecado e o princípio da santidade» (Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 283 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 3151).

1220. Se a água de nascente simboliza a vida, a água da maré um símbolo da morte. Por isso é que podia prefigurar o mistério da cruz. E por este simbolismo, o Batismo significa a comunhão com a morte de Cristo.

1221. É sobretudo a travessia do Mar Vermelho, verdadeira libertação de Israel da escravidão do Egito, que anuncia a libertação operada pelo Batismo:

- «aos filhos de Abraão fizestes atravessar a pé enxuto o Mar Vermelho, para que esse povo, liberto da escravidão, fosse a imagem do povo santo dos batizados» (Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 283 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 315]).

1222. Finalmente, o Batismo é prefigurado na travessia do Jordão, graças à qual o povo de Deus - recebe o dom da terra prometida à descendência de Abraão, imagem da vida eterna. A promessa desta herança bem-aventurada cumpre-se na Nova Aliança.

O BATISMO DE CRISTO

1223. Todas as prefigurações da Antiga Aliança encontram a sua realização em Jesus Cristo. Ele começa a sua vida pública depois de se ter feito batizar por São João Batista no Jordão (Cf. Mt. 3, 13). E depois da sua ressurreição, confere esta missão aos Apóstolos: «ide, pois, fazei discípulos de todas as nações; batizai-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo e ensinai-os a cumprir tudo quanto vos mandei» (Mt. 28, 19-20) (Cf. Mc. 16, 15-16).

1224. Nosso Senhor sujeitou-se voluntariamente ao Batismo de São João, destinado aos pecadores, para cumprir toda a justiça (Cf. Mt. 3, 15). Este gesto de Jesus é uma manifestação do seu «aniquilamento» (CL Fl. 2, 7). O Espírito que pairava sobre as águas da primeira criação, desce então sobre Cristo como prelúdio da nova criação e o Pai manifesta Jesus como seu «Filho muito amado» (Cf. Mt. 3, 16-17).

1225. Foi na sua Páscoa que Cristo abriu a todos os homens as fontes do Batismo. De fato, Ele já tinha falado da sua paixão, que ia sofrer em Jerusalém, como dum «batismo» com que devia ser batizado (Cf. Mc. 10, 38; Lc. 12, 50). O sangue e a água que manaram do lado aberto de Jesus crucificado (Cf. Jo. 19, 34) são tipos do Batismo e da Eucaristia, sacramentos da vida nova (Cf. 1ª Jo. 5, 6-8): desde então, é possível «nascer da água e do Espírito» para entrar no Reino de Deus (Jo. 3, 5).

- «Repara: onde é que foste batizado, de onde é que vem o Batismo, senão da cruz de Cristo, da morte de Cristo? Ali está todo o mistério: Ele sofreu por ti. Foi n'Ele que tu foste resgatado, n'Ele que foste salvo» (Santo Ambrósio, De sacramentis 2, 2, 6: CSEL73, 27-28 (PL16, 425-426)).

O BATISMO NA IGREJA

1226. Desde o dia de Pentecostes que a Igreja vem celebrando e administrando o santo Batismo. Com efeito, São Pedro declara à multidão, abalada pela sua pregação: «convertei-vos e peça cada um de vós o Batismo em nome de Jesus Cristo, para vos serem perdoados os pecados. Recebereis então o dom do Espírito Santo» (At. 2, 38). Os Apóstolos e os seus colaboradores oferecem o Batismo a quem quer que acredite em Jesus: judeus, pessoas tementes a Deus, pagãos (Cf. At 2, 41: 8, 12-13; 10, 48; 16, 15). O Batismo aparece sempre ligado à fé: «acredita no Senhor Jesus e serás salvo juntamente com a tua família», declara São Paulo ao seu carcereiro em Filipos. E a narrativa continua: «o carcereiro [...] logo recebeu o Batismo, juntamente com todos os seus» (At. 16, 31-33).

1227. Segundo o apóstolo São Paulo, pelo Batismo o crente comunga na morte de Cristo; é sepultado e
ressuscita com Ele:

             - «todos nós, que fomos batizados em Cristo Jesus, fomos batizados na sua morte. Fomos sepultados   
             com Ele pelo batismo na morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos, pela glória do   
            Pai, também nós vivamos uma vida nova»
(Rm. 6, 3-4)
(Cf. Cl. 2, 12).

- os batizados «revestem-se de Cristo» (Cf. Gl. 3, 27). Pelo Espírito Santo, o Batismo é um banho que purifica, santifica e justifica (Cf. 1ª Cor. 6, 11; 12, 13).

1228. O Batismo é, pois, um banho de água, no qual «a semente incorruptível» da Palavra de Deus produz o seu efeito vivificador (Cf. 1ª Pe. 23; Ef. 5, 26). Santo Agostinho dirá do Batismo: «Accedit verbum ad elementum, et fit sacramentam Junta-se a palavra ao elemento material e faz-se o sacramento» (Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus 80, 3: CCL 36, 529 (PL 35, 1840)).

III. Como se celebra o sacramento do Batismo?

A INICIAÇÃO CRISTÃ

1229. Desde o tempo dos Apóstolos que tornar-se cristão requer um caminho e uma iniciação com diversas etapas. Este itinerário pode ser percorrido rápida ou lentamente. Mas deverá sempre incluir certos elementos essenciais: o anúncio da Palavra, o acolhimento do Evangelho que implica a conversão, a profissão de fé, o Batismo, a efusão do Espírito Santo, o acesso à comunhão eucarística.

1230. Esta iniciação tem variado muito no decurso dos séculos e segundo as circunstâncias. Nos primeiros séculos da Igreja, a iniciação cristã conheceu grande desenvolvimento, com um longo período de catecumenato e uma série de ritos preparatórios que escalonavam liturgicamente o caminho da preparação catecumenal, desembocando na celebração dos sacramentos da iniciação cristã.

1231. Nas regiões onde o Batismo das crianças se tomou largamente a forma habitual da celebração deste sacramento, esta transformou-se num ato único, que integra, de um modo muito abreviado, as etapas preliminares da iniciação cristã. Pela sua própria natureza, o Batismo das crianças exige um catecumenato pós-batismal. Não se trata apenas da necessidade duma instrução posterior ao Batismo, mas do desenvolvimento necessário da graça batismal no crescimento da pessoa. É o espaço próprio da catequese.

1232. O II Concílio do Vaticano restaurou, para a Igreja latina, «o catecumenato dos adultos, distribuído em várias fases» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 64: AAS 56 (1964) 117). O respectivo ritual encontra-se no Ordo initiationis christianae adultorum (1972). Aliás, o Concílio permitiu que, «para além dos elementos de iniciação próprios da tradição cristã», se admitam, em terras de missão, «os elementos de iniciação usados por cada um desses povos, na medida em que puderem integrar-se no rito cristão» (II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 65: AAS 56 (1964) 117; cf. Ibid., 37-40: AAS 56 (1964) 110-111).

1233. Hoje em dia, portanto, em todos os ritos latinos e orientais, a iniciação cristã dos adultos começa com a sua entrada no catecumenato, para atingir o ponto culminante na celebração única dos três sacramentos, Batismo, Confirmação e Eucaristia (Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 14: AAS 58 (1966) 963: CIC can. 851.865 866). Nos ritos orientais, a iniciação cristã das crianças na infância começa no Batismo, seguido imediatamente da Confirmação e da Eucaristia, enquanto no rito romano a mesma iniciação prossegue durante os anos de catequese, para terminar, mais tarde, com a Confirmação e a Eucaristia, ponto culminante da sua iniciação cristã (Cf. CIC can. 851, 2. 868).

A MISTAGOGIA DA CELEBRAÇÃO

1234. O sentido e a graça do sacramento do Batismo aparecem claramente nos ritos da sua celebração. Seguindo, com participação atenta, os gestos e as palavras desta celebração, os fiéis são iniciados nas riquezas que este sacramento significa e realiza em cada novo batizado.

1235. O sinal da cruz, no princípio da celebração, manifesta a marca de Cristo impressa naquele que vai passar a pertencer-Lhe, e significa a graça da redenção que Cristo nos adquiriu pela sua cruz.

1236. O anúncio da Palavra de Deus ilumina com a verdade revelada os candidatos e a assembleia e suscita a resposta da fé, inseparável do Batismo. Na verdade, o Batismo é, de modo particular, o «sacramento da fé», uma vez que é a entrada sacramental na vida da fé.

1237. E porque o Batismo significa a libertação do pecado e do diabo, seu instigador, pronuncia-se sobre o candidato um ou vários exorcismos. Ele é ungido com o óleo dos catecúmenos ou, então, o celebrante impõe-lhe a mão e ele renuncia expressamente a Satanás. Assim preparado, pode professar a fé da Igreja, à qual será «confiado» pelo Batismo (Cf. Rm. 6, 17).

1238. A água batismal é então consagrada por uma oração de epiclese (ou no próprio momento, ou na Vigília Pascal). A Igreja pede a Deus que, pelo seu Filho, o poder do Espírito Santo desça a esta água, para que os que nela forem batizados «nasçam da água e do Espírito» (Jo. 3, 5).

1239. Segue-se o rito essencial do sacramento: o batismo propriamente dito, que significa e realiza a morte para o pecado e a entrada na vida da Santíssima Trindade, através da configuração com o mistério pascal de Cristo. O Batismo é realizado, do modo mais significativo, pela tríplice imersão na água batismal; mas, desde tempos antigos, pode também ser conferido derramando por três vezes água sobre a cabeça do candidato.

1240. Na Igreja latina, esta tríplice infusão é acompanhada pelas palavras do ministro: «(Nome), eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo». Nas liturgias orientais, estando o catecúmeno voltado para o Oriente, o sacerdote diz: «o servo de Deus (Nome) é batizado em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo»; e à invocação de cada pessoa da Santíssima Trindade, mergulha-o e retira-o da água.

1241. A unção com o santo crisma, óleo perfumado que foi consagrado pelo Bispo, significa o dom do Espírito Santo ao novo batizado. Ele tornou-se cristão, quer dizer, «ungido» pelo Espírito Santo, incorporado em Cristo, que foi ungido sacerdote, profeta e rei (Cf. Ordo Baptismi parvulorum, 62 (Typis Polyglottis Vaticanis 1969) p. 32 [Celebração do Baptismo das crianças, 62, Segunda edição típica (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1994), p.61)).

1242. Na liturgia das Igrejas do Oriente, a unção pós-batismal é o sacramento da Crismação (Confirmação). Na liturgia romana, anuncia uma segunda unção com o santo Crisma, que será dada pelo Bispo: o sacramento da Confirmação que, por assim dizer, «confirma» e completa a unção batismal.

1243. A veste branca simboliza que o batizado «se revestiu de Cristo» (Cf. Gl. 3, 27): ressuscitou com Cristo. A vela, acesa no círio pascal, significa que Cristo iluminou o neófito. Em Cristo, os batizados são «a luz do mundo» (Mt. 5, 14) (Cf. Fl, 2, 15).

- O recém-batizado é agora filho de Deus no seu Filho Único e pode dizer a oração dos filhos de Deus: O Pai-Nosso.

1244. A primeira Comunhão eucarística. Tornado filho de Deus, revestido da veste nupcial, o neófito é admitido «ao banquete das núpcias do Cordeiro» e recebe o alimento da vida nova, o Corpo e Sangue de Cristo. As Igrejas orientais conservam uma consciência viva da unidade da iniciação cristã, dando a Sagrada Comunhão a todos os novos batizados e confirmados, mesmo às criancinhas, lembrando a palavra do Senhor: «deixai vir a Mim as criancinhas, não as estorveis» (Mc. 10, 14). A Igreja latina, que reserva o acesso à Sagrada Comunhão para aqueles que atingiram o uso da razão, exprime a abertura do Batismo em relação à Eucaristia aproximando do altar a criança recém-batizada para a oração do Pai Nosso.

1245. A celebração do Batismo conclui-se com a bênção solene. Aquando do Batismo de recém-nascidos, a bênção da mãe ocupa um lugar especial.

IV. Quem pode receber o Batismo?

1246. «Todo o ser humano ainda não batizado - e só ele – é capaz de receber o Baptismo» (CIC can.864; cf. CCEO. can.679)

O BATISMO DOS ADULTOS

1247. Desde os princípios da Igreja, o Batismo dos adultos é a situação mais corrente nas terras onde o anúncio do Evangelho ainda é recente. O catecumenato (preparação para o Batismo) tem, nesse caso, um lugar importante; sendo iniciação na fé e na vida cristã, deve dispor para o acolhimento do dom de Deus no Batismo, Confirmação e Eucaristia.

1248. O catecumenato, ou formação dos catecúmenos, tem por finalidade permitir a estes, em resposta à iniciativa divina e em união com uma comunidade eclesial, conduzir à maturidade a sua conversão e a sua fé. Trata-se duma «formação e de uma aprendizagem de toda a vida cristã», mediante a qual os discípulos se unem com Cristo seu mestre. Por conseguinte, sejam os catecúmenos convenientemente iniciados no mistério da salvação, na prática dos costumes evangélicos, e, com ritos sagrados a celebrar em tempos sucessivos, sejam introduzidos na vida da fé, da Liturgia e da caridade do povo de Deus (II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 14: AAS 58 (1966) 962-963; cf. Ordo initiationis christianae adultorum, Praenotanda 19 (Typis Polyglottis Vaticanis 1972) p. 11 Iniciação cristã dos adultos. Segunda Edição, Preliminares, 19 (Coimbra, Gráfica de Coimbra - Conferência Episcopal Portuguesa. 1996) p. 26-27); Ibid., De tempore catechumenatus eiusque ritibus 98, p. 36 [Ibid. O tempo do catecumenado e os seus ritos 98. p. 66]).

1249. Os catecúmenos «estão já unidos à Igreja», já são da casa de Cristo, e, não raro, eles levam já uma vida de fé, de «confiança e de caridade» (II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 14: AAS 58 (1966) 963). «A mãe Igreja já os abraça como seus, com amor e solicitude» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 14: AAS 57 (1965) 19: cf. CIC can. 206.788).

O BATISMO DAS CRIANÇAS

1250. Nascidas com uma natureza humana decaída e manchada pelo pecado original, (Cf. Concílio de Trento, Sess. 5ª, Decretum de peccato originali, can. 4: DS 1514) as crianças também têm necessidade do novo nascimento no Batismo para serem libertas do poder das trevas e transferidas para o domínio da liberdade dos filhos de Deus (Cf. Cl. 1, 12-14), a que todos os homens são chamados. A pura gratuidade da graça da salvação é particularmente manifesta no Batismo das crianças. Por isso, a Igreja e os pais privariam, a criança da graça inestimável de se tornar filho de Deus, se não lhe conferissem o Batismo pouco depois do seu nascimento (Cf. Cl. 1, 12-14).

1251. Os pais cristãos reconhecerão que esta prática corresponde, também, ao seu papel de sustentar a vida que Deus lhes confiou (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15-16; Ibid., 41: AAS 57 (1965) 47; Id., Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1067-1069; CIC can. 774. § 2. 1136).

1252. A prática de batizar as crianças é tradição imemorial da Igreja (Cf. At 16, 15. 33; 18, 8; 1 Cor 1, 16). Explicitamente atestada desde o século II, é, no entanto, bem possível que, desde o princípio da pregação apostólica, quando «casas» inteiras receberam o Batismo se tenham batizado também as crianças (Cf. Sagrada Congregação da Doutrina da Fé, Instr. Pastoralis actio, 4: AAS 72 (1980) 1139).

FÉ E BATISMO

1253. O Batismo é o sacramento da fé (Cf. Mc. 16, 16). Mas a fé tem necessidade da comunidade dos crentes. Só na fé da Igreja é que cada um dos fiéis pode crer. A fé que se requer para o Batismo não é uma fé perfeita e amadurecida, mas um princípio chamado a desenvolver-se. Ao catecúmeno ou ao seu padrinho pergunta-se: «que pedis à Igreja de Deus»? E ele responde: «a fé»!

1254. Em todos os batizados, crianças ou adultos, a fé deve crescer depois do Batismo. É por isso que a Igreja celebra todos os anos, na Vigília Pascal, a renovação das promessas do Batismo. A preparação para o Batismo conduz apenas ao umbral da vida nova. O Batismo é a fonte da vida nova em Cristo, donde jorra toda a vida cristã.

1255. Para que a graça batismal possa desenvolver-se, é importante a ajuda dos pais. Esse é também o papel do padrinho ou da madrinha, que devem ser pessoas de fé sólida, capazes e preparados para ajudar o novo batizado, criança ou adulto, no seu caminho de vida cristã (Cf. CIC can. 872-874). O seu múnus é um verdadeiro ofício eclesial (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 67: AAS 56 (1964) 118). Toda a comunidade eclesial tem uma parte de responsabilidade no desenvolvimento e na defesa da graça recebida no Batismo.

V. Quem pode batizar?

1256. São ministros ordinários do Batismo o Bispo e o Presbítero, e, na Igreja latina, também o Diácono (Cf. CIC can. 861, § 1; CCEO can. 677, § 1). Em caso de necessidade, qualquer pessoa, mesmo não batizada, desde que tenha a intenção requerida, pode batizar utilizando a fórmula batismal trinitária (Cf. CIC can. 861, § 2). A intenção requerida é a de querer fazer o que faz a Igreja quando batiza. A Igreja vê a razão desta possibilidade na vontade salvífica universal de Deus (Cf. 1ª Tm. 2, 4) e na necessidade do Batismo para a salvação (Cf. Mc. 16, 16).

VI. A necessidade do Batismo

1257. O próprio Senhor afirma que o Batismo é necessário para a salvação (Cf. Jo. 3, 5). Por isso, ordenou aos seus discípulos que anunciassem o Evangelho e batizassem todas as nações (Cf. Mt. 28, 20. Cf. Concílio de Trento, Sess. 7°, Decretum de sacramentis, Canones de sacramento Baptismi, can. 5: DS 1618; II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 14: AAS 57 (1965) 18: ID., Decr. Ad gentes, 5: AAS 58 (1966) 951-952). O Batismo é necessário para a salvação de todos aqueles a quem o Evangelho foi anunciado e que tiveram a possibilidade de pedir este sacramento (Cf. Mc. 16, 16). A Igreja não conhece outro meio senão o Batismo para garantir a entrada na bem-aventurança eterna. Por isso, tem cuidado em não negligenciar a missão que recebeu do Senhor de fazer «renascer da água e do Espírito» todos os que podem ser batizados. Deus ligou a salvação ao sacramento do Batismo; mas Ele próprio não está prisioneiro dos seus sacramentos.

1258. Desde sempre, a Igreja tem a firme convicção de que aqueles que sofrem a morte por causa da fé, sem terem recebido o Batismo, são batizados pela sua morte por Cristo e com Cristo. Este Batismo de sangue, tal como o desejo do Batismo ou Batismo de desejo, produz os frutos do Batismo, apesar de não ser sacramento.

1259. Para os catecúmenos que morrem antes do Batismo, o seu desejo explícito de o receber, unido ao arrependimento dos seus pecados e à caridade, garante-lhes a salvação, que não puderam receber pelo sacramento.

1260. «Com efeito, já que Cristo morreu por todos e a vocação última de todos os homens é realmente uma só, a saber, a divina, devemos manter que o Espírito Santo a todos dá a possibilidade de se associarem a este mistério pascal, por um modo só de Deus conhecido» (II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes. 22: AAS 58 (1966) 1043; cf. In.. Const. dogm. Lumen Gentium, 16: AAS 57 (1965) 20; In. Decr. Ad gentes, 7: AAS 58 (1966) 955). Todo o homem que, na ignorância do Evangelho de Cristo e da sua Igreja, procura a verdade e faz a vontade de Deus conforme o conhecimento que dela tem, pode salvar-se. Podemos supor que tais pessoas teriam desejado explicitamente o Batismo se dele tivessem conhecido a necessidade.

1261. Quanto às crianças que morrem sem Batismo, a Igreja não pode senão confiá-las à misericórdia de Deus, como o faz no rito do respectivo funeral. De fato, a grande misericórdia de Deus, «que quer que todos os homens se salvem» (1ª Tm. 2, 4), e a ternura de Jesus para com as crianças, que O levou a dizer: «deixai vir a Mim as criancinhas, não as estorveis» (Mc. 10, 14), permitem-nos esperar que haja um caminho de salvação para as crianças que morrem sem Batismo. Por isso, é mais premente ainda o apelo da Igreja a que não se impeçam as criancinhas de virem a Cristo, pelo dom do santo Batismo.

VII. A graça do Batismo

1262. Os diferentes efeitos do Batismo são significados pelos elementos sensíveis do rito sacramental. A imersão na água evoca os simbolismos da morte e da purificação, mas também da regeneração e da renovação. Os dois efeitos principais são, pois, a purificação dos pecados e o novo nascimento no Espírito Santo (Cf. At. 2, 38: Jo 3, 5).

PARA A REMISSÃO DOS PECADOS

1263. Pelo Batismo todos os pecados são perdoados: o pecado original e todos os pecados pessoais, bem como todas as penas devidas ao pecado (Cf. Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1316). Com efeito, naqueles que foram regenerados, nada resta que os possa impedir de entrar no Reino de Deus: nem o pecado de Adão, nem o pecado pessoal, nem as consequências do pecado, das quais a mais grave é a separação de Deus.

1264. No batizado permanecem, no entanto, certas consequências temporais do pecado, como os sofrimentos, a doença, a morte, ou as fragilidades inerentes à vida, como as fraquezas de carácter, etc., assim como uma inclinação para o pecado a que a Tradição chama concupiscência ou, metaforicamente, a «isca» ou «aguilhão» do pecado («fomes peccati»): «deixada para os nossos combates, a concupiscência não pode fazer mal àqueles que, não consentindo nela, resistem corajosamente pela graça de Cristo. Bem pelo contrário, "aquele que tiver combatido segundo as regras será coroado"» (2ª Tm. 2, 5) (Concílio de Trento, Decretum de peccato originali, can. 5: DS 1515).

«UMA NOVA CRIATURA»

1265 O Batismo não somente purifica de todos os pecados, como faz também do neófito «uma nova criatura» (Cf. 2ª Cor. 5, 17), um filho adotivo de Deus (Cf. Gl.  4, 5-7), tornado «participante da natureza divina» (Cf. 2ª Pe. 1, 4), membro de Cristo (Cf. 1ª Cor. 6, 15; 12, 27) e co-herdeiro com Ele (Cf. Rm. 8, 17), templo do Espírito Santo (Cf. 1ª Cor. 6, 19).

1266. A Santíssima Trindade confere ao batizado a graça santificante, a graça da justificação, que:

- o torna capaz de crer em Deus, esperar n'Ele e O amar, pelas virtudes teologais;
- lhe dá o poder de viver e agir sob a moção do Espírito Santo e pelos dons do Espírito Santo;
- lhe permite crescer no bem, pelas virtudes morais. Assim, todo o organismo da vida sobrenatural do cristão tem a sua raiz no santo Baptismo.

INCORPORADOS NA IGREJA, CORPO DE CRISTO

1267. O Batismo faz de nós membros do corpo de Cristo. «Desde então [...], somos nós membros uns dos outros» (Ef. 4, 25). O Batismo incorpora na Igreja. Das fontes batismais nasce o único povo de Deus da Nova Aliança, que ultrapassa todos os limites naturais ou humanos das nações, das culturas, das raças e dos sexos: «por isso é que todos nós fomos batizados num só Espírito, para formarmos um só corpo» (1ª Cor. 12, 13).

1268. Os batizados tornaram-se «pedras vivas» para «a edificação dum edifício espiritual, para um sacerdócio santo» (1ª Pe. 2, 5). Pelo Batismo, participam no sacerdócio de Cristo, na sua missão profética e real, são «raça eleita, sacerdócio de reis, nação santa, povo que Deus tornou seu», para anunciar os louvores d'Aquele que os «chamou das trevas à sua luz admirável» (1ª Pe. 2, 9). O Batismo confere a participação no sacerdócio comum dos fiéis.

1269. Feito membro da Igreja, o batizado já não se pertence a si próprio (Cf. 1ª Cor. 6, 19) mas aquele que morreu e ressuscitou por nós (Cf. 2ª Cor. 5, 15). A partir daí, é chamado a submeter-se aos outros (Cf. Ef. 5, 21: 1ª Cor. 16, 15-16), a servi-los (Cf. Jo. 13, 12-15) na comunhão da Igreja, a ser «obediente e dócil» aos chefes da Igreja (Cf. Heb. 13, 17) e a considerá-los com respeito e afeição (Cf. 1ª Ts. 5, 12-13). Assim como o Batismo é fonte de responsabilidade e deveres, assim também o batizado goza de direitos no seio da Igreja: direito a receber os sacramentos, a ser alimentado com a Palavra de Deus e a ser apoiado com outras ajudas espirituais da Igreja (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 37: AAS 57 (1965) 42-43; CIC can. 208-223: CCEO can 675, § 2).

1270. Os batizados, «regenerados [pelo Batismo] para serem filhos de Deus, devem confessar diante dos homens a fé que de Deus receberam por meio da Igreja» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium. 11: AAS 57 (1965) 16) e participar na atividade apostólica e missionária do povo de Deus (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 17: AAS 57 (1965) 21; Id., Decr. Ad gentes. 7: AAS 58 (1966) 956; Ibid., 23: AAS 58 (1966) 974-975).

O VÍNCULO SACRAMENTAL DA UNIDADE DOS CRISTÃOS

1271. O Batismo constitui o fundamento da comunhão entre todos os cristãos, mesmo com aqueles que ainda não estão em plena comunhão com a Igreja Católica: «pois aqueles que creem em Cristo e foram devidamente batizados, estão numa certa comunhão, embora não perfeita, com a Igreja Católica justificados no Batismo pela fé, são incorporados em Cristo, e, por isso, com direito se honram com o nome de cristãos e justamente são reconhecidos pelos filhos da Igreja Católica como irmãos no Senhor» (II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 93). «O Batismo, pois, constitui o vínculo sacramental da unidade vigente entre todos os que por ele foram regenerados» (II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 22: AAS 57 (1965)105).

UMA MARCA ESPIRITUAL INDELÉVEL...

1272. Incorporado em Cristo pelo Batismo, o batizado é configurado com Cristo (Cf. Rm. 8, 29). O Batismo marca o cristão com um selo espiritual indelével («charactere») da sua pertença a Cristo. Esta marca não é apagada por nenhum pecado, embora o pecado impeça o Batismo de produzir frutos de salvação (Cf. Concílio de Trento, Sess. 7ª, Decretum de sacramentis, Canones de sacramentis in genere, can. 9: DS 1609: Ibid., Canones de sacramento Baptismi. can. 6: DS 1619). Ministrado uma vez por todas, o Batismo não pode ser repetido.

1273. Incorporados na Igreja pelo Batismo, os fiéis receberam o carácter sacramental que os consagra para o culto religioso cristão (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11:AAS 57 (1965) 16). O selo batismal capacita e compromete os cristãos a servir a Deus mediante uma participação viva na Santa liturgia da Igreja, e a exercer o seu sacer­dócio batismal pelo testemunho duma vida santa e duma caridade eficaz (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 15-16).

1274. O «selo do Senhor» («dominicus character») (Cf. Santo Agostinho, Epistula 98, 5: CSEL 34, 527 (PL 33, 362)) é o selo com que o Espírito Santo nos marcou «para o dia da redenção» (Ef. 4, 30) (Cf. Ef.  1, 13-14; 2ª Cor. 1, 21-22). «O Batismo é, efetivamente, o selo da vida eterna» (Santo Ireneu de Lião, Demonstratio praedicationis apostolicae, 3: SC 62, 32). O fiel que tiver «guardado o selo» até ao fim, quer dizer, que tiver permanecido fiel às exigências do seu Batismo, poderá partir «marcado pelo sinal da fé» (Oração Eucarística I ou Cânone Romano: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 454 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 521]), com a fé do seu Batismo, na expectativa da visão bem-aventurada de Deus - consumação da fé - e na confiança da ressurreição.

 Resumindo:

1275. A iniciação cristã faz-se pelo conjunto de três sacramentos: o Batismo, que é o princípio da vida nova; a Confirmação, que é a consolidação da mesma vida; e a Eucaristia, que alimenta o discípulo com o corpo e sangue de Cristo, em vista da sua transformação n'Ele.

1276. «Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, batizai-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e ensinai-os a cumprir tudo quanto vos mandei» (Mt. 28, 19-20).

1277. O Batismo constitui o nascimento para a vida nova em Cristo. Segundo a vontade do Senhor; ele é necessário para a salvação, como a própria Igreja, na qual o Batismo introduz.

1278. O rito essencial do Batismo consiste em mergulhar na água o candidato ou em derramar água sobre a sua cabeça, pronunciando a invocação da Santíssima Trindade, isto é, do Pai e do Filho e do Espírito Santo.

1279. O fruto do Batismo ou graça batismal é uma realidade rica que inclui: a remissão do pecado original e de todos os pecados pessoais; o renascimento para uma vida nova, pela qual o homem se torna filho adotivo do Pai, membro de Cristo, templo do Espírito Santo. Por esse facto, o batizado é incorporado na Igreja, corpo de Cristo, e tornado participante do sacerdócio de Cristo.

1280. O Batismo imprime na alma um sinal espiritual indelével, o carácter; que consagra o batizado para o culto da religião cristã. Por causa do carácter; o Batismo não pode ser repetido (Cf. Concílio de Trento, Sess. Decretum de sacramentis, Canones de sacramentis in genere, can. 9: DS 1609; Ibid., Canones de sacramento Baptismi. can.11: DS 1624).

1281. Os que sofrem a morte por causa da fé, os catecúmenos e todos aqueles que, sob o impulso da graça, sem conhecerem a Igreja, procuram sinceramente a Deus e se esforçam por cumprir a sua vontade, podem salvar-se, mesmo sem terem recebido o Batismo (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 16: AAS 57 (1965) 20).

1282. Desde os tempos mais antigos, o Batismo é administrado às crianças, visto ser uma graça e um dom de Deus que não supõem méritos humanos; as crianças são batizadas na fé da Igreja. A entrada na vida cristã dá acesso à verdadeira liberdade.

1283. Quanto às crianças que morrem sem Batismo, a Liturgia da Igreja convida-nos a ter confiança na misericórdia divina e a rezar pela sua salvação.

1284. Em caso de necessidade, qualquer pessoa pode batizar, desde que tenha a intenção de fazer o que a Igreja faz e derrame água sobre a cabeça do candidato, dizendo: «eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo».

ARTIGO 2

O SACRAMENTO DA CONFIRMAÇÃO

1285. Com o Batismo e a Eucaristia, o sacramento da Confirmação constitui o conjunto dos «sacramentos da iniciação cristã», cuja unidade deve ser salvaguardada. Por isso, é preciso explicar aos fiéis que a recepção deste sacramento é necessária para a plenitude da graça batismal (Cf. Ordo Confirmationis, Praenotanda 1 (Typis Polyglottis Vaticanas 1973) p. 16 [Celebração da Confirmação, Preliminares 1 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1991) p. 21]). Com efeito, os batizados «pelo sacramento da Confirmação, são mais perfeitamente vinculados à Igreja, enriquecidos com uma força especial do Espírito Santo e deste modo ficam mais estritamente obrigados a difundir e a defender a fé por palavras e obras, como verdadeiras testemunhas de Cristo» (II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15: cf. Ordo Confirmationis, Praenotanda 2 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 16 [Celebração da Confirmação, Preliminares 2 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1991) p. 21]).

I. A Confirmação na economia da salvação

1286. No Antigo Testamento, os profetas anunciaram que o Espírito do Senhor repousaria sobre o Messias esperado (Cf. Is. 11. 2), em vista da sua missão salvífica (Cf. Lc. 4, 16-22; Is. 61, 1). A descida do Espírito Santo sobre Jesus, aquando do seu batismo por João, foi o sinal de que era Ele o que havia de vir, de que era o Messias, o Filho de Deus (Cf. Mt. 3, 13-17; Jo. 1, 33-34). Concebido pelo poder do Espírito Santo, toda a sua vida e toda a sua missão se realizam numa comunhão total com o mesmo Espírito Santo, que o Pai Lhe dá «sem medida» (Jo 3, 34).

1287. Ora, esta plenitude do Espírito não devia permanecer unicamente no Messias: devia ser comunicada a todo o povo messiânico (Cf. Ez. 36, 25-27; Jo. 3, 1-2). Repetidas vezes, Cristo prometeu esta efusão do Espírito (Cf. Lc. 12, 12; Jo. 3, 5-8: 7, 37-39; 16, 7-15; At. 1, 8) promessa que cumpriu, primeiro no dia de Páscoa (Cf. Jo. 20, 22) e depois, de modo mais esplêndido, no dia de Pentecostes (Cf. At. 2, 1-4). Cheios do Espírito Santo, os Apóstolos começaram a proclamar «as maravilhas de Deus» (At. 2, 11) e Pedro declarou que esta efusão do Espírito era o sinal dos tempos messiânicos (Cf. At. 2, 17-18). Aqueles que então acreditaram na pregação apostólica, e se fizeram batizar, receberam, por seu turno, o dom do Espírito Santo (Cf. At. 2, 38).

1288. «A partir de então, os Apóstolos, para cumprirem a vontade de Cristo, comunicaram aos neófitos, pela imposição das mãos, o dom do Espírito para completar a graça do Batismo (Cf. At. 8, 15-17; 19, 5-6101). É por isso que, na Epístola aos Hebreus, se menciona, entre os elementos da primeira instrução cristã, a doutrina sobre os Batismos e também sobre a imposição das mãos (Cf. Heb. 6, 2). A imposição das mãos é justificadamente reconhecida, pela Tradição católica, como a origem do sacramento da Confirmação que, de certo modo, perpetua na Igreja a graça do Pentecostes» (Paulo VI. Const. ap. Divinae consortium naturae: AAS 63 (1971) 659).

1289. Bem cedo, para melhor significar o dom do Espírito Santo, se acrescentou à imposição das mãos uma unção com óleo perfumado (crisma). Esta unção ilustra o nome de «cristão», que significa «ungido», e que vai buscar a sua origem ao próprio nome de Cristo, aquele que «Deus ungiu com o Espírito Santo» (At. 10, 38). E este rito da unção mantém-se até aos nossos dias, tanto no Oriente como no Ocidente. É por isso que, no Oriente, este sacramento se chama crismação (= unção do crisma), ou myron, que significa «crisma». No Ocidente, o nome de Confirmação sugere que este sacramento confirma o Batismo e, ao mesmo tempo, consolida a graça baptismal.

DUAS TRADIÇÕES: O ORIENTE E O OCIDENTE

1290. Nos primeiros séculos, a Confirmação constitui geralmente uma única celebração com o Batismo, formando com ele, segundo a expressão de São Cipriano, um «sacramento duplo» (Cf. São Cipriano de Cartago, Epistula 73, 21: CSEL 3/2, 795; (1996), CCL 3C. 556 (PL 3, 1169)). Entre outras razões, a multiplicação dos batismos de crianças, e isto em qualquer tempo do ano, e a multiplicação das paróquias (rurais), ampliando as Dioceses, deixaram de permitir a presença do Bispo em todas as celebrações batismais. No Ocidente, porque se desejava reservar ao Bispo o completar do Batismo, instaurou-se a separação, no tempo, dos dois sacramentos. O Oriente conservou unidos os dois sacramentos, de tal modo que a Confirmação é dada pelo sacerdote que batiza. Este, no entanto, só o pode fazer com o «myron» consagrado por um Bispo (Cf. CCEO can. 695, § 1. 696. § 1).

1291. Um costume da Igreja de Roma facilitou a expansão da prática ocidental, graças a uma dupla unção com o santo crisma, depois do batismo: a unção já feita pelo sacerdote ao neófito ao sair do banho batismal é completada por uma segunda unção, feita pelo Bispo na fronte de cada um dos novos batizados (Cf. Santo Hipólito de Roma, Traditio apostolica, 21: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 50 e 52). A primeira unção com o santo crisma, feita pelo Sacerdote, ficou ligada ao rito batismal e significa a participação do batizado nas funções profética, sacerdotal e real de Cristo. Se o Batismo é conferido a um adulto, há apenas uma unção pós-batismal: a da Confirmação.

1292. A prática das Igrejas do Oriente sublinha mais a unidade da iniciação cristã. A da Igreja latina exprime, com maior nitidez, a comunhão do novo cristão com o seu Bispo, garante e servidor da unidade da sua Igreja, da sua catolicidade e da sua apostolicidade; e assim, a ligação com as origens apostólicas da Igreja de Cristo.

II. Os sinais e o rito da Confirmação

1293. No rito deste sacramento, convém considerar o sinal da unção e o que essa unção designa e imprime: o selo espiritual.

A unção, na simbologia bíblica e antiga, é rica de numerosas significações: o óleo é sinal de abundância (Cf. Dt. 11, 14; etc.) e de alegria (Cf. Sl. 23, 5: 104, 15), purifica (unção antes e depois do banho) e torna ágil (unção dos atletas e lutadores): é sinal de cura, pois suaviza as contusões e as feridas (Cf. Is. 1, 6: Lc. 10, 34) e torna radiante de beleza, saúde e força.

1294. Todos estes significados da unção com óleo se reencontram na vida sacramental. A unção antes do Batismo, com o óleo dos catecúmenos, significa purificação e fortalecimento; a unção dos enfermos exprime cura e conforto. A unção com o santo crisma depois do Batismo, na Confirmação e na Ordenação, é sinal duma consagração. Pela Confirmação, os cristãos, quer dizer, os que são ungidos, participam mais na missão de Jesus Cristo e na plenitude do Espírito Santo de que Ele está repleto, a fim de que toda a sua vida espalhe «o bom odor de Cristo» (Cf. 2ª Cor. 2, 15)

1295. Por esta unção, o confirmando recebe «a marca», o selo do Espírito Santo. O selo é o símbolo da pessoa (Cf. Gn. 38, 18; Cf. 8, 6), sinal da sua autoridade (Cf. Gn. 41, 42), da sua propriedade sobre um objeto (Cf. Dt. 32. 34). Era assim que se marcavam os soldados com o selo do seu chefe e também os escravos com o do seu dono. O selo autentica um ato jurídico (Cf. 1º Rs. 21, 8) ou um documento (Cf. Jr. 32, 10) e, eventualmente, torna-o secreto (Cf. Is. 29, 11).

1296. O próprio Cristo se declara marcado com o selo do Pai (Cf. Jo. 6, 27). O cristão também está marcado com um selo: «foi Deus que nos concedeu a unção, nos marcou também com o seu selo e depôs as arras do Espírito em nossos corações» (2ª Cor 1, 21-22) (Cf. Ef. 1, 13; 4, 30). Este selo do Espírito Santo marca a pertença total a Cristo, a entrega para sempre ao seu serviço, mas também a promessa da proteção divina na grande prova escatológica (Cf. Ap. 7, 2-3; 9. 4; Ez. 9, 4-6).

A CELEBRAÇÃO DA CONFIRMAÇÃO

1297. Um momento importante que precede a celebração da Confirmação, mas que, de certo modo, faz parte dela, é a consagração do santo crisma. É o Bispo que, em Quinta-Feira Santa, no decorrer da missa crismal, consagra o santo crisma para toda a sua diocese. Nas Igrejas do Oriente, esta consagração é mesmo reservada ao Patriarca:

- a liturgia de Antioquia exprime assim a epiclese da consagração do santo crisma (myron, em grego): «[Pai (...), envia o Teu Espírito Santo] sobre nós e sobre este óleo que está diante de nós e consagra-o, para que seja para todos os que com ele forem ungidos e marcados, myron santo, myron sacerdotal, myron real, unção de alegria, a veste da luz, o manto da salvação, o dom espiritual, a santificação das almas e dos corpos, a felicidade imperecível, o selo indelével, o escudo da fé, o capacete invencível contra todas as obras do Adversário» (Pontificale iuxta ritum Syrorum Occidentalium id est Antiochiae, Pars I, Versio latina (Typis Polyglottis Vaticanis 1941) p. 36-37).

1298. Quando a Confirmação é celebrada separadamente do Batismo, como acontece no rito romano, a Liturgia do sacramento começa pela renovação das promessas do Batismo e pela profissão de fé dos confirmandos. Assim se evidencia claramente que a Confirmação se situa na continuação do Batismo (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 71: AAS 56 (1964) 118). No caso do Batismo dum adulto, este recebe imediatamente a Confirmação e participa na Eucaristia (Cf. CIC can. 866).

1299. No rito romano, o Bispo estende as mãos sobre o grupo dos confirmandos, gesto que, desde o tempo dos Apóstolos, é sinal do dom do Espírito. E o Bispo invoca assim a efusão do Espírito:

- «Deus todo-poderoso, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, pela água e pelo Espírito Santo, destes uma vida nova a estes vossos servos e os libertastes do pecado, enviai sobre eles o Espírito Santo Paráclito; dai-lhes, Senhor, o espírito de sabedoria e de inteligência, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de ciência e de piedade, e enchei-os do espírito do vosso temor. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo» (Ordo Confirmationis, 25 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973). p. 26 [Celebração da Confirmação, 25 (Coimbra, Gráfica de Coimbra — Conferência Episcopal Portuguesa, 1991) p. 33]).

1300. Segue-se o rito essencial do sacramento. No rito latino, «o sacramento da Confirmação é conferido pela unção do santo crisma sobre a fronte, feita com a imposição da mão, e por estas palavras: Accipe signaculum doni Spiritus Sancti - Recebe por este sinal o Espírito Santo, o Dom de Deus» (Paulo VI. Const. Ap. Divinae consortium naturae: AAS 63 (1971) 657 [Celebração da Confirmação, Const. ap. sobre o Sacramento da Confirmação (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) p. 19]). Nas Igrejas orientais de rito bizantino, a unção do myron faz-se depois duma oração de epiclese, sobre as partes mais significativas do corpo: a fronte, os olhos, o nariz, os ouvidos, os lábios, o peito, as costas, as mãos e os pés, sendo cada unção acompanhada da fórmula: «Σφραγίζ δωραζ Πυεύματζ Άγίoυ» («Signaculum doni Spiritus Sancti – Selo do dom que é o Espírito Santo») (Rituale per le Chiese orientali di rito bizantino in lingua greca, Pars 1 (Libreria Editrice Vaticana 1954) p. 36).

1301. O ósculo da paz, com que termina o rito do sacramento, significa e manifesta a comunhão eclesial com o Bispo e com todos os fiéis (Cf. Santo Hipólito, Traditio apostolica, 21: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 54).

III. Os efeitos da Confirmação

1302. Ressalta desta celebração que o efeito do sacramento da Confirmação é uma efusão especial do Espírito Santo, tal como outrora foi concedida aos Apóstolos, no dia de Pentecostes.

1303. Por esse fato, a Confirmação proporciona crescimento e aprofundamento da graça batismal:

- enraíza-nos mais profundamente na filiação divina, que nos leva a dizer «Abba! Pai!» (Rm. 8, 15);
-  une-nos mais firmemente a Cristo;
- aumenta em nós os dons do Espírito Santo;
- torna mais perfeito o laço que nos une à Igreja
(Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15);
- dá-nos uma força especial do Espírito Santo para propagarmos e defendermos a fé, pela palavra e pela ação, como verdadeiras testemunhas de Cristo, para confessarmos com valentia o nome de Cristo, e para nunca nos envergonharmos da cruz
(Cf. Concílio de Florença, Decretum por Armenis: DS 1319: II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15; Ibid., 12: AAS 57 (1965) 16):

- «lembra-te, pois, de que recebeste o sinal espiritual, o espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de ciência e de piedade, o espírito do santo temor, e guarda o que recebeste. Deus Pai marcou-te com o seu sinal, o Senhor Jesus Cristo confirmou-te e pôs no teu coração o penhor do Espírito» (Santo Ambrósio, De mysteriis, 7, 42: CSEL 73, 106 (PL 16, 402-403)).

1304. Tal como o Batismo, de que é a consumação, a Confirmação é dada uma só vez. Com efeito, a Confirmação imprime na alma uma marca espiritual indelével, o «caráter» (Cf. Concílio de Trento, Decretum de sacramentis. Canones de sacramentis in genere, can. 9: DS 1609), que é sinal de que Jesus Cristo marcou um cristão com o selo do seu Espírito, revestindo-o da fortaleza do Alto, para que seja sua testemunha (Cf. Lc. 24, 48-49).

1305. O «caráter» aperfeiçoa o sacerdócio comum dos fiéis, recebido no Batismo, e «o confirmado recebe a força de confessar a fé de Cristo publicamente e como em virtude dum encargo oficial (quasi ex officio)» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 72, a. 5. ad 2: Ed. Leon. 12. 130).

IV. Quem pode receber este sacramento?

1306. Todo o batizado ainda não confirmado pode e deve receber o sacramento da Confirmação (Cf. CIC can. 889. § 1). Uma vez que Batismo, Confirmação e Eucaristia formam uma unidade, segue-se que «os fiéis têm obrigação de receber este sacramento no tempo devido» (CIC can. 890), porque, sem a Confirmação e a Eucaristia, o sacramento do Batismo é, sem dúvida, válido e eficaz, mas a iniciação cristã fica incompleta.

1307. O costume latino, desde há séculos, aponta «a idade da discrição» como ponta de referência para se receber a Confirmação. Em perigo de morte, porém, devem confirmar-se as crianças, mesmo que ainda não tenham atingido a idade da discrição (Cf. CIC can. 891.883. 3).

1308. Se por vezes se fala da Confirmação como «sacramento da maturidade cristã», não deve, no entanto, confundir-se a idade adulta da fé com a idade adulta do crescimento natural, nem esquecer-se que a graça batismal é uma graça de eleição gratuita e imerecida, que não precisa duma «ratificação» para se tornar efetiva. São Tomás recorda isso mesmo:

- «a idade do corpo não constitui um prejuízo para a alma. Por isso, mesmo na infância, o homem pode receber a perfeição da idade espiritual de que fala a Sabedoria (4, 8): “a velhice honrada não é a que dão os longos dias, nem se avalia pelo número dos anos”. E foi assim que muitas crianças, graças à fortaleza do Espírito Santo que tinham recebido, lutaram corajosamente e até ao sangue por Cristo» (São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 72. a. 8, ad 2: Ed. Leon. 12. 133).

1309. A preparação para a Confirmação deve ter por fim conduzir o cristão a uma união mais íntima com Cristo e a uma familiaridade mais viva com o Espírito Santo, com a sua ação, os seus dons e os seus apelos, para melhor assumir as responsabilidades apostólicas da vida cristã. Desse modo, a catequese da Confirmação deve esforçar-se por despertar o sentido de pertença à Igreja de Jesus Cristo, tanto à Igreja universal como à comunidade paroquial. Esta última tem uma responsabilidade particular na preparação dos confirmandos (Ordo Confirmationis, Praenotanda 3 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 16 [Celebração da Confirmação, Preliminares 3 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) p. 12]).

1310. Para receber a Confirmação é preciso estar em estado de graça. Convém recorrer ao sacramento da Penitência para ser purificado, em vista do dom do Espírito Santo. E uma oração mais intensa deve preparar para receber com docilidade e disponibilidade a força e as graças do Espírito Santo (Cf. At. 1, 14).

1311. Tanto para a Confirmação, como para o Batismo, convém que os candidatos procurem a ajuda espiritual dum padrinho ou de uma madrinha. É conveniente que seja o mesmo do Batismo, para marcar bem a unidade dos dois sacramentos (Cf. Ordo Confirmationis, Praenotanda 5 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 17 [Celebração da Confirmação, Preliminares 5 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) p. 22]: Ibid., 6: (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 17 [(Coimbra, Gráfica de Coimbra - Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) 22]: CIC can 893, § 1-2).

V. O ministro da Confirmação

1312. O ministro originário da Confirmação é o Bispo (Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 26: AAS 57 (1465) 32).

-  No Oriente, é ordinariamente o sacerdote que batiza quem imediatamente confere a Confirmação, numa só e mesma celebração. Fá-lo, no entanto, com o santo crisma consagrado pelo Patriarca ou pelo Bispo, o que exprime a unidade apostólica da Igreja, cujos laços são reforçados pelo sacramento da Confirmação. Na Igreja latina aplica-se a mesma disciplina nos batismos de adultos ou quando é admitido à plena comunhão com a Igreja um batizado de outra comunidade cristã, que não tenha recebido validamente o sacramento da Confirmação (Cf. CIC can. 883, § 2).

1313. No rito latino, o ministro ordinário da Confirmação é o Bispo (Cf. CIC can. 882). Mesmo que o Bispo possa, em caso de necessidade, conceder a presbíteros a faculdade de administrar a Confirmação (Cf. CIC. can. 884, § 2), é conveniente que seja ele mesmo a conferi-la, não se esquecendo de que foi por esse motivo que a celebração da Confirmação foi separada, no tempo, da do Batismo. Os Bispos são os sucessores dos Apóstolos e receberam a plenitude do sacramento da Ordem. A administração deste sacramento feita por eles, realça que ele tem como efeito unir mais estreitamente aqueles que o recebem à Igreja, às suas origens apostólicas e à sua missão de dar testemunho de Cristo.

1314. Se um cristão estiver em perigo de morte, qualquer sacerdote pode conferir-lhe a Confirmação (Cf. CIC can 883, 3). De fato, é vontade da Igreja que nenhum dos seus filhos, mesmo pequenino, parta deste mundo sem ter sido levado à perfeição pelo Espírito Santo com o dom da plenitude de Cristo.

Resumindo:

1315. «Quando os Apóstolos que estavam em Jerusalém ouviram dizer que a Samaria recebera a Palavra de Deus, enviaram-lhe Pedro e João. Quando chegaram lá, rezaram pelos samaritanos para que recebessem o Espírito Santo, que ainda não tinha descido sobre eles. Apenas tinham sido batizados em nome do Senhor Jesus. Então impunham-lhes as mãos e eles recebiam o Espírito Santo» (At. 8, 14-17).

1316. A Confirmação completa a graça batismal; ela é o sacramento que dá o Espírito Santo, para nos enraizar mais profundamente na filiação divina, incorporar-nos mais solidamente em Cristo, tornar mais firme o laço que nos prende à Igreja, associar-nos mais à sua missão e ajudar-nos a dar testemunho da fé cristã pela palavra, acompanhada de obras.

1317. A Confirmação, tal como o Batismo, imprime na alma do cristão um sinal espiritual ou caráter indelével; é por isso que só se pode receber este sacramento uma vez na vida.

1318. No Oriente, este sacramento é administrado imediatamente a seguir ao Batismo e é seguido da participação na Eucaristia; esta tradição põe em relevo a unidade dos três sacramentos da iniciação cristã. Na Igreja latina, este sacramento é administrado quando se atinge a idade da razão e ordinariamente a sua celebração é reservada ao Bispo, significando assim que este sacramento vem robustecer o vínculo eclesial.

1319. O candidato à Confirmação, que atingiu a idade da razão, deve professar a fé, estar em estado de graça, ter a intenção de receber o sacramento e estar preparado para assumir o seu papel de discípulo e testemunha de Cristo, na comunidade eclesial e nos assuntos temporais.

1320. O rito essencial da Confirmação é a unção com o santo crisma na fronte do batizado (no Oriente também em outros órgãos dos sentidos), com a imposição da mão do ministro e as palavras: «accipe signaculum doni Spiritus Sancti - Recebe por este sinal o Espírito Santo, o Dom de Deus» (no rito Romano) ou: «signaculum doni Spiritus Sancti - Selo do dom que é o Espírito Santo» (no rito Bizantino).

1321. Quando a Confirmação é celebrada separadamente do Batismo, a sua ligação com este sacramento é expressa, entre outras coisas, pela renovação dos compromissos batismais. A celebração da Confirmação no decorrer da Eucaristia contribui para sublinhar a unidade dos sacramentos da iniciação cristã.

continua na parte 5

 O Terço (Rosário) dos Homens não exige nada e não cobra nada da vida pessoal dos seus participantes, o que faz com que seus membros se sintam livres, e a liberdade dá ao homem o poder de ser aquilo que ele deseja ser, daí as transformações se sucederem de modo espontâneo causado pelo contato que os mesmos passam a ter com Deus por intercessão de Maria.